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Maria Bopp: a melhor notícia de Gotham City

Em ensaio no Farol Santander e no Bar do Cofre, ela entrega como seria o visual da personagem misteriosa e o que está por trás das aparências

Por TEXTO Helena Galante FOTOS Julia Rodrigues MAKE Magô Tonhon CABELO Ágata Ignácio STYLING Daniela Mônaco CONCEPÇÃO VISUAL Eduardo Pignata
Atualizado em 13 Maio 2022, 15h21 - Publicado em 13 Maio 2022, 07h51
Maria Bopp dá voz à jornalista Vicki Vale na nova audiosérie Batman Despertar, produção original do Spotify com a Warner Bros. e a DC
Maria Bopp dá voz à jornalista Vicki Vale na nova audiosérie Batman Despertar, produção original do Spotify com a Warner Bros. e a DC (Julia Rodrigues/CLAUDIA)
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Com o bloquinho de jornalista em mãos, fala impostada e semblante sério, ela solta a frase inescapável para tempos difíceis: “Estamos aqui em Gotham City e, hoje, as notícias são perturbadoras”. Personagem do universo de Batman, Vicki Vale foi vivida no cinema em 1989 por Kim Basinger. Na interpretação de Maria Bopp, porém, tudo será diferente, a começar do formato da produção. Ela estrela em Batman Despertar, lançamento do Spotify junto da Warner Bros. e da DC. Trata-se de uma audiosérie global com roteiro original dos Estados Unidos e oito adaptações simultâneas para o Brasil, a França, a Alemanha, a Índia, a Indonésia, a Itália, o Japão e o México. Cada país terá seu elenco próprio para garantir a excelência na matéria-prima disponível para a construção de um podcast de ficção, a voz.

Na trama, Bruce Wayne (papel de Rocco Pitanga) é um patologista forense que parece não ter nenhuma memória da vida de super-herói. Enquanto realiza uma autópsia na mais recente vítima do serial killer chamado de O Ceifador (Hugo Bonemer), ele próprio é atacado. Já que Gotham não pode contar com o Cavaleiro das Trevas, Barbara Gordon (Tainá Müller) acaba pedindo ajuda ao segundo melhor detetive da cidade, O Charada (Augusto Madeira). É dentro dessa atmosfera sombria e cheia de nuances psicológicas que os diretores Marina Santana e Daniel Rezende criaram um tom realista como se fosse o de um filme, mas para ser acompanhado de olhos fechados. “O Daniel é um dos melhores diretores com quem já trabalhei na vida. A Marina tem uma questão de ser dubladora há muito tempo, então dá indicações específicas que são muito valiosas”, conta Maria.

Antes de estar à frente das câmeras em papéis de grande repercussão, como Bruna Surfistinha na série brasileira Me Chama de Bruna, a atriz e também roteirista trabalhou nos bastidores como continuista. Seu olhar detalhista para as histórias foi crucial na construção do visual misterioso de Vicki Vale no dia do ensaio de CLAUDIA. No centro de São Paulo, o Farol Santander, seus móveis entalhados e relíquias como as gavetas metálicas do Bar do Cofre, administrado pelo premiado SubAstor no subsolo do prédio, foram o cenário perfeito para Maria experimentar novas expressões para sua Vicki. Seja escrevendo uma cartinha para o Batman enquanto aguarda seu drinque (no detalhe da página ao lado) ou gritando ao telefone com Bruce Wayne (na página 23), a atriz gosta de fotografar entregue à personagem.

Maria Bopp
Maria Bopp interpreta Vicki em audiosérie sobre Batman. (Julia Rodrigues/CLAUDIA)

“Foi durante as gravações que percebi o quanto eu preciso do meu rosto para contar uma história. Mexo minha sobrancelha, tenho olho grande e expressões faciais que são parte fundamental da atuação. A câmera tem uma super lente que aproxima e mostra a sutileza de um olhar, de um sorriso que desmancha”, afirma. “No podcast, você não tem esse subterfúgio. Teve uma cena específica que conto uma notícia, com aquela voz de repórter, e cito algo que me abala. Eu fico chocada com o que estou contando e é difícil dar essa desmanchada só com a voz. Precisei ir atrás da técnica para tentar dar aquela embargada.”

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No mercado de áudio, é comum as cenas serem captadas separadamente pelos atores e unidas na edição. Em Batmam Despertar, porém, os diretores optaram por reunir o elenco para a gravação conjunta na maioria das cenas. “Já peguei sets gigantescos em que não têm espaço para o erro, você precisa chegar com uma coisa elaborada na sua cabeça. Nas diárias do podcast, teve menos pressa e mais tempo da descoberta. Aprendi como atuar através da voz”, comemora. A relação com a moda, seja com o figurino de uma personagem ou com a sua expressão pessoal, é outro despertar recente. “Me considero muito básica, sem consciência do meu próprio estilo. Agora que estou adquirindo esse interesse”, diz. Ainda que se considere “desajeitada” para o assunto, não tem dificuldade de expressar suas preferências. “Eu sou zero uma pessoa mosca morta. Se me colocam numa roupa que me sinto desconfortável para uma cena, me imponho, não fico quieta, não. Mas eu também tenho espírito de equipe, de coletivo. Eu não sei tudo e tem pessoas que sabem muito mais do que eu. Não colocar o ego na frente é sempre um exercício.”

