Carga Mental: Mulheres ficam esgotadas por tarefas invisíveis
Elas precisam planejar e coordenar as tarefas do lar, além de muitas vezes pedir aos maridos para que façam algo – e isso cansa
Mesmo em lares onde as tarefas são dividas de maneira equivalente, é comum a mulher acabar sobrecarregada por realizar a maior parte do trabalho de gerenciar a família. Embora alguns homens entendam sua corresponsabilidade no cuidado do lar e das crianças, geralmente eles precisam receber ordens do que e como fazer, gerando uma carga mental às parceiras.
As mulheres, o trabalho doméstico e a carga mental
Se no mundo dos negócios os homens ainda detêm o poder e ditam as regras, em casa a dinâmica é bastante diferente. Planejar, organizar e tomar as decisões relacionadas ao lar e às crianças geralmente ficam nas mãos das mulheres.
Elas programam, preveem erros e tomam conta de todas as interações entre as partes. Tudo isso enquanto cozinham, limpam, educam e trabalham fora de casa.
Parcela dos homens está preocupada em participar da divisão de tarefas, é verdade, mas a maioria apenas executa as ordens que, muitas vezes, devem ser verbalizadas mais de uma vez e de forma convincente. O resultado é a necessidade delas gerenciaram famílias inteiras.
Não é exagero dizer que esse trabalho invisível e, ao mesmo tempo, fundamental para o bom funcionamento da casa incentiva mulheres a pararem de trabalhar apenas quando dormem. Afinal, elas precisam criar a lista de compras do mercado, conferir se as crianças estão comendo adequadamente, assegurar que os maridos vão fazer suas funções de maneira correta e mais uma porção de coisas que sequer cabem neste parágrafo.
É nesse lugar que surge a carga mental, um esforço mental e intelectual para organizar todos os compromissos da dinâmica familiar.
O que é carga mental?
Carga mental é o cansaço em decorrência do trabalho invisível de gerenciamento das tarefas domésticas. O assunto começou a ser falado nos anos 1970, graças à escritora Silvia Federici. De lá para cá, pesquisadoras e feministas aperfeiçoaram o tema, que ficou popular nas redes sociais depois que um artigo do The Guardian, da colunista Jess Zimmerman, viralizar.
Na década de noventa, a socióloga Susan Walzer pontuou a carga mental das mulheres, principalmente depois de passarem pela maternidade. A especialista descobriu que elas fazem a maior parte do trabalho intelectual e emocional na criação dos filhos e na organização da casa.
As consequências da carga mental
Esse trabalho mental permite à família seu funcionamento, mas é extremamente desgastante em níveis emocionais.
Aqui, vale o destaque: a divisão do trabalho doméstico é desigual. Segundo o relatório desenvolvido pela Oxfam em 2020, 90% do trabalho de cuidado no Brasil é feito informalmente por famílias e, desses 90%, quase 85% é responsabilidade de mulheres.
Em solo brasileiro, de acordo com dados do IBGE referentes a 2022, as mulheres dedicam 9,6 horas a mais que os homens nos afazeres domésticos e/ou cuidados de pessoas.
Essa configuração, logicamente, traz problemas a elas. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mulheres estão mais expostas a riscos de saúde mental pela sobrecarga física e mental decorrente dessa dinâmica.
“Contar com uma rede de apoio é fundamental para a saúde da mulher. Não somente pelo alívio dessa sobrecarga que vivemos, mas também para essa mulher se sentir acolhida e pertencente ao seio familiar e não somente uma peça que funciona muito bem dando conta de tudo”, pontua a terapeuta familiar Lilian Ferreira (@terapeutalilianferreira).
Mas isso implica não só na saúde física e mental delas, como também na financeira: sobra menos tempo para se profissionalizar.
O impacto da carga mental para as finanças pessoais das mulheres
Quando a mulher precisa estar à frente de todas as tarefas domésticas, possui pouquíssimo tempo para cuidar das finanças ou investir na própria carreira.
“É impossível falar sobre finanças sem fazer esse recorte de gênero”, afirma Bruna dos Santos (@eibrunadossantos), mentora financeira de mulheres. As mulheres, em geral, ganham menos, porque, dentre outros fatores, têm menos tempo disponível para se dedicar a atividade remunerada, uma vez que, em comparação aos homens, dedicam o dobro de tempo nas tarefas domésticas e de cuidado com a casa e os familiares, explica a especialista.
“Sobra muito menos grana disponível, quando sobra, para a realização de sonhos e construção de patrimônio ao longo da vida, o que gera uma enorme frustração e afeta sua carreira, relação consigo mesma, relacionamentos amorosos e familiares”, continua a profissional.
“O peso do cuidar reverbera em todos os âmbitos da vida”, pontua Bruna. “Inserida em um contexto de sobrecarga, esgotamento e excessiva cobrança, como ter energia para olhar para as finanças? Assim como problemas financeiros afetam nossa saúde mental, podendo desencadear irritabilidade, estresse, ansiedade, dor muscular e insônia, o inverso também acontece”, acrescenta.
“É humanamente impossível dar conta de todas as tarefas com total entrega. Precisamos sair desse lugar e começarmos a aplicar o ‘fiz o que pude’, respirar e seguir”, acrescenta a terapeuta.
Os homens precisam aprender a fazer o trabalho doméstico sem a supervisão de mulheres
O debate sobre a necessidade da divisão de tarefas mais justa existe, e homens que concordem com a necessidade de mudança na distribuição de responsabilidades também. A mulher precisar ensinar e conferir se tudo está saindo como deve, porém, é bastante cansativo. Não dá mais para só elas perceberem isso – especialmente em tempos onde é possível pesquisar como realizar tarefas no Google ou mesmo anotar na agenda do celular os compromissos enquanto pai e morador de uma casa.