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Trisais: confira relatos emocionantes de quem vive à três

Um olhar afetivo e intimista sobre a vida de trisais mostra que, acima de quaisquer formatos ou acordos, o amor sempre será livre em sua essência

Por Kalel Adolfo
9 set 2022, 08h39
Discussões sobre o poliamor vêm aumentando desde que o termo se popularizou nos Estados Unidos nos anos noventa.
Discussões sobre o poliamor vêm aumentando desde que o termo se popularizou nos Estados Unidos nos anos noventa.  (Eduardo Pignata/Reprodução)
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Quem disse que não podemos amar mais de uma pessoa simultaneamente? Será que Deus está tão preocupado com quem amamos ou deixamos de amar? Tais perguntas não têm respostas fáceis, muito menos absolutas. O fato é que, desde 1990 — década que popularizou o termo “poliamor” nos Estados Unidos —, a decisão de honrar os próprios sentimentos e viver uma vida autêntica está falando mais alto do que a escolha por pertencer a uma instituição religiosa tradicional que estabelece regras rígidas para uniões afetivas.

É claro que, em uma sociedade pautada em valores que alimentam o patriarcado e a propriedade privada, a não-monogamia ainda é vista com forte repúdio. Em 2018, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu que cartórios registrassem escrituras de uniões poliafetivas, favorecendo a marginalização de núcleos familiares que não sigam o famigerado script.

Mesmo assim, isso não impediu que os trisais, relacionamentos compostos por três pessoas, como os que você conhece a seguir, atraíssem milhares de seguidores em suas redes sociais ao compartilhar suas rotinas. Seja por curiosidade, desejo de aderir ao formato ou até mesmo para julgar, as pessoas vêm demonstrando cada vez mais interesse em acompanhar o que podemos definir como uma silenciosa revolução amorosa.

E são eles mesmos que contam os altos e baixos dessa possível organização afetiva que desafia tanto as convenções sociais quanto a si mesmos na busca por um afeto que esteja em sintonia com quem se é.

A Balada que Mudou Tudo

Casados há 15 anos e pais de duas meninas, Priscila Corrêa e Marcel David, ambos com 38 anos, viviam nos moldes da típica família tradicional brasileira. As coisas começaram a mudar quando Priscila trocou de emprego e conheceu a assistente social Regiane, com quem se identificou imediatamente. Tamanha sintonia não demorou para se transformar em atração — mas ambas permaneceram em silêncio sobre seus sentimentos.

Neste meio tempo, Pri apresentou Rê tanto a Marcel — que a adorou logo de cara — quanto às suas filhas, que não conseguiam se desgrudar da colega. Mesmo ao se tornarem íntimos, os três continuavam a manter os sentimentos em segredo (por mais que rolasse uma faísca aqui e ali).

As coisas só esquentaram após o trio decidir curtir uma noite na balada. Em meio a drinques e luzes eletrizantes, Rê criou coragem e beijou Pri pela primeira vez. Romântico, né? Só que não! Assim que a declaração rolou, a noite virou um mar de discussões.

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A fim de acalmar os ânimos, Marcel decidiu levar as mulheres para casa: “As crianças não estavam, então arrumamos o quarto delas para a Regiane dormir. Aproveitamos e conversamos sobre o que tinha acontecido. Resultado? Os três acabaram ficando pela primeira vez. Isso foi se repetindo semana após semana, até o momento em que a brincadeira virou paixão e, depois, amor”, explica ele.

O processo de desconstrução dos antigos moldes afetivos não foi fácil: além de serem evangélicos, Priscila e Marcel cresceram em um ambiente familiar conservador.

Ela desabafa que, ao contar sobre o trisal para a família, foi rejeitada por todos: “Até hoje eles não falam comigo. Precisei de muita terapia para lidar com isso. Aliás, foi através do tratamento psicológico que descobrimos como contar às crianças. Elas lidaram muito bem, pois já estavam acostumadas a viver com nós três. A mais velha, que tem apenas 10 anos, me deu uma aula fantástica sobre bissexualidade. Ela sabe mais do que eu”.

O trio também conta que, nos primeiros meses, o medo do julgamento era intenso. Contudo, o nascimento de Pierre — gestado por Rê durante a relação — fortaleceu a todos.

O nosso bebê foi um divisor de águas. A responsabilidade de criar uma família nos fez despriorizar a opinião alheia, porque temos muitos sonhos para viver e não há tempo a perder”, diz Priscila.

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A RESPONSABILIDADE DE CRIAR UMA FAMÍLIA NOS FEZ DESPRIORIZAR A OPINIÃO ALHEIA, PORQUE TEMOS SONHOS A VIVER E NÃO HÁ TEMPO A PERDER.

Priscila Corrêa, do @trisalamoraocubo

 

Por fim, ela revela que deseja aproveitar a sua plataforma nas redes sociais (olhe lá o @trisalamoraocubo) para inspirar mais pessoas a aceitarem (ou até viverem) o poliamor. “Não importa se amanhã eu decidir ser monogâmica. Quero sempre lutar para que famílias como a minha tenham seus direitos.”

