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O que será da educação de crianças e adolescentes após a pandemia?

O sistema de ensino precisou criar uma estratégia de emergência durante o isolamento, mas nada indica que o retorno será fácil

Por Isabella D'Ercole Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 7 Maio 2020, 15h10 - Publicado em 2 Maio 2020, 15h30

Crianças em casa, professores dando aulas em vídeo e pais à beira de um ataque de nervos. O sistema de ensino precisou criar uma estratégia de emergência durante o isolamento, mas nada indica que o retorno será mais fácil ou que tudo voltará a ser como antes

 

A engenheira química Daniela Atienza não guarda as melhores lembranças da época em que estudou em um colégio que separava os alunos em salas de acordo com as notas. O modelo tradicional, que estimula a competição e geralmente se gaba de ter os estudantes nos pódios dos grandes vestibulares do país, não impressionou a paulista de 40 anos. Quando chegou sua vez de escolher um método de ensino para as filhas, preferiu uma escola que oferecesse mais práticas lúdicas. Desde que as aulas presenciais foram interrompidas devido ao isolamento coletivo, ela acompanha as pequenas Manuela, 6 anos, e Giovanna, 3, nas atividades em vídeo de música e educação física, além de inglês e dos exercícios para o processo de alfabetização da mais velha. Na casa dela, a TV fica desligada a maior parte do tempo e os momentos em família são para estimular experiências artísticas, como a dança. Junto com as meninas, Daniela, e o marido pintaram um cartaz que fica pendurado na sacada. Nele, há um arco-íris e a frase: “Vai ficar tudo bem”.

É verdade que a crise que vivemos hoje vai passar. Mas, ao menos na educação, é bastante improvável que tudo volte a ser como antes, segundo apontam os especialistas. “Todos nós fomos pegos de surpresa e agora vemos professores e escolas tentando se adaptar às plataformas e sistemas virtuais ou, no caso das instituições públicas, criando estratégias para alcançar os alunos”, explica Georgia Vassimon, psicopedagoga do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. Algumas turmas do ensino fundamental 2 e médio (estudantes de 11 a 18 anos) já tinham certa familiaridade com o ambiente digital, fazendo entrega de tarefas e leitura de textos por esse meio, mas os mais novos, principalmente na fase de alfabetização, como Manuela, que não eram estimulados a ficar muito tempo em frente à telas, dependem de experiências de contato para seu desenvolvimento.

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48,4 milhões de crianças e adolescentes estão matriculados na educação básica no Brasil, distribuídos em 184,1 mil escola

 

Asmática, a motorista de van escolar Daniela Silvestre da Silva parou de trabalhar no começo de março. Em seguida, soube pela diretora da creche que duas professoras do seu filho caçula, Henrique, de 1 ano e 9 meses, estavam com coronavírus. Não deixou o menino voltar mais. Uma semana depois, as aulas do mais velho, Edson, 5 anos, foram canceladas na escola municipal do bairro de Paraisópolis, em São Paulo. Mesmo em meio às férias concedidas pela prefeitura, diretora e professoras trocaram com as mães atividades para entreter as crianças. Mandaram fotos de páginas de livros e vídeos contando histórias, indicaram brincadeiras. “Eu escrevo com o Edson o abecedário e os números para ele não esquecer, peço para juntar consoantes e vogais e ver que som sai. Falo para contar para o irmão as histórias dos livros para ver o que ele entendeu”, afirma a paulistana de 33 anos. “A participação dos pais deve ser assídua, principalmente com os pequenos. E é importante tentar, ao máximo, manter a rotina”, explica Fernanda Pierre Gimenes, presidente do Conselho Regional de Pedagogia de São Paulo.

A situação entre pais e escolas anda tensa. As aulas já foram interrompidas e depois retomadas em algumas instituições. Há pais que pedem mais horas online, outros afirmam não darem conta das tarefas do trabalho, da casa e ainda do esforço com os pequenos. A curto prazo, a solução será individual, mas o que acontecerá com a educação no futuro já que não estamos cumprindo o planejamento anual? “No retorno às aulas, não poderemos fingir que nada aconteceu e retomar as atividades normalmente. Ninguém vai querer abrir livro, e sim correr, brincar com os colegas. Vamos ter que conversar sobre esse período. E os pais vão ser fundamentais para a gente encontrar um novo caminho”, explica Beatriz Takayama, professora de um colégio privado de São Paulo. “A instituição que insistir em permanecer igual, em vez de se reorganizar com base em tudo isso que estamos observando agora, estará perdendo o rumo da história”, completa Georgia. Mudanças comportamentais e reflexões durante a quarentena dão indícios de para onde iremos.

Giovanna e Manuela, que pintaram o cartaz para deixar na varanda (Acervo pessoal/CLAUDIA)

O mundo mágico

Sem a agenda de festinhas, encontros de família ou atividades fora de casa, os hábitos de fim de semana mudaram bastante. “Fazemos massinha, desenhamos, pintamos com aquarela”, conta Daniela. Nas redes sociais, têm aparecido adeptos de quebra-cabeças, de experiências científicas com ingredientes da cozinha, de jogos de tabuleiro. A volta dos momentos lúdicos acontece porque a tela ficou sobrecarregada. Já que não saímos, passamos mais tempo grudados no celular e na TV, que deixaram de ser uma ferramenta de lazer como antes.

A professora de escola privada Isabel Lauretti, também de São Paulo, tem trocado cartas com os alunos de 5 e 6 anos – que raramente usam o sistema dos correios. “Com tanta tensão no ar, precisamos mais do que nunca de música, poesia, coisas bonitas para alimentar o espírito”, defende. “Estamos revalorizando o tempo. Desacelerar é a oportunidade de recuperar a sensibilidade que perdemos com a rotina corrida e mostrar para os pequenos os detalhes, como a trajetória de uma planta até ela estar pronta para brotar.”

A mãe de Henrique e Edson também têm recorrido às atividades lúdicas para passar o tempo e reforçar os aprendizados escolares recentes (Acervo pessoal/CLAUDIA)

Tempo na tela

O uso de aparatos digitais para atender às aulas online foi um desafio em muitos lares. A servidora pública Janine Mota, 40 anos, de Araguatins (TO), não havia dado celulares para os filhos João Otávio, 10, e Julia, 9, antes da pandemia e pretende continuar assim. Todo dia, às 8 horas e às 14h30, ela precisa estar em casa – apesar da redução de horas, Janine continua trabalhando no escritório – para as crianças assistirem às aulas pelo aparelho dela. “Vejo que eles estão adquirindo mais autonomia nos estudos. Os professores vão ter que se adaptar a esse comportamento posteriormente”, acredita.

“A escola e a internet não mantinham a melhor das parcerias. Existia o medo de que a web fosse considerada uma substituição e disputasse a atenção dos alunos. Então, esse aprendizado por parte da instituição do uso positivo da ferramenta é bom para o futuro. Contudo, controlar o tempo de tela continua sendo algo de extrema importância”, reflete Izilda Freitas Rolim, psicopedagoga do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. A indicação é que, após a volta às aulas nas escolas, os pais monitorem quanto tempo os filhos ficam em frente à TV, ao computador ou ligados no celular. O ideal é manter alguns dos hábitos lúdicos adotados durante o isolamento, além de retomar as atividades físicas.

(Getty Images/Getty Images)

O contato diário

Não tinha nem uma semana de isolamento e já pipocavam nos grupos de mães memes dizendo que professoras deveriam ganhar salários milionários. “Os pais estão entendendo melhor o nosso trabalho, assistindo de perto os desafios diários”, afirma Rosemary dos Santos, professora da rede municipal paulistana. “No caso das escolas públicas, há o adicional do ambiente propício para o brincar, que a criança às vezes não tem em outros lugares”, diz ela. Além de aproximar a relação com os profissionais que cuidam dos filhos, os pais podem reavaliar as escolhas educacionais. “Muitas vezes, a opção pela escola é por causa da localização ou de um método que não compreendem plenamente. É o momento de repensar se desejam continuar nesse caminho ou mudar”, acrescenta Georgia.

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