Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Super Black Friday: Assine a partir de 5,99

Mulheres à frente da OAB priorizam projetos de igualdade de gênero

Em um cenário inédito nos 90 anos da entidade, seccionais de São Paulo, Bahia, Santa Catarina, Mato Grosso e Paraná têm presidências femininas

Por Joana Oliveira
18 fev 2022, 08h17
Ilustração
 (Kupritz/Getty Images)
Continua após publicidade

“Não se pode sustentar que o casamento e a maternidade constituam a única aspiração da mulher ou que só os cuidados domésticos devem absorver-lhe toda atividade”. Foi com essas palavras que o Instituto dos Advogados do Brasil (IOAB) acatou, em 1899, a entrada de Myrthes Gomes de Campos (Macaé, 1895 – Rio de Janeiro, 1965) na instituição. Mais de um século depois, continuam a abrir-se os caminhos iniciados pela primeira advogada do país: em uma coincidência histórica, as seccionais da OAB em São Paulo, Bahia, Mato Grosso, Paraná e Santa Catarina serão presididas por mulheres.

Patricia Vanzolini, presidente da OAB-SP.
Patricia Vanzolini, presidente da OAB-SP. (OAB-SP/Divulgação)

“A OAB deve ser farol da sociedade, dar exemplo”, diz a professora e advogada Patricia Vanzolini, que comandará a OAB-SP (e será a primeira mulher a fazê-lo) até 2024. Durante as nove décadas de existência da Ordem, apenas dez mulheres ocuparam as cúpulas da instituição. No triênio de 2018 a 2021, nenhuma delas fez parte das equipes eleitas, o que levou a uma intensa mobilização da advocacia feminina e negra para a aprovação das regras de paridade de gênero e cotas raciais de 30%. “Que estados como São Paulo tenham eleito a primeira mulher à frente da OAB é muito significativo, mas ainda é pouco. Não devemos atuar apenas para que os direitos dos homens brancos, heterossexuais e cisgêneros sejam garantidos, porque isso não é democracia”, completa Patricia.

No Paraná, Marilena Winter não é apenas a primeira a ocupar o cargo, mas também a primeira a ousar candidatar-se a ele, enfrentando o conservadorismo de colegas de todos os gêneros. Ela já havia sido vice-presidente no Estado, mas confessa que tem sido difícil desmistificar o papel de uma mulher em um posto de liderança. “Acredito que as pessoas precisam se acostumar com minha figura à frente da instituição para naturalizar isso. A presença de mulheres em lugares tão arraigadamente masculinos traz a esperança de mudanças e aberturas de novas possibilidades”, afirma.

Marilena Winter, presidente da OAB-PR.
Marilena Winter, presidente da OAB-PR. (OAB-PR/Divulgação)
Continua após a publicidade

Entre os jovens profissionais da advocacia –aqueles que têm até cinco anos de inscrição na Ordem–, 64% são mulheres, de acordo com dados da própria OAB. Elas também são maioria nos escritórios de advocacia, mas apenas 30% chegam a ser sócias. “Além disso, é grande o número de mulheres que abandonam a advocacia durante a gestação e após a maternidade”, comenta Gisela Cardoso, eleita como presidente da OAB-MT, a segunda a ocupar o cargo (Maria Helena Póvoas, atual presidente do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, o fez entre 1993 e 1997).

Gisela Cardoso, presidente da OAB-MT.
Gisela Cardoso, presidente da OAB-MT. (Uyara Wuerges/Divulgação)

De fato, na encruzilhada entre carreira e relação familiar que tão comumente se apresenta para as mulheres, os números do setor refletem a realidade do mercado de trabalho brasileiro em geral: 30% delas abandonam a profissão durante a gestação ou após a maternidade (entre os homens, isso ocorre com 7%), de acordo com estudo da Catho. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), quase metade das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do mercado de trabalho após 24 meses, um padrão que se perpetua inclusive 47 meses após a licença.

