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Guerreiras da Floresta enfrentam madeireiros

Em defesa do território, grupo de mulheres se organiza para proteger o que resta da Amazônia no Maranhão

Por Da Redação
Atualizado em 9 mar 2018, 18h50 - Publicado em 8 mar 2018, 21h44

POR THAIS LAZZERI, da Repórter Brasil

Na fronteira leste da Amazônia, um grupo de mulheres Guajajara protege a porta de entrada do último trecho de floresta contínua no estado do Maranhão. O grupo, que se apresenta como as Guerreiras da Floresta, é formado por 32 indígenas dedicadas a guardar seu território contra a destruição provocada por madeireiros, agricultores e caçadores.

Elas já ocuparam a sede da Funai e bloquearam rodovias em defesa da Terra Indígena Caru. Para fortalecer as ações de vigília dentro do território, arrecadaram fundos e conseguiram comprar drone, câmera fotográfica e aparelhos GPS, equipamentos que serão usados para denunciar as invasões aos órgãos de fiscalização. Nos protestos, elas carregam faixas e gritam palavras de ordem com bebês a tiracolo, não raro enquanto amamentam. A cena é cada vez mais comum em manifestações por todo o país, com o crescimento da participação de mulheres nas mobilizações indígenas.

O grupo é composto por mulheres da mesma etnia que Sônia Bone Guajajara, que está despontando no cenário político e pode compor a chapa com Guilherme Boulos caso ele seja confirmado como candidato do PSOL à Presidência. “As mulheres sempre estiveram muito presentes nas discussões dentro da aldeia. De um tempo para cá, decidiram que era importante assumir o protagonismo. Não significa passar na frente de ninguém, mas caminhar junto pelo movimento indígena e ter voz nas decisões políticas”, afirma Sônia, que também é coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.

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Mulheres da etnia Guajajara (Arquivo Pessoal/Reprodução)

 

As guerreiras, como se auto-intitulam, começaram a se organizar em meados de 2014, quando a sua aldeia, a Maçaranduba, já era conhecida pelos Guardiões da Floresta -grupo formado por homens Guajajara com a mesma missão. Além de somar forças, a criação do grupo permitiu que as mulheres passassem a habitar os espaços onde as decisões da aldeia eram tomadas. “Hoje somos reconhecidas pelo nosso trabalho e servimos de exemplo dentro e fora do estado. Essa é a nossa maior vitória”, disse Marcilene Liana Guajajara, 34 anos, uma das criadoras do movimento.

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Quando começaram, eram dez – hoje são 32. Embora as Guajajara não falem em feminismo ou machismo, elas contam que o tamanho do grupo só não começou maior devido à resistência dos maridos. “Muitos não acreditavam que faríamos um bom trabalho, outros se sentiram desafiados. Mas nós nascemos com a missão de fortalecer a resistência e, juntos, proteger o futuro dos nossos filhos”, disse ela, que é mãe de cinco.

“A gente nunca entrou em conflito”, diz Cristiane Caragiu Viana Guajajara, 30 anos, uma das guerreiras. Mesmo quando encontraram caminhoneiros que transportavam madeira ilegal retirada da terra indígena Caru, ela diz, optaram pelo diálogo. Depois, em outra ação, também usaram o diálogo para conscientizar comunidades que vivem no entorno da terra indígena. Na ausência de políticas públicas, ela diz, essas pessoas, por necessidade, entravam nas terras para caçar, cortar árvores e fazer roçados. “Mostramos que todos nós temos direitos, e precisamos exigir dos governantes que eles sejam cumpridos. Hoje, 70% do nosso território está protegido”, ela diz.

  “O movimento das mulheres aconteceu no tempo delas e, sempre, de forma respeitosa na comunidade”, afirma a socióloga Graciela Rodriguez, do Instituto Equit (Gênero, Economia e Cidadania Global), que acompanha há quase 20 anos mulheres de diversas comunidades indígenas e tradicionais, inclusive as Guajajara. Para ela, a mobilização feminina foi incitada pela pressão vivida por toda a comunidade em razão dos impactos vividos cotidianamente devido a degradação da floresta.

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O que resta da Amazônia maranhense

(Reprodução/Reprodução)

Basta observar, no mapa, as fronteiras entre floresta e desmatamento para identificar onde está o território das guerreiras. Assim como as outras terras indígenas do Maranhão. Segundo dados compilados pela Global Forest Watch, a Terra Indígena Caru perdeu mais de 5 mil hectares de cobertura de árvores entre 2006 e 2016, ou 3% do total de território. Ainda assim, segundo o Ibama, é uma das áreas mais protegidas da região.

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Uma publicação da revista científica internacional “Land Use Policy” mostrou que 75% do território maranhense foi desmatado, a maior por ações ilegais. Só existe floresta no chamado “complexo verde”, formado pelas terras indígenas Caru, Awá, Alto Rio Guamá e Alto Turiaçu e Reserva Biológica do Gurupi. “Não é uma coincidência, nós mantemos a floresta viva”, afirmou Cristiane.

Os incêndios, que ocorrem como consequência da degradação da floresta, também são uma ameaça. Em 2017, o Maranhão teve o pior índice de queimadas em seis anos, com 18 mil focos  -as terras indígenas também foram atingidas.

O Ibama aplicou R$ 800 mil em multas por desmatamento, expansão agropecuária e, especialmente, transporte e comercialização de madeira serrada dentro da Terra Indígena Caru. “Historicamente a região é explorada por madeireiros que ficam no entorno”, disse Roberto Cabral Borges, coordenador de operação de fiscalização do Ibama.

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O grupo de fiscalização do Ibama identificou serrarias ao redor dos Guajajara que retiravam madeira da terra indígena e da reserva que fica ao lado. Segundo Borges, era evidente que as toras vinham desse território, já que não haveria outra fonte de madeira próxima na região.

A ação contra os madeireiros na região já ganhou contornos de guerra. Com punições leves, segundo Borges, a única maneira de combater o crime é queimando tratores, toras e máquinas apreendidas, o que gera algum prejuízo financeiro. Em 2009, período em que os fiscais estavam impedidos de queimar os equipamentos e eram obrigados a transportar o caminhão com as toras ilegais, seis fiscais foram alvo de tiros em uma emboscada próxima à Terra Indígena Caru. “Virou uma guerra. A estratégia hoje é desativar mais equipamentos do que a capacidade que os criminosos têm de repor, a ponto de tornar inviável a exploração ilegal.”

Guerreiras e guardiões, como os fiscais do Ibama, também já enfrentaram os madeireiros. E o custo para os indígenas também é alto. “Combater o comércio ilegal de madeira é mexer na economia de pessoas poderosas”, disse José Gilderlan Rodrigues, coordenador do Conselho Indigenista Missionário do Maranhão. “Na cidade de Buriticupu, por exemplo, há um movimento forte contra toda e qualquer fiscalização.  Muitas das lideranças indígenas estão ameaçadas”, disse Rodrigues.

Questionadas sobre os perigos de enfrentar criminosos, as mulheres Guajajara falam sobre um outro risco que, para elas, parece justificar a ação do grupo. “O território sempre vem em primeiro lugar. Sem ele, não somos nada.”

(Colaborou João César Diaz)

Leia também: Como ajudar as vítimas da Síria

 

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