José Fidalgo: “Ator não tem casa. Mas meu porto é Portugal”
O ator de 'Deus Salve O Rei' fala sobre paternidade, o mundo da atuação, HeForShe e seu amor pelo Rio de Janeiro
Quem vê José Fidalgo andando pelas ruas do Rio com calça de tecido cru, camisa despojada, óculos espelhados, pulseiras, colar e anel mais mochila estilosa não deve se lembrar do duque Constantino de Artanza, de Deus Salve o Rei. [Atualização: A matéria foi originalmente publicada na edição de março de 2018. Porém, no dia 21 foi anunciada a saída do ator da trama]
Na novela das 19 horas da Rede Globo, o ator português usa figurinos inspirados no período medieval e ostenta dreadlocks que o tornam quase irreconhecível. Até porque eles são retirados ao fim de cada gravação, restando um megahair na altura dos ombros.
Mas, se o estreante na teledramaturgia brasileira pode até passar despercebido por aqui, ele é tão famoso em sua terra natal que os fãs seriam capazes de reconhecê-lo até se o encontrassem de armadura.
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Aos 38 anos, são mais de 20 de carreira e uma sucessão de novelas. No ano passado, foi convidado para ser o embaixador do movimento HeForShe, iniciativa da ONU Mulheres que envolve homens na luta pelo fim das desigualdades de gênero.
Sim, além de ser talentoso e muito “giro” (bonito, em expressão bastante utilizada em Portugal), ele é engajado. “Sempre tive um pouco de receio de aceitar convites como esse, porque, quando se abraça uma causa, deve haver uma razão. Sei que hoje em dia, por estratégia, há necessidade de uma figura pública (nos ativismos), mas é preciso saber o que se está fazendo”, afirma.
Seu discurso é de adepto da equidade geral e irrestrita. “Participo de convenções internacionais nas quais também falamos sobre racismo, homossexualidade e outras questões, o que gera um efeito dominó positivo no mundo todo. Uma ação leva a outra”, defende enquanto toma sua segunda xícara de café.
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“Se uma mulher está fazendo a mesma coisa que um homem em uma empresa, por exemplo, os salários devem ser iguais. E ponto final.” Antes de integrar o HeForShe, Fidalgo já fazia sua parte. Até topou o desafio proposto por uma revista europeia de participar de um ensaio fotográfico provocador. Posou com salto alto e traje sumário.
“Como a produção estava preocupada com o que eu ia vestir, acabei ficando só de cueca”, conta. “O salto é uma arma poderosa que a mulher tem. Para mim, representa equilíbrio. Quem sabe andar com ele está preparado para tudo na vida.”
Filho dos aposentados António e Maria Fernanda, que vivem em Lisboa, onde Fidalgo nasceu, ele explica que teve uma criação baseada na aceitação das diferenças. É só admiração quando fala de Maria Fernanda (que trabalhou como faxineira em escritório) e da irmã, Carla, produtora de TV. “A mulher mais importante pra mim é minha mãe, que me deu as bases para ser quem sou. Ela e Carla tiveram papel fundamental na construção da minha personalidade. Minha família, e incluo meu pai, sempre me ensinou a respeitar o outro. Somos todos iguais.”
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Assuntos do coração
Criado no subúrbio de Pontinha, perto do Estádio do Sport Lisboa e Benfica, o Estádio da Luz, Fidalgo pensou em ser jogador de futebol. Do Benfica, ora pois! No fundo, sabia que seria ator. Ainda garoto, sentia-se hipnotizado pelas novelas brasileiras exibidas em Portugal. “Paravam literalmente o país.”
Começou fazendo campanhas publicitárias, aos 14; depois migrou para o teatro. Como modelo, passou, ainda bem jovem, temporadas em Milão e Atenas. “Queria era viajar, conhecer o mundo e outras culturas”, recorda-se. “Cresci como homem.”
Hoje é pai de Lourenço, 9 anos, e Maria, 3. O menino é fruto de seu casamento de sete anos com a empresária Fernanda Oliveira, 50. Separaram-se em 2013. No ano seguinte, nasceu Maria, filha do ator com a arquiteta moçambicana Nádia Nóvoa, 37. Em dezembro último, a imprensa portuguesa alardeou o fim de outra relação – o namoro com a atriz portuguesa Oceana Basílio, 38.
