Titane, de Julia Ducournau, é uma experiência sensorial intensa
Filme vencedor da Palma de Ouro em Cannes está disponível com exclusividade no MUBI
Nada mais chamativo para um filme do que vencer a Palma de Ouro em Cannes. Talvez o Oscar, claro, num contexto mais mainstream, mas com o poder de curadoria dos streamings, finalmente temos essas produções à mão. No caso de Titane, da francesa Julia Ducournau, o prêmio ainda marcou a representatividade feminina (ou falta de) no festival ao longo dos anos: ela foi a segunda mulher a receber tal reconhecimento. Expectativas altíssimas, então, te acompanham até o play no MUBI.
Os frames que rodaram nas redes sociais indicam uma estética plástica, com cores fortes, um roteiro intrigante e a esquisitice comum de suas obras – assista Raw na Netflix. Na trama, Alexia (Agathe Rousselle) é uma mulher que, na infância, sofreu um acidente de carro com seu pai e teve uma placa de titânio inserida no crânio, próximo ao ouvido. Anos mais tarde, ela trabalha como dançarina em shows de automóveis, criando essa relação de trauma e tesão com algo que, certa vez, a fez sofrer.
E é por meio desse encontro que ela se envolve em uma série de assassinatos. Fugitiva, ela adota a identidade de Adrien Legrand, menino desaparecido há anos, e passa a viver com o bombeiro e pai do garoto, Vincent. Nessa experiência, ela ainda precisa lidar com uma gestação, digamos, inesperada, faz automutilação e tenta se abrir para o afeto de um pai que nunca teve, sendo o filho perdido de uma figura paterna que não teve a chance de amar o seu próprio.
O thriller violento e bastante sensorial (prepare-se para ver, ouvir e sentir coisas das mais diversas) almeja abordar questões de gênero ancestrais – não dá para ignorar o nome “Titane”, de titânio, mas também de titãs – ao passo que revela o amor pelo abandono, a pulsão de morte e a redenção. Uma odisseia e tanto, não fosse alguma coisa muito específica que causa aquilo que não alcança tradução.
A linguagem de Julia Ducournau beira a estética de David Cronenberg, mas, por vezes, se perde num apelo visual deslumbrante – parece um clipe lindo. “Ok, mas e aí?” talvez seja um questionamento recorrente nas quase duas horas de filme. Contudo, o racional não é o lugar para Titane. Este filme é uma vivência de corpo, de pele, de estômago. Há quem goste, há quem não. Um misto de caos e estranheza além. Vá preparada.