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Marília Mendonça: a gordofobia nos assombra na vida e na morte

Conversamos com uma militante gorda e uma psicóloga pra entender o que os comentários sobre o corpo de Marília dizem sobre a gordofobia na nossa sociedade

Por Sarah Catherine Seles
Atualizado em 12 nov 2021, 16h37 - Publicado em 12 nov 2021, 16h24

Se em vida, a cantora Marília Mendonça enfrentou diversas críticas e comentários gordofóbicos e após sua morte, na sexta-feira, 5, não foi diferente. A fixação sobre o corpo feminino se fez presente no conteúdo de comentários e artigos que não se limitaram a sua carreira.

Após o acidente de avião que matou a cantora e mais quatro pessoas, um obituário, escrito por um historiador, e publicado na Folha de São Paulo, misturava fatos sobre a carreira e comentários sobre corpo e aparência de Marília. Entre os fatos da sua carreira, o escritor comentou sobre o corpo e a aparência de Marília.

“Nunca foi uma excelente cantora. Seu visual também não era dos mais atraentes para o mercado da música sertaneja. […] Marília era gordinha e brigava com a balança. Mais recentemente, durante a quarentena, vinha fazendo um regime radical que tinha surpreendido a muitos. Tornava-se também bela para o mercado”, dizia o texto, que foi duramente criticado nas redes sociais.

balança quebrada
(Melissa Ross/Getty Images)

Os comentários sobre o peso da cantora não pararam por aí, no domingo, Luciano Huck se referiu à aparência dela e da dupla Maiara e Maraisa: “Estava lembrando agora. Faz três semanas que eu estava com as três no palco. Três semanas. Na verdade, vieram só metade das três no palco, porque estavam as três magrinhas”.

No dia seguinte, quando comentava sobre a morte da cantora, Ana Maria Braga também falou sobre sua aparência física. “Ela fez tanto pra chegar nesse shape lindo, né? Ela emagreceu, criando um caminho pra ela, que fazia sentido, com esse vozeirão. E, de repente, ironia do destino, morreria dali a quatro, cinco dias”, afirmou.

“É muito triste perceber como a gordofobia está presente até nos momentos mais delicados e de tanta dor. Como no caso da Marília Mendonça, uma artista incrível, com muitas qualidades, com lugar de destaque, e ainda assim seu corpo e aparência ficaram no foco de críticas”, diz Thais Carla, dançarina e militante gorda, em entrevista a CLAUDIA.

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A psicóloga e professora na PUC-SP, Ana Laura Schliemann, aponta que comentários desse tipo ainda são comuns e frequentes porque a sociedade ainda acredita que ser magra é sinônimo de sucesso. Portanto,  o fato de Marília ser gorda “impediria” que sua carreira decolasse, por isso as pessoas dão foco ao seu corpo.

pés com meia sobre balança
(Melissa Ross/Getty Images)

Para Thais, essas ações mostram como esse preconceito está enraizado na sociedade, assim como a pressão estética sobre os corpos das mulheres. “A naturalidade com que as pessoas reproduzem discursos gordofóbicos em cima de uma notícia sobre uma terrível tragédia, mostra como a gordofobia está enraizada na nossa sociedade”, conta.

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“Acredito que a indústria cultural e a publicitária contribuem muito para que isso aconteça, podemos perceber como não existe espaço para as pessoas gordas com papéis de destaque na televisão, filmes ou peças publicitárias, e isso não acontece por falta de pessoas gordas para ocuparem esses espaços. Como vamos normalizar corpos gordos para eles serem aceitos, se não enxergamos esses corpos na mídia e na indústria cultural?”, questiona Thais.

Nos últimos meses, Marília decidiu emagrecer, por escolha própria, garantindo que faria por questões de saúde. A cantora relatou em seu Instagram que estava ficando doente frequentemente e, com uma rotina de shows muito intensa, sua saúde enfraqueceu. Ela sempre enfatizou que sua carreira não era e nem seria baseada em seu corpo.

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“[Um amigo] me perguntou se no fundo eu não tinha vontade de perder peso e falei pra ele que eu não permitia ter até mostrar o meu trabalho pro Brasil e fazer entenderem que não era sobre isso”, escreveu a cantora em seu Twitter na época.

“A Marília Mendonça chegou lá sem se render às vozes que diziam ser impossível… Com aquelas roupas, com aqueles sapatos, com aquele peso. O que eu vivo hoje é uma escolha exclusivamente minha, de mais ninguém, e o que eu construí não é baseado nisso”, continuou Marília.

“Lidar com o diferente é uma coisa que as pessoas não dão conta. Ela vinha fazendo mudanças no corpo, mas as pessoas ainda têm dificuldade de lidar com ela e continuam fazendo essas observações gordofóbicas”, explica Ana Laura.

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Os infelizes comentários sobre seu corpo não foram o foco da mobilização nas redes, que enfatizou o talento e a personalidade de Marília. Ainda assim, ela foi tratada como uma vitrine, onde tudo que importa é sua aparência. “[A sociedade] impõe e constantemente nos cobra um padrão de beleza irreal, e  isso é muito cruel com as pessoas”, explica Thais.

Thais Carla
A dançarina e ativista Thais Carla (Thais Carla/Divulgação)

O debate sobre o tema é essencial para tirar a estigmatização sobre o corpo gordo, segundo Ana Laura. Pessoas que sofrem com o preconceito podem desenvolver transtornos de imagem e distúrbios alimentares, depressão, ansiedade, autoestima baixa, entre outros problemas, explica a psicóloga.

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“A gordofobia está presente na nossa sociedade e mostra o quanto a gente ainda é um ser humano que não respeita o outro, que limita e estigmatiza as pessoas a uma condição. Fazer esse debate é importante para que a pessoa seja quem ela é, possa acessar os lugares e ser aceita como ela é”, diz a especialista.

“O debate pode fazer com que as pessoas reflitam sobre os impactos da gordofobia mostrando como não é preciso ofender ou diminuir uma pessoa apenas por ela ser gorda. Além de ser construtivo para que as pessoas gordas percebam como não podem mais aceitar comentários e atitudes gordofóbicas, incentivando a auto aceitação e o amor próprio aos gordos”, complementa Thais Carla.

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