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O ator recorre ao clichê “estou apaixonado pelo meu trabalho” para se esquivar dos assuntos do coração. Pretextos à parte, o diretor artístico de Deus Salve o Rei, Fabrício Mamberti, 49 anos, afirma que isso é verdade. “Ele tem um elemento importante, que é a paixão. Entra em cena com uma força única.”
Na história, forma par romântico com Bruna Marquezine. Cenas quentes desencadearam boatos de que a química entre os dois poderia não ser só mera ficção. “Não gosto dessa fofoca. Como ator, não fico contente de dar tudo o que tenho para depois falarem isso, entende?”
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E ele defende a atriz, criticada por sua atuação. “O que ela está dando para essa novela é algo difícil de as pessoas compreenderem. Como vilã, está sendo fenomenal.” A namorada do craque Neymar retribui. “O Zé me ajudou a construir a Catarina. Grande parte da minha personagem descobri com o envolvimento dos dois. Ele é muito entregue.”
A Globo e Fidalgo já se paqueravam desde 2009, quando ele integrou o elenco de um remake de Dancin’ Days com produção luso-brasileira. É que a novela ícone de Gilberto Braga, de 1978, deu origem a outra só com atores portugueses.
Fidalgo encarnou Hugo Figueiredo, originalmente vivido por Reginaldo Faria. “A partir dali, houve uma proximidade com a emissora. Mas, por uma razão ou outra, não acontecia nada de concreto.”
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Ao receber o convite para a atual novela, precisou perder o sotaque, encarando aulas de fonética. “É mais difícil? Sim, mas, por isso mesmo, melhor.” Às vezes, Fidalgo ainda tropeça em palavras que têm outro significado por aqui. Assim, diz que saiu de camisola, não de camiseta.
Acessórios, Rio e Açaí
Com 1,79 metro de altura, ele confessa que gosta de manter não só o organismo saudável como o corpo atlético. Além de surfar, treina regularmente com um personal que mistura crossfit e exercícios aeróbicos.
O ator admite ser vaidoso. Tem as duas orelhas furadas, mas estava sem nada nelas no dia da entrevista. Conta que havia perdido um par de argolas nos estúdios da Globo, em uma troca de roupa, e que chegou a ficar em pânico ao dar pela falta delas.
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Ainda estava chateado com o ocorrido. “Eu me sinto quase nu sem meus acessórios. É como andar descalço”, afirma mostrando um anel com máscara de cavaleiro medieval em homenagem à atual novela.
Instalado no Rio de Janeiro desde setembro, está viciado em açaí na tigela. É fã da cidade. Fica extasiado com o que vê do Hotel Santa Teresa Rio MGallery by Sofitel, cenário da sessão de fotos para estas páginas. Nunca tinha ido àquele famoso bairro boêmio. “É bonito. Quero voltar com calma”, diz.
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Nem do calor ele reclama. “Adoro esse clima! Para mim, 40 graus não é uma temperatura desagradável. Os cariocas não têm noção do que é viver no frio. Sinceramente, estou adorando o Rio.”
Mas não pensa em fixar residência. “Ator não tem casa”, opina. “Mas meu quartel-general é o meu país. Todo ser humano possui um porto, um abrigo, pois precisa disso. O meu é Portugal, onde estão meus filhos.” É, aliás, para o futuro das crianças – e não só as dele – que o ator acha importante levantar bandeiras.
“Como pai, tenho que prestar atenção no que estou deixando para a próxima geração”, justifica. E acrescenta que iniciativas como o HeForShe não só ajudam a resolver o presente como também contribuem para um futuro melhor. É preciso trabalhar nisso. “Até para não entrarmos em colapso!”, defende. “Portanto, a luta pelos direitos das mulheres é algo que conta com meu comprometimento. Tem a minha palavra.” E ele tem a nossa de que receberá aplausos.
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Styling Isabella Castro | Beleza Brenno Melo | Assistente de fotografia Maria Morgado