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Chargista dos dilemas femininos, Maitena diz que sucesso não trouxe felicidade

Os quadrinhos sobre os dilemas femininos que ela criava lhe renderam fama e dinheiro, mas nunca abrandaram seu inferno particular. Nesta entrevista, a chargista Maitena Burundarena conta como se reinventou e tornou seu cotidiano mais suave e feliz

Por Redação M de Mulher
Atualizado em 31 out 2016, 11h32 - Publicado em 16 out 2013, 22h00

“Com a maturidade, deixamos para trás preocupações que não são importantes”, diz Maitena.
Foto: Sebástian Freire

Ela ganhou o mundo fazendo graça com o cotidiano e os dilemas das mulheres em histórias em quadrinhos. No início dos anos 2000, o nome Maitena era conhecido em pelo menos 30 países, onde os livros com as tirinhas dessa chargista argentina tinham sido lançados. Ao todo, foram mais de 2 milhões de exemplares vendidos. Só no Brasil, seu best-seller Mulheres Alteradas (Rocco) atingiu a marca de 400 mil cópias. As brasileiras também saborearam quadrinhos dela nas páginas de CLAUDIA, entre 2003 e 2008. Hoje, Maitena Burundarena, 51 anos, diz que, naquele momento em que vivia o auge do seu sucesso, não era uma pessoa feliz. Sentia-se angustiada, era dependente de bebida e cigarro, não pensava na própria saúde e mantinha uma relação doentia com o trabalho. No momento em que parou de publicar suas criações na revista, ela já estava promovendo uma revolução pessoal. Tinha decidido deixar a cidade de Buenos Aires e mudar-se com o marido, o produtor Daniel Kon, e os filhos para um pequeno povoado uruguaio, na Praia de La Pedrera, onde comprou uma mansão. Numa sucessão de fatos que se encadearam perfeitamente, enfrentou um grave problema de saúde que a fez abandonar o cigarro. Passou a se exercitar e ganhou forças para largar também a bebida. Mudou sua visão do trabalho e suas expectativas, resolveu redirecionar seu talento. Começou a se dedicar a ler mais e a escrever – algo que descobriu ser um desafio prazeroso. O resultado é o recém-lançado Segredos de Menina (Benvirá), romance com ingredientes autobiográficos. Nesta entrevista ela fala de rugas, filhos, busca da felicidade e outros temas tão femininos e interessantes.

VOCÊ TEM DITO QUE NÃO QUER MAIS FAZER HUMOR. POR QUÊ?

Por enquanto, só não quero desenhar mais. Meu novo livro tem humor, mas não é feito para rir. Cansei desse tipo de trabalho. Com o tempo, nós, humoristas, vamos ficando mais reflexivos e fazer piada de qualquer coisa se torna mais difícil. Depois de 25 anos rindo de tudo, quis buscar outros caminhos. O humor tem uma lógica própria que, uma vez que você a entende, perde a graça. Estava trabalhando no automático e preciso de desafios para me sentir estimulada. Como ralei muito e ganhei dinheiro com as tirinhas, me dei ao direito de abandoná-las e investir em algo que me desse prazer. Mas não sei do futuro. Não costumo planejar minha vida para além de uma semana.

ENTÃO VOCÊ NÃO PERDEU O BOM HUMOR?

De jeito nenhum! Apenas quis me sentir desafiada. Não preciso de cirurgia plástica para me sentir jovem; preciso de desafios. E, sabe, eu poderia ter uma visão mais amarga do envelhecimento. Mas estou achando que esse processo é até divertido. Mesmo porque estou bem melhor do que aos 30 anos! (risos) Uso um biquíni muito menorzinho hoje do que aos 25. Mas, de verdade, quando vejo minhas rugas no espelho, rio. É o que me resta. O que fazer? Vou me puxar toda? Não! E espero que eu siga rindo disso nos anos que virão.

E O QUE MAIS FAZ COM QUE SE SINTA DESAFIADA HOJE?

Escrever. Acabei um romance e estou preparando o próximo. Neles, quero aprofundar temas dos quais já ri no passado. Na verdade, é um projeto de vida e mudei minha rotina para realizá-lo. Para escrever, é preciso ler muito, algo que não conseguia fazer porque trabalhava demais. Há quatro anos, leio durante quatro horas por dia. Depois passo uma parte do dia escrevendo. Estou achando isso uma delícia.

Chargista dos dilemas femininos, Maitena diz que sucesso não trouxe felicidade

Uma foto de Maitena com 14 anos estampa a capa de seu primeiro romance.
Foto: Marcelo Iaccarino/ Divulgação

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ESSE SEU PRIMEIRO ROMANCE FALA SOBRE UM MOMENTO DELICADO DA VIDA DAS MULHERES, QUE É A PASSAGEM DA ADOLESCÊNCIA PARA A VIDA ADULTA. POR QUE ESCREVER AGORA SOBRE ESSA FASE?

