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Argumentos em defesa de ex-BBB Felipe Prior confundem conceito de estupro

Ex-participante do reality é investigado pela polícia e nega violência sexual; por que laudo médico não é a única prova possível para esse tipo de crime

Por Letícia Paiva Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Isabella Marinelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 14 abr 2020, 09h46 - Publicado em 12 abr 2020, 18h08

Explosivo e autointitulado sincero, Felipe Prior, 27 anos, ex-participante desta edição do Big Brother Brasil (BBB), foi alvo de denúncias por dois estupros e uma tentativa, ocorridos entre os anos de 2014 e 2018 no contexto dos jogos universitários Interfau e revelados por reportagem da revista Marie Claire. As acusações vieram à tona logo após sua eliminação do reality show, no dia 31 de março. As suspeitas estão sendo investigadas sob sigilo pela Polícia Civil de São Paulo, que já ouviu as vítimas.

Entretanto, antes de os resultados do inquérito policial sairem e em despeito dos relatos expostos pela reportagem, muita gente que não compõe a equipe de advogados do ex-BBB saiu em defