Série conta história de inocentes que foram presos injustamente
Em Nome da Justiça estreia no próximo sábado (26) com produção de Ilana Casoy, criminóloga responsável pela análise de casos como o de Von Richthofen
Imagina ser preso, ter sua privacidade roubada e a sua vida alterada completamente por um crime que você não cometeu. A sensação de injustiça e inconformidade de pessoas que passaram por essa situação e a análise de casos como esses serão exibidos pela série Em Nome da Justiça, na AXN, a partir do próximo sábado (26), às 22h.
A produção traz a criminóloga e escritora Ilana Casoy, que é especialista na análise de perfis de criminosos, principalmente os serial killers (assassinos em série). Em formato de docudrama, a série aborda casos contundentes de pessoas que tiveram suas vidas devastadas por crimes que não cometeram.
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Cada um dos 13 episódios com 45 minutos de duração vai explorar o lado desconhecido desses casos, os conceitos das investigações e a situação social à época do crime abordado. Além disso, o espectador também poderá ouvir da análise de profissionais sobre os processos até o resultado de suas prisões e soltura.
Para saber mais sobre a série e o que podemos esperar sobre os casos, CLAUDIA conversou com Ilana Casoy. Confira, abaixo, a entrevista na íntegra:
A série fala de casos em que uma pessoa foi presa injustamente. Como tratar um assunto tão delicado na TV?
Eu acho que o principal é tratar com verdade, com base nos processos. Às vezes, há casos que não se comprovam por documentação. Então, para a série, nos baseamos bastante em casos onde está tudo documentado, todo o processo, com todo esse cuidado jurídico. Não basta a história ser boa. E quando eu falo “verdade”, é uma verdade processual, uma verdade jurídica. Tem que ter esse andamento. E acho que essa é a maneira de tratar o assunto. Escolher não tratar porque [o assunto] é difícil, não é nem o meu perfil, nem o da JPO Produções e nem o da AXN. Nós estamos enfrentando as dificuldades que aparecem.
Quais são as principais denúncias feitas pela série ao sistema judiciário brasileiro?
Há no mundo todo as mesmas questões [a serem discutidas] sobre o judiciário. Uma delas é o reconhecimento fotográfico. Ele aparece em alguns casos [da série]. Outra questão que nós temos é a de precipitação da mídia, que pressiona todo o sistema por uma resposta e, às vezes, essa resposta é precipitada, como no caso da Daniele Toledo, que antes de sair o exame comprovando se ela estaria transportando cocaína ou não, ela já era considerada culpada. Ela foi presa, espancada, perdeu a audição, a visão, ficou com três coágulos, não mexe bem o lado direito do corpo, e daí, depois de um mês, eles falaram: “Ops, deu positivo o teste, mas foi porque reagiu com o remédio que a filha dela tomava”.
Nós tentamos sempre trazer um leque de problemas para as pessoas entenderem que não se trata de falar mal nem da polícia, nem da Justiça, nem da perícia. Nós estamos mostrando como sempre temos que duvidar [do caso].
Como foi feita a seleção dos casos?
Primeiro, vemos se a história é boa, se ela rende um episódio. E depois, vemos se ela processualmente se comprova. E aí perguntamos às pessoas envolvidas se querem falar conosco. Porque não escutamos só as vítimas, escutamos o juiz, o promotor, o desembargador, o delegado, o investigador, o perito, então eles precisam falar e, às vezes, não querem.
E tem algum desses casos que chamou mais a sua atenção ou te comoveu? Qual?
Todos me comovem. Os casos que eu chorei a primeira vez, continuo chorando cada vez que vejo. São pessoas que tiveram a vida destruída. Não tem conserto. Nós sabemos que dinheiro não conserta tudo, mas vamos combinar que ajuda muito? E aqui no Brasil não temos a tradição de pagar indenizações altas. Por exemplo, no caso da Daniele, ela recebe uma pensão de um salário mínimo só até os 60 anos. Ou seja, quando ela mais precisar, ela não vai ter o dinheiro. E o sistema, é claro, tem falhas, mas tem que tentar ajudar, inclusive, os próprios participantes dele a ficarem atentos e a evitarem erros. Porque um caso não chega [a uma conclusão] tão fácil assim. Precisa ter a parte da polícia, depois da perícia, depois ele é encaminhado para o promotor. Então são várias etapas e o erro pode acontecer em qualquer uma delas.