Unidos pela pandemia

A essência do amor sempre será livre.
A essência do amor sempre será livre. (Eduardo Pignata/CLAUDIA)

Juntos desde 2009, Isane Farias, 34, e Igor Almeida, 32, sempre cogitaram abraçar a não-monogamia. Porém, foi apenas em 2017 que os dois abriram o relacionamento. No final de 2019, conheceram Íris Ribeiro, 30, numa despedida de solteiro.

Os três compartilhavam os mesmos ideais: eram contra os padrões de relacionamento impostos pela sociedade e valorizavam a liberdade em vínculos amorosos.

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“Antes mesmo de nos relacionarmos sexualmente, houve uma conexão mental e afetiva muito grande”, conta Íris. A química entre o trio foi crescendo, os encontros foram ficando cada vez mais frequentes e tudo parecia normal… Até a quarentena começar no Brasil, em março de 2020.

ANTES MESMO DE NOS RELACIONARMOS SEXUALMENTE, HOUVE UMA CONEXÃO MENTAL E AFETIVA MUITO GRANDE.

Íris Ribeiro, do @nossatriiiade_

 

“A notícia de que precisávamos escolher com quem iríamos passar os próximos dias nos deixou assustados. Por isso, decidimos ficar todos no mesmo apartamento. Se não estivéssemos juntos desde o início da pandemia, talvez não conseguíssemos mais nos ver”, explica Isane. O que eles — e o mundo inteiro — não esperavam é que a situação fosse se arrastar por mais de dois anos.

“Na época, estávamos morando juntos há seis meses. Por isso, conversamos e percebemos pela primeira vez que éramos um trisal. Não tinha mais porque estar separados”, esclarece Igor. O trio conta que não é nada fácil lidar com o hate online e as constantes piadas que chegam até eles.

“O Igor, enquanto homem, ouve coisas como ‘Ah, que bom, tá com duas mulheres’. Ele é alfinetado, mas vangloriado. Já eu e Isane escutamos que nós não nos valorizamos por aceitar isso. Incrível como sempre colocam o homem no centro da relação e invalidam a nossa escolha. Mal sabem que o trisal começou pela conexão entre nós duas”, declara Íris.

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Para driblar o machismo, elas contam que estão sempre estudando para disseminar informações verdadeiras sobre o poliamor na internet. E o ciúmes? Bom, segundo Igor, o sentimento é praticamente inexistente na relação: “Não é um problema quando um está com a energia mais voltada para o outro. Tem questão de gosto. Às vezes, algo combina mais entre as duas, e está tudo bem”, conclui. Atualmente, os três vivem num formato de relacionamento não-monogâmico.

Do caos ao amor

Natalia Bezerra, 26, e Diogo Simon, 33, já estavam casados há anos quando conheceram Graziela, 31, através de amigos em comum. Os três compartilhavam uma enorme atração, e, por isso, estavam sempre ficando despretensiosamente.

O suposto lance casual foi colocado à prova quando o casal presenciou Grazi ficando com outra na frente deles. “Nós não gostamos nada”, relembra Natália. Assim que viram a cena, o trio de “amigos-coloridos” entrou em conflito e decidiu encerrar as brincadeiras.

O que veio a seguir? Uma choradeira que tomou conta de todos. “Por dois dias, a Nat não parava de chorar. Então, liguei para a Grazi e falei: ‘Precisamos conversar’. Nos emocionamos durante o papo e, ali, percebemos que precisávamos ficar juntos”, conta Diogo.

Alguns dias se passaram, e os dois decidiram oficializar o trisal. “Fiquei uma semana com a aliança na bolsa. Lembro que estávamos em casa, nos sentindo vulneráveis, porque havíamos acabado de perder um amigo. Pedimos a Grazi em namoro nesse momento de fragilidade”, compartilha Nat.

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Diogo reitera que, apesar do que muitos pensam, ele e sua esposa não trouxeram uma terceira pessoa ao relacionamento para apimentar a dinâmica. “Nossa relação estava fantástica e nós apenas a estendemos. Não queríamos ser um trisal, mas os três se apaixonaram e, quando vimos, já estávamos juntos. Tudo aconteceu naturalmente porque as rotinas simplesmente se encaixaram”, diz Diogo.

No final do ano passado, o trio realizou um casamento simbólico na praia, com direito a pôr-do-sol e muito romantismo. E é essa conexão genuína que os fortalece. “As pessoas vão julgar se você estiver num casamento, solteiro ou vivendo a três. Mas a verdade é que crítica nenhuma muda a nossa essência. Estamos felizes porque vivemos a verdade de quem somos”, finaliza Natália.

AS PESSOAS VÃO JULGAR SE VOCÊ ESTIVER NUM CASAMENTO, SOLTEIRO OU A TRÊS. ESTAMOS FELIZES PORQUE VIVEMOS A VERDADE DE QUEM SOMOS.

Natália Silva, influenciadora do @vivendoatres_

 

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