Continua após a publicidade
Cláudia Prudêncio, presidente da OAB-SC.
Cláudia Prudêncio, presidente da OAB-SC. (OAB-SC/Divulgação)

Fomentar a participação delas em espaços de poder é uma das prioridades das cinco novas presidentes. “Em Santa Catarina, somos aproximadamente 50% dos quadros de advocacia, então seria natural que advogadas tivessem mais oportunidades de destaque. Isso seria obter equidade de gênero na prática”, diz Claudia Prudêncio, eleita na OAB-SC. Para Daniela Borges, à frente da OAB-BA, as novas lideranças femininas têm a oportunidade de envolver ainda mais a instituição, que já contribui com a rede de proteção de vítimas, muitas vezes ocupando cadeiras em órgãos que atendem essas cidadãs, no combate à violência doméstica e de gênero. Uma de suas propostas (que ela sonha que um dia seja lei) é que qualquer bacharel do Direito que pratique violência contra uma mulher tenha sua carteira da Ordem cassada ou sua inscrição negada.

“Outra coisa importante é o combate à violência institucional: evitar que mulheres sejam revitimizadas ao fazer uma denúncia. Todas acompanhamos o caso Mariana Ferrer e ninguém pode ser tratada daquele jeito em um processo, independente da sentença judicial”, diz ela, referindo-se à modelo que acusou o empresário André de Camargo Aranha de tê-la drogado e estuprado em 2018. Ele foi absolvido, mas o processo gerou indignação social e na comunidade jurídica, porque a defesa do réu usou fotos sensuais da jovem para questionar a acusação e o promotor responsável pelo caso alegou que o empresário não tinha como saber que Mariana não estava em condições de consentir ao ato sexual, não existindo, então, a intenção de estuprar. “Para além de defender e aprimorar o exercício da advocacia, nossa obrigação também é denunciar esses absurdos jurídicos e evitar que se repitam”, diz Daniela.

Continua após a publicidade
Daniela Borges, presidente da OAB-BA.
Daniela Borges, presidente da OAB-BA. (Angelino de Jesus/Divulgação)

Machismo e democracia

As cinco mulheres à frente da OAB assumem a presidência da entidade em um ano especialmente desafiador, com eleições tão ou mais polarizadas que as de 2018. Questionada sobre como a Ordem, uma instituição apartidária, pode ser mediadora entre os poderes públicos e a sociedade nessas circunstâncias, Patricia Vanzolini faz, primeiro, uma denúncia: “O machismo estrutural é muito difícil de ser visto. Prova disso é o retrocesso que vemos no cenário político, em que faltam candidatas e, até o momento, não existem pautas sobre mulheres no debate eleitoral”.

Tanto ela quanto as demais entrevistadas concordam que o papel fundamental da OAB é a defesa do Estado Democrático de Direito no País. “Democracia e direitos humanos não são temas de direita ou esquerda, são pautas civilizatórias. O Direito invadiu nosso cotidiano e é trabalho da instituição explicar o que pode e o que não pode, quais são os limites da liberdade de expressão, por exemplo, e até os modelos jurídicos do Supremo Tribunal Federal (STF), principalmente quando virou moda falar das ‘quatro linhas da Constituição’”, diz Patricia.

Ela e suas colegas ressaltam que, a partir do momento em que homens e mulheres decidem juntos, tudo é mais democrático. “Mas é importante ter mulheres decidindo por elas”, pondera Gisela Cardoso, que considera que a OAB dá um “recado de igualdade para a sociedade” e incentiva outras como elas, que muitas vezes se sentem tímidas ou desencorajadas a sequer se candidatar a cargos de liderança, a dar esse passo. Uma revolução que, esperamos, não pare por aqui.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

SUPER BLACK FRIDAY

Digital Completo

Moda, beleza, autoconhecimento, mais de 11 mil receitas testadas e aprovadas, previsões diárias, semanais e mensais de astrologia!
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 3,99/mês
SUPER BLACK FRIDAY

Revista em Casa + Digital Completo

Receba Claudia impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
De: R$ 26,90/mês
A partir de R$ 9,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$47,88, equivalente a R$3,99/mês.