Em toda a sua carreira como criminóloga, você se dedicou a estudar o psicológico de assassinos, de serial killers e a falar sobre a história deles. Dessa vez, você se dedica a falar de inocentes. O que motivou essa mudança?
O crime em série é uma situação tão contundente socialmente, é difícil você investigar esse tipo de crime e, na esteira do crime em série, há muito inocente preso. E a cada investigação desses crimes que eu ajudei, vi um sofrimento tão horrível que eu falei “bom, alguém tem que dar visibilidade para isso”. Hoje se fala muito de criminoso, mas não se fala do resto do sistema. Então, o que me motivou foi me deparar com esses casos reais tão contundentes, tão sofridos.
E o que você notou de diferente nas entrevistas?
Nessa série, as pessoas passaram por esse pesadelo de ter a vida, de repente, virada de ponta-cabeça. Então, tem gente que não está aberta a falar, não quis falar comigo ou simplesmente não consegue falar. A pessoa chora tanto que não consegue nem gravar. É um trabalho muito delicado. Isso é uma dificuldade.
E como você contornou essa dificuldade?
Não foi um trabalho que fiz sozinha. Eu tenho uma equipe enorme. O Eduardo Morales, que trabalha comigo há mais 15 de anos, tem um contato direto com pessoas nessa situação; tem a JPO, que colocou uma equipe incrível para ajudar nesse trabalho, justamente porque não é uma tarefa fácil, é uma tarefa delicada, que precisa ter sensibilidade e conhecimento. A chave é o trabalho em equipe.
Falando do seu trabalho como criminóloga, quais são as dificuldade e particularidades de atuar em uma área tão dominada por homens? Já ouviu algum comentário machista?
Eu passei por um monte de casos machistas, não só pelo fato de ser mulher, mas também pelo fato de ser escritora, por exemplo. Teve uma vez, em um congresso, que um rapaz me apresentou pelo o que eu não sou. Ele foi lá ao palco e falou: “Nós trouxemos para falar aqui Ilana Casoy. Ela não é policial, não é advogada, não é psicóloga, não é psiquiatra”… Meu, tem tanta coisa legal que eu sou, porque você vai me apresentar pelo o que eu não sou? Não faz o menor sentido. E é um mundo muito masculino, mas a gente está abrindo o nosso espaço devagar. Temos hoje muita coisa que não tínhamos antes. É um caminho sem atalhos, então vamos ter mesmo que batalhar.
E eu deixo esses comentários [machistas] para lá. Não adianta ficar discutindo o que a gente já sabe que existe. E temos que educar. Educação é sempre o melhor caminho. Mulher tem que trabalhar o dobro e recebe pela metade. Temos esse problema. Mas eu acho que temos chance de melhorar e temos melhorado, e precisamos continuar lutando.
Porém, há casos que, pelo perfil da pessoa, é melhor trabalhar com homem. Por exemplo, no caso de um estuprador misógino que odeia mulher, tem que ter homem na equipe, porque ele não vai falar com uma mulher, ele não vai confessar um crime para uma mulher.
Em 2020, você fará sua estreia no cinema com o filme sobre Suzane Von Richthofen. Tem algo novo sobre o caso que você pode adiantar?
É tudo novo. Nós trabalhamos com duas versões: a do Daniel e a da Suzane. E eu aposto que você só conhece a versão da mídia. Então, tudo o que eu te contar é novo, correto? Muita pouca gente estava no júri e ouviu o que eles falaram e como é a história deles. Obviamente, foi um júri limitado de público, tinha uma limitação de lugares. E o maior prejuízo disso é que as pessoas só sabiam o resultado. Mas pessoas como eu, que são interessadas na análise do que aconteceu ali, como dois homens que talvez não matassem antes, mas que juntos foram letais, querem entender qual é a dinâmica para chegar a um acontecimento desses.
Então, é um trabalho muito diferente de fazer, muito novo, que traz a versão deles: Suzane e Daniel. Qual é a história que eles contam para nós podermos tirar as nossas próprias conclusões.
Eles são réus confessos, não se discute nem a autoria, nem a culpa [deles sobre o crime]. Nós sabemos que eles são os autores, que eles são culpados e que eles foram condenados e isso já está para lá de antigo. Agora, a versão deles, o que eles dizem que aconteceu ali e porque eles acham que esse crime aconteceu, essa é a grande novidade.
Em Nome da Justiça é uma coprodução Sony Pictures Television e JPO Produções que conta com direção geral de José Paulo Vallone, direção de Roberto Rana e roteiro de Yves Dumont. Assista o trailer abaixo:
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