Na internet, seu grande treino diário é a Blogueirinha do Fim do Mundo, personagem que usa da ironia para criticar disparates políticos e incongruências sociais. “Tem gente que diz com muita certeza: eu não me importo com a opinião dos outros. Eu não, me abalo com críticas destrutivas. Mas tem horas que a gente tem que fazer o que acredita, independente do escrutínio alheio.” A convicção para criticar a gestão da saúde durante a pandemia ou o descaso com o meio ambiente, por exemplo, rendem muitas críticas dos apoiadores do governo. Essas, porém, não incomodam mais tanto. “Estou com a casca grossa em relação a bolsonarista. Tem um tipo de comentário fácil de identificar: são misóginos. Venho sofrendo esses ataques desde a Bruna. Na verdade, desde sempre, porque, antes de fazer a Bruna, eu sou mulher” , comenta. “Mas também recebo críticas do campo progressista. Sinto que a gente cai em armadilhas de ficar se atacando.”

“Tem sets que não têm espaço para o erro. Nas diárias do Batman Despertar, teve menos pressa e mais tempo para a descoberta. Aprendi a atuar através só da voz, nunca tinha feito isso antes”. (Julia Rodrigues/CLAUDIA)
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Não só os ataques demandam cuidado – os elogios também podem ser danosos. “Estar na internet também é ficar recebendo comentários do tipo ‘linda, maravilhosa, alguém traz um Oscar para essa mulher’. Tento não acreditar nos comentários dos haters e nem dos fãs, senão a gente tende a ficar convencido” , pondera Maria. Entre tempestades de amor e ódio do público, a personagem da Blogueirinha está com os dias contados – pelo menos essa é a esperança da atriz. “Quando digo que eu quero que a Blogueirinha deixe de existir com as eleições deste ano estou dizendo que eu não quero a reeleição do fim do mundo. A Blogueirinha é a canalização da minha voz, da minha raiva. Quero ter alento.”

Casaco, R$ 864, e calça, R$ 724, ambos Complê; blusa, R$ 299, Maria Filó. Brincos, R$ 289, Palucci
Casaco, R$ 864, e calça, R$ 724, ambos Complê; blusa, R$ 299, Maria Filó. Brincos, R$ 289, Palucci (Julia Rodrigues/CLAUDIA)

A mistura da sensibilidade com a força, para Maria, é uma das heranças da sua mãe, a escritora e professora Bettina Bopp: “Ela é poesia e rock’n’roll, me identifico e aprendo com ela”. Recentemente, Bettina lançou o livro Pra Quando Você Acordar: Crônicas de Saudade e Espera (Editora Planeta), um compilado de textos delicados e profundos, escritos ao longo dos quinze anos em que seu irmão, Itamar, esteve em coma antes de falecer, em 2020. Sobre a experiência que transformou toda a sua trajetória, Maria escreveu: “O coma é cruel. É uma perda diária. Um luto que não é bem um luto, de uma morte que não é bem uma morte, pois há uma vida que certamente não é uma vida. Suspensão, incerteza e uma impotência esmagadora”. A grandeza de Bettina ao passar pela alquimia de ressignificar algo tão dolorido não foi despercebida pela filha. “Sou apaixonada pela maneira como a minha mãe enxerga o mundo. Admiro, sobretudo, o quanto ela conseguiu transformar sua maior tribulação em poesia. Porque ver beleza no que é simples é fácil, difícil é achar naquilo que é complexo e impenetrável”, continua a atriz e também escritora.

“Tem gente que diz com certeza: ‘Não me importo com a opinião dos outros’. Eu me abalo com críticas destrutivas. Mas tem horas que a gente tem que fazer o que acredita, independente do escrutínio alheio”

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No seu processo de transformação, Maria vislumbra uma mudança que vai além dos personagens e aparências. “O feminismo dos anos 60 começou muito do entendimento que o privado era público, que as experiências particulares do casamento dentro de casa, por exemplo, eram comuns a todos.” Ainda falta muito, porém, para que o egoísmo pare de nos deixar míopes para as dificuldades compartilhadas. “Toda vez que vejo um debate surgir na internet e logo vir o argumento neoliberal ‘deixa as pessoas’, vejo que falta entender que os impactos das ações vão além do umbigo”, diz, firme.

Se o ambiente virtual não tem sido o melhor para proposições, onde se dará a construção do futuro que queremos? “Já pensei muito nisso, não tem nada que substitua o olho no olho. A internet é aquele meme dos cachorros latindo com o portão fechado – quando ele abre, eles param. Ao mesmo tempo, não sei que debate que participei que não foi na internet nem no ambiente acadêmico. Amo estar nas ruas, mas também não há tanto espaço para o diálogo, é no grito.” Na ausência de super-herói com super-respostas, cabe a nós sonhar (e noticiar, claro) as possibilidades de encontros e resoluções que conseguirmos criar juntos.

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