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Renata Brosina é jornalista, host de podcast e editora de moda com foco em luxo e sustentabilidade. Com 15 anos de carreira e alguns títulos internacionais no currículo, ela é curiosa, gosta de entrevistar e vestir pessoas, e analisar as transformações que vêm acontecendo no mercado.
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(Des)uniformizar: como a moda pode tirar os rótulos impostos às mulheres

De Miuccia Prada a Kim Jones, diretores criativos vêm testando os limites e quebrando as caixinhas que moldam nossos gostos pessoais

Por Renata Brosina
20 Maio 2023, 10h20

“É possível se interessar por literatura e ser gostosa ao mesmo tempo?” Me vi surpresa com essa questão circulando nas últimas semanas pelos perfis no Instagram, impulsionada pelo texto “Livro e decotão”, da coluna de Lorena Portela no site da CLAUDIA. O questionamento é genuíno, porque, no nosso imaginário, fomos condicionados a assimilar interesses a estéticas padronizadas. Afinal, há quem diga que a exposição do corpo não combina com o lado intelectual da força.

Porém (e sorte a nossa), a moda vem provando que, cada vez mais, diretores criativos investem na quebra de estereótipos — ou melhor, nos uniformes criados pela própria sociedade. Mesmo que as roupas sejam uma forma de comunicar, há um território a ser explorado na maneira como mostramos nossos gostos por aí. E o desafio começou faz tempo.

Foi na temporada de Verão 2021 da Alta-Costura que Kim Jones estreou na Fendi. Para a sua primeira coleção, o designer britânico trouxe uma das suas maiores fontes de inspiração: a literatura inglesa. Mr. Jones tem uma adoração pelo Bloomsbury Group, que contava com artistas e escritores do início do século 20 e, por isso, Orlando, escrito por Virginia Woolf e publicado em 1928, foi o escolhido como referência para o seu début. Ao longo da apresentação, uma construção de imagem baseada nas transformações que o personagem principal do livro passou ao longo da sua trajetória.

Em paralelo, no mesmo ambiente da passarela, modelos estavam com seus livros abertos, dentro de uma espécie de vitrine. Quem não sabia do que se tratava o romance de Woolf, questionou a relação estética entre os visuais tradicionais de pessoas que gostam de ler e a coleção apresentada por Kim. A discussão alcançou comentários que traziam uma relação incompatível entre transparência e decote com… o gosto pela leitura. A questão é que a moda é conhecida por ter sua veia transgressora, mas, dentro do ponto de vista do público, a mensagem pareceu incoerente — e não um “Oba, finalmente podemos usar decote, leitoras!”

Talvez a missão de desconstruir uniformes pareça mais fácil nas mãos de Miuccia Prada, conhecida por rejeitar o óbvio e “belo” comum. Desde a estreia da Prada na passarela de prêt-à-porter no final da década de 1980, a italiana criou uma relação interessante com a ideia de repensar o guarda-roupa. O seu trabalho em cima das interpretações do conceito de uniformes acabou criando um elo tão forte que quem conhece a marca a fundo, sabe que é esperado um novo questionamento sobre sua função a cada desfile.

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Coluna Por trás da moda, desuniformizar
(Arte Catarina Moura/CLAUDIA)

Na última temporada de Inverno 2023, Miuccia, ao lado de Raf Simons, trouxe uma série de uniformes baseada na valorização do modesto, seja nas profissões humildes, que se distanciam do glamour ou beleza, ou ainda em peças que carregam uma mensagem construída no inconsciente feminino — que, muitas vezes, precisam de uma readaptação para os dias de hoje. Foi assim que jalecos de enfermeiras se transformaram em vestidos-camisas, com caudas curtas aplicadas; parkas, camisas e detalhes típicos de vestes militares ganharam versões modernas e elegantes; além dos vestidos de noiva que surgiram de maneira inesperada.

Diferente do contexto dos trajes relacionados às profissões, a roupa do dia do casamento é construída ao longo da vida da mulher como uma espécie de meta. Digo, desde a infância, o vestido branco, com véu e grinalda, é mostrado pela sociedade como um indicativo de sucesso na vida da mulher. Feminista genuína, Miuccia também mostra que, diferente do que é nos ensinado desde meninas, não é necessário casar para sermos especiais — ou completas.

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Miuccia sentiu que usar o questionamento dos padrões na Prada não foi o suficiente. Ainda na mesma temporada, ela levou esse desconforto para a Miu Miu também. Afinal, quem imaginaria ver secretárias descabeladas nos seus devidos escritórios? Foi a partir disso que a passarela foi construída — sob o olhar disruptivo de Miuccia e com a ajuda da stylist Lotta Volkova (que é outra rebelde por natureza).

Juntas, elas criaram uma atmosfera forte, em tom de amadurecimento nas últimas coleções, para mostrar que a vida livre da sua eterna garota é desprendida de conceitos pré-estabelecidos e, se ela quiser desfilar por aí com os fios fora do lugar, com transparências, comprimentos curtíssimos ou até mesmo o conjuntinho tradicional, ela pode. Os cardigãs estão lá, assim como os suéteres e as peças de alfaiataria. Ela quer ser livre para usar o que quiser, sem julgamentos. Mesmo que nas entrelinhas, a moda vem nos desafiando a mudar.

Seja no ambiente acadêmico, profissional ou corriqueiro, hoje, é importante questionar rótulos e compreender a partir de qual movimento existem maneiras de transformar estilos que, em algum momento, podem colocar uma mulher dentro de potinhos com suas devidas etiquetas. O mundo é outro e as influências estão mudando: não há nada de errado em querer-e-poder mudar as regras, que foram válidas nas décadas passadas. Afinal, convenhamos, será que ainda é de bom tom questionar se quem dedica horas do seu dia à leitura também frequentaria uma aula de crossfit?

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