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Sofia Menegon

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Sofia Menegon é feminista, idealizadora da podcast Louva a Deusa e consultora em relacionamento e sexualidade

Ela disse que transar comigo era horrível

Naquele dia eu perdi a minha espontaneidade no sexo. Me senti quebrada, incapaz de voltar a transar sem medo

Por Sofia Menegon
27 jun 2023, 10h49
Mulheres na cama
Naquele dia eu também aprendi que há limites para a franqueza e que nem sempre precisamos dizer tudo que vem a mente (Yan Krukau/Pexels)
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É uma lembrança sorrateira, daquelas que pega a gente desprevenida. Às vezes, eu estou trabalhando, lavando louça, transando e ela vem. E, quando vem, repete e repete e repete.

Tínhamos saído daquele samba que ela gostava com fome. Então, resolvi levá-la ao meu restaurante favorito. O meu lugarzinho em São Paulo, que eu quis dividir com ela. E ali, naquela mesa tão minha, num lugar tão meu e tão íntimo, ela soltou a frase que ecoa infinitamente na minha cabeça: “foi horrível”. Ela se referia às transas que tivemos.

Eu queria dizer que ela vomitou essa frase, mas não. Ela golfou. Foi rápido, sem aviso, sem sinais. Só saiu. Era horrível transar comigo. Foi com essa declaração que eu fiquei. E fiquei sem saber o que dizer de volta, sem saber como reagir. Como se reage a uma franqueza tão bruta, tão violenta, tão impiedosa? Eu não reagi ali. Chorei depois, no carro. Ela tentou dar uma explicação qualquer para que eu parasse de chorar e ela pudesse se livrar do remorso. Mas eu ainda choro quando a ouço dizer na minha cabeça.

Mulher triste na cama
Ela tentou dar uma explicação qualquer para que eu parasse de chorar e ela pudesse se livrar do remorso. Mas eu ainda choro quando a ouço dizer na minha cabeça (Alex Green/Pexels)

“Eu sei que era sobre ela, eu sei. Mas tem coisas que simplesmente ficam por tempo demais porque nunca deveriam ser ditas assim”

Sofia Menegon
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Naquele dia eu perdi a minha espontaneidade no sexo. Me senti quebrada, incapaz de voltar a transar sem medo. Passei a ficar insegura sobre o que faço ou deixo de fazer. Tem dias em que performo uma pessoa que não sou. Tem dias em que performo e choro muito depois. E tem dias em que prefiro nem começar, porque sei que ela vai aparecer para lembrar que é horrível transar comigo.

Eu gostei de transar com ela. Era terno, tranquilo, com tempo. Eu me sentia abraçada, acolhida, desejada. Ela fez parecer que era seguro estar ali. Aqueles livros sobre gênero, sexualidade, relacionamentos. Aquele abraço firme. O carinho no meu rosto e o olhar sempre atento. Ela me ouvia e debatia com convicção. Era incoerente, ambígua, complexa, como eu costumo achar bom que sejam as pessoas. E, então, doeu mais porque eu fui aberta, de peito aberto.

Eu sei que não é horrível. Eu sei. Eu sei que era sobre ela, eu sei. Mas tem coisas que simplesmente ficam por tempo demais porque nunca deveriam ser ditas assim. Naquele dia eu também aprendi que há limites para a franqueza e que nem sempre precisamos dizer tudo que vem a mente. Aprendi que tem gente que quebra a gente porque já está quebrada, mas isso não ameniza a dor.

Agora, o que eu tenho aprendido com o trauma que ficou é que eu posso dar um tempo. Aprendi que dividir essa dor com quem eu me relaciono ajuda. Não sei se um dia ela vai sumir daqui. Eu espero, honestamente, que sim. Mas, enquanto isso, vou seguindo sendo o que ela não pôde ser: gentil comigo mesma e com os meus processos.

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