8 mulheres que lideram no mercado de fundos de capital de risco
Na liderança de fundos de capital privado e de risco, elas ainda são minoria — mas detêm milhões em suas mãos
Algumas se dedicam exclusivamente ao trabalho, muitas dividem o tempo com a família. Umas praticam kitesurf, outras preferem triatlo. Todas são responsáveis por gerir milhões em diferentes moedas. As investidoras de risco são consideradas visionárias, aquelas que imaginam o futuro da humanidade e apostam em soluções desde cedo. Sim, é uma indústria do dinheiro onde ainda predomina o estereótipo do “bem sucedido homem de terno” assinar o primeiro “cheque” de aporte em uma empresa. Há sinais de mudanças, entretanto, e a história de oito influentes mulheres brasileiras desta área confirmam a evolução.
Nos Estados Unidos, as mulheres ocupam 15% dos cargos de liderança em fundos de capital de risco, o tal Venture Capital, ou apenas VC. Elas são tão sub–representadas por lá quanto em todo o mundo, segundo a organização não governamental que representa o setor, a Lavca. Como não há dados para o mercado latino–americano e, na tentativa de dar maior visibilidade à participação feminina, a Lavca publicou ao final de 2021 a lista “Mulheres Investidoras Emergentes em Tecnologia”. Entre as 115 anunciadas, 30 atuam por aqui.
“Muitas mulheres desbravaram e fizeram sacrifícios importantes para que as próximas pudessem chegar mais perto de um equilíbrio e avançar”
Luciana Antonini Ribeiro, fundadora da EB Capital
“Estamos longe do ideal, mas existe um engajamento, seja genuíno ou pro forma, para inclusão da mulher”, avaliou a advogada com experiência de dez anos no mercado financeiro Marcella Ceva, 34 anos, chefe do escritório de investimentos do We Ventures, uma iniciativa da Microsoft. É o primeiro fundo de Venture Capital da América Latina dedicado a investimentos em empresas fundadas ou lideradas por mulheres. Ela iniciou a sua trajetória ali, em março de 2020, na semana do anúncio oficial da pandemia de Covid–19 e da derretida da bolsa de Nova York. Ainda assim, dedicada à maternidade e trabalhando em home office, Marcella liderou o time que já captou mais de 50 milhões de reais — há outros cotistas além da Microsoft. Nos próximos cinco anos, esse valor deve dobrar e o número de investidas pode chegar a 25.
Quando não se tem tamanho, faturamento e outras garantias de pagamento de um financiamento bancário, um negócio pode empacar. Essa é a situação de muitas empresas, especialmente startups brasileiras — aquelas iniciantes, de base tecnológica, ainda em processo de validação, mas com potencial de escalar resultados. Elas têm sido impulsionadas especialmente pelo capital de risco. Há pessoas que querem investir acreditando que a empresa se transformará em uma grande companhia, multiplicando o seu capital no longo prazo. Um fundo capta e reúne recursos de diferentes fontes, como corporações, bancos, famílias (family offices) e outros interessados, e se responsabiliza pela operação.
15% dos cargos de liderança em fundos de capital de risco nos EUA são ocupados por mulheres
É um setor de peso na economia brasileira: os investimentos de fundos de venture capital em startups brasileiras atingiram 33,5 bilhões de reais de janeiro a setembro de 2021, mais que o dobro do registrado no mesmo período do ano anterior. Um resultado histórico, segundo a Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital (Abvcap) e da consultoria KPMG. Neste período, 226 startups receberam aportes. À frente dessas negociações, e na gestão desse dinheiro, é que encontramos mulheres. Um número ainda pequeno, é preciso dizer, mas cada vez maior.
O propósito de empoderamento feminino também uniu, nos Estados Unidos, as brasileiras Mônica Saggiori, 34 anos, e Lara Lemann, 28 anos — filha do bilionário empresário Jorge Paulo Lemann. “Constatamos que os Estados Unidos tinham uma média de doze startups para cada fundo de venture capital e, na América Latina, essa proporção era de 80 para um”, comparou Mônica. Buscando reduzir essa diferença, e de olho nos negócios comandados por mulheres, as duas fundaram, em 2018, a Maya Capital. Desde então, investiram mais de 40 milhões de dólares em quase 30 startups latinas na fase inicial do negócio. “Queremos ser as primeiras investidoras, o primeiro cheque, além de fazer a diferença nas empresas que têm bons fundadores, times, mercados e produtos”, afirma Mônica.
Aos 29 anos, Izabel Gallera é sócia da firma de venture capital Canary, criada em 2017 por um grupo de empreendedores veteranos, como Florian Hagenbuch e Mate Pencz, fundadores do unicórnio (startup com valor de mercado superior a 1 bilhão de dólares) Loft, e Julio Vasconcellos, que fundou o Peixe Urbano. Também interessados em empresas em estágio inicial, já levantaram mais de 220 milhões de dólares. Hoje, Izabel é a única mulher no comitê de investimentos e lidera diferentes iniciativas: “É uma indústria considerada ainda nova, formada predominantemente por homens brancos, mas, ao mesmo tempo, existe um papel ativo dos atores atuais em buscar mais representatividade”.
“É uma indústria considerada ainda nova, formada predominantemente por homens brancos, mas, ao mesmo tempo, existe um papel ativo dos atores atuais em buscar mais representatividade”
Luciana Antonini Ribeiro, fundadora da EB Capital
Em 2019, Carol Lacombe, 31 anos, ingressou no escritório da Valor Venture como analista sênior. Atualmente, ela é vice–presidente e diretora de comunidade da empresa, fundada em 2011 e com presença no Brasil e nos Estados Unidos (Nova York e Vale do Silício). A Valor é uma gestora de VC pioneira da estratégia “cross-border”, ou seja, atua como ponte entre os mercados norte–americano e brasileiro de tecnologia. Sem revelar valores, Carol conta que está focada em avaliar oportunidades, fechar negócios e apoiar a comunidade de mais de 90 empresas investidas e cerca de 150 fundadores. “A sensibilidade feminina traz uma perspectiva diferente, complementar, para um mercado ainda muito masculino”, afirma Carol.
Bedy Yang, 43 anos, nascida em Foz do Iguaçu e residente nos Estados Unidos, sempre acreditou que o seu papel é ajudar pessoas por meio de conexões e que todos deveriam ter a mesma oportunidade. Por causa disso, fundou a Brazil Innovators, uma rede relevante de inovadores, e chamou a atenção de investidores do Vale do Silício que queriam conhecer startups brasileiras. “Escutei muitos nãos, aprendi a ter resiliência e isso me ajudou a ter mais empatia junto aos empreendedores que também lidam com futuros incertos”, diz a gestora do fundo 500 Global, no Vale do Silício, que tem mais de 1,8 bilhão de dólares de ativos em gestão. Bedy já investiu em mais de 50 startups no Brasil e em outros países.
“Escutei muitos nãos, aprendi a ter resiliência e isso me ajudou a ter mais empatia junto aos empreendedores que também lidam com futuros incertos”
Bedy Yang, gestora do fundo 500 Global, que tem mais de US$ 1,8 bilhão de ativos em gestão
Para Luciana Antonini Ribeiro, 44 anos, há diferentes gerações de mulheres no mercado de fundos de investimentos, seja de capital de risco ou outro, e cada uma delas deixou a sua contribuição para a seguinte. “Muitas desbravaram e fizeram sacrifícios importantes para que as próximas pudessem chegar mais perto de um equilíbrio e avançar”, avalia. Ela é fundadora de um fundo de capital privado (private equity), a EB Capital, junto com dois homens, Pedro Parente e Eduardo Sirotsky Melzer. Diferentemente do VC, esse tipo de fundo investe em empresas mais sólidas e robustas, não necessariamente do setor de tecnologia, e acompanha de perto os desafios do dia a dia. Desde 2017, quando foi criada, a EB Capital investiu 3,5 bilhões de reais em empresas que resolvem lacunas estruturais brasileiras, como educação, saúde e telecomunicações. Ela também é fundadora e coordenadora do Comitê Brasil 2030, da Abvcap, dedicado a fomentar um novo protagonismo do capital privado na transformação do Brasil.
Entre as pioneiras do setor está Carolina Strobel, 48 anos, que iniciou a carreira em 2001, na Intel Capital. Formada em direito, atuava na área jurídica de um banco quando se surpreendeu com o convite de uma chefe da Intel Capital, no Vale do Silício, para aprender e atuar com VC. Ela embarcou, participou de operações e absorveu todo o conhecimento sobre como atuavam na América Latina. Voltou para o Brasil e, como diretora da Intel Capital e conselheira da Abvcap, implantou importantes projetos, como uma documentação padrão de investimento, de domínio público, que pode ser acessada por empresas brasileiras, economizando tempo e dinheiro.
Hoje, Carolina é sócia da Redpoint eventures e todas as negociações de VC passam por ela: já foram mais de 305 milhões de dólares. “Se, quando eu comecei me falassem que VC daria mais retorno que private equity, eu não acreditaria. Agora, quando olho para o futuro, vejo que estamos apenas começando.” Em uma indústria em que o privilégio pode gerar mais privilégios, diversidade — não só de gêneros, claro — é compulsória.