Não sei. No início, achei que seria uma história de aventura divertida: a menina na rua, suas descobertas sexuais… Com o tempo, vi que a história foi para outro lado e se tornou um romance triste, que trata de religião e política, coisas sobre as quais nunca pensei que fosse falar. Foi o que saiu. A escrita flui sozinha, e isso é encantador.

DO QUE TRATARÁ SEU PRÓXIMO LIVRO?

Será um romance sobre maternidade. É uma relação que me interessa e quero me dedicar a pensar no vínculo entre mãe e filho. Tive a minha mais velha aos 17 anos; depois, outro bebê aos 19. Perdi um menino no parto aos 21, e minha caçula nasceu quando eu tinha 37. Fui mãe a vida inteira. Também quero falar dos filhos que não estão aqui – e que, para as mulheres, são filhos da mesma forma. Quando se sofre um aborto, por exemplo, é como ter um filho, porque existe um vínculo. Acredito que todas as mulheres, inclusive as que não são mães, têm de lidar com esse assunto na vida. Vão querer ter ou não? Por quê? Qual é a hora certa? Talvez seja essa a nossa grande diferença em relação aos homens. Eles não podem engravidar. Mas bem que mereceriam passar por isso (risos)!

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TODOS OS SEUS TRABALHOS, DESDE AS TIRINHAS, ABORDAM, DE ALGUMA FORMA, TEMÁTICAS FEMININAS. POR QUÊ?

Só me dei conta de que os personagens masculinos eram menos fortes e importantes depois que terminei o livro. E aí percebi que minhas obsessões continuam as mesmas (risos). Talvez meu mundo seja pequeno. Não importa.

OU SERÁ PORQUE A INDÚSTRIA DE PRODUTOS CULTURAIS VOLTADOS PARA AS MULHERES ESTEJA CRESCENDO?

Acho que o boom dessa indústria foi nos anos 1990, quando surgiram táxis, hotéis, livros, filmes para mulheres. Na verdade, não gosto muito dessa onda. Acho que nos segrega. Também não acredito que sejamos tão diferentes assim dos homens. Todos nós temos características masculinas e femininas na personalidade, independentemente da opção sexual.

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COMO FOI O PROCESSO DE ABANDONAR OS VÍCIOS?

Uma coisa alimentou a outra. Primeiro, tive um problema de saúde, precisei operar a garganta e fui obrigada a largar o cigarro. Assim, descobri meu corpo, que só conhecia na hora do sexo ou de vestir uma roupa. Não estabelecia uma relação de saúde com ele. Comecei a correr e fazer pilates e hoje tenho o corpo que sempre sonhei.

E COMO PAROU DE BEBER?

Comecei a beber aos 24 anos, depois que perdi aquele filho no parto. Existem diferentes graus de alcoolismo. Eu era do tipo que não tem controle sobre a hora de parar; não era daquelas pessoas que bebem todos os dias. Saía com amigos e pedia uma garrafa, depois outra, depois uma dose de vodca e mais uma. Quando estava sóbria, prometia a mim mesma que me controlaria da próxima vez, mas não conseguia. Lá pelos 30 anos, fui aos Alcoólicos Anônimos (AA), mas achei que não tinha nada a ver com aquelas pessoas. Os frequentadores tinham perdido trabalho, família, e eu, ao contrário, tinha tudo: amor, sucesso, dinheiro, carinho. Dez anos mais tarde, acordei um dia e disse que não beberia mais. Coloquei em prática os ensinamentos do AA e parei sozinha. A sensação de controle é muito boa. Acho ótimo acordar depois de uma festa me sentindo bem, sem ter feito coisas que não queria ou dito o que não devia. Como esse é um problema que não tem cura, não bebo nada. Nunca, jamais.

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VOCÊ CONTINUA OBSESSIVA?

Hoje sou viciada em exercício. Faço uma hora de pilates e corro todos os dias, sem falha. Também tomo água e masco chicletes o tempo inteiro. São meus truques.

VOCÊ É MAIS FELIZ HOJE DO QUE NO PASSADO?

Muito mais. Com a maturidade, deixamos para trás preocupações que não são importantes, como a necessidade de ocupar um lugar de destaque no mundo, na sociedade. Quando era jovem, me preocupava em ser alguma coisa, vivia com a sensação de que estava perdendo algo. Nunca perdemos nada. Se não estamos em um lugar em determinada hora, é porque não tínhamos de estar lá.

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MAS VOCÊ FALA ISSO DEPOIS DE TER ALCANÇADO SUCESSO.

Quando conquistei, me dei conta de que a fama não era tão importante e fui deixando isso para trás. Parei de trabalhar e dar entrevistas para a imprensa argentina. Deixei o cabelo crescer para não ser reconhecida nas ruas.

POR QUE NÃO GOSTA DE SER RECONHECIDA?

O reconhecimento do trabalho é bom. Mas a fama não traz felicidade nem apaga os problemas. E viver como uma celebridade é perigoso. Você pode começar a achar que é o centro do mundo, que é importante. A vaidade consome muito tempo. Sempre gostei de conversar e fazer novos amigos. Quando você é famosa, as pessoas ficam intimidadas, e aí tem algo que não flui.

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