O câncer de mama sempre fez parte da rotina de Mariana Fernandes — mas não da maneira que você talvez imagina. Formada em fisioterapia, já na faculdade seu Trabalho de Conclusão de Curso havia sido dedicado à doença. Depois da graduação, ela se especializou em Saúde da Mulher e Câncer de Mama, e passou a trabalhar com pacientes diagnosticadas.
Em dezembro de 2019, aos 35 anos, porém, sua relação com a doença mudaria drasticamente: ela mesma recebeu o diagnóstico. “Uma semana antes de descobrir o meu nódulo, eu sentei na ponta da cama e falei para o meu marido: ‘Se eu morresse hoje, eu morreria muito feliz, todos os meus desejos foram realizados’”, conta.
A vida, porém, tem seus caminhos tortos. Uma semana depois, ela botou a declaração para teste.
A santista estava de férias em um resort quando notou um nódulo na mama. “Eu sempre fiz o autoconhecimento das mamas — o chamado autoexame — e senti um nódulo bem próximo ao mamilo. Eu sabia exatamente que estava com câncer, esse era meu mundo.”
Após a viagem, Mariana realizou uma mamografia e uma ultrassonografia. Curiosa, a fisioterapeuta passou a sessão fazendo perguntas e, durante o segundo exame, o médico ficou em silêncio. “No momento em que eu precisava de um acolhimento, ele não falou nada. Isso me fez defender ainda mais o tratamento humanizado. Somos mais do que pacientes”, diz.
Ao fim do exame, porém, ele revelou que teriam de realizar uma biópsia, uma vez que o laudo veio com um “BI-RADS 4” na tabela que classifica os tumores em cinco grupos de risco.
Sobrevivendo ao diagnóstico
“Era uma quinta-feira linda na cidade, mas eu senti naquele momento que a Mari morreu. Parei na praia e desabei, só conseguia pensar na minha família”, relata a mãe de duas.
Na mesma semana, correu para São Paulo a fim de realizar a biópsia, na qual confirmou o que já sabia: “Foi um trauma. O câncer não escolhe idade, raça ou classe social, mas eu era saudável. Não se encaixava. Foi a semana mais difícil da minha vida. Só sabia abraçar minha família”. Em janeiro de 2020, realizou a mastectomia das duas mamas, seguida apenas da hormonioterapia, indicada para seu tumor encontrado em fases iniciais.
Em agosto de 2021, quando parecia que o câncer tinha ficado para trás, a fisioterapeuta encontrou um novo tumor: “Eu estava prestes a fazer a reconstrução do mamilo. Dias antes da cirurgia, fiz o autoconhecimento das mamas de novo e, mesmo com a prótese de silicone, achei um nódulo pequeno”.
Repetindo a história
Mari não queria acreditar que um raio pudesse cair duas vezes no mesmo lugar. Quando foi fazer a ultrassonografia, tomou mais um susto, dos grandes. Foram encontrados seis nódulos de uma só vez nas mamas, sendo três deles invasivos.
Após o diagnóstico, a fisioterapeuta realizou uma segunda cirurgia, seguida de seis ciclos de quimioterapia a cada 21 dias, além de dezesseis sessões de radioterapia e uma segunda leva de hormonioterapia.
“A quimioterapia foi quando eu mais senti medo, ela mudou tudo. Para mim, perder o cabelo não foi uma bobeira, não foi uma escolha, eu não queria passar por isso”, relembra.
Após 14 dias de tratamento, ela convidou as filhas, os pais e o marido para a ajudarem a raspar as madeixas longas e loiras: “Eu só lembro de cair na risada”. Até hoje Mariana se autointitula ‘carecona’, cheia de bom humor.
“O segundo diagnóstico me fez acreditar que a finitude realmente estava próxima, e tive a certeza de que precisava dar um propósito para essa história”, relembra, emocionada.
Uma oportunidade para viver
Foi então que, em 2022, Mari abriu a comunidade ‘Anjo Rosa’, um fórum no qual pessoas com o diagnóstico e sua rede de apoio podem contar suas histórias e receber acolhimento mútuo.
Até hoje destaca a importância de suas ‘oncofriends’ durante o tratamento . Ela também segue dando continuidade ao seu canal no Youtube, criado em 2019, no qual mostrou a jornada do segundo diagnóstico.
“Hoje, eu percebo que eu encontrei um propósito. Consigo perceber cada milagre da vida”, aponta, realizada, aos 40 anos. De acordo com a ciência, ela está em processo de remissão. Espiritualmente, porém, ela se sente curada, vivendo intensamente: “Vou viver muito ainda, e vou inspirar muito”. Já está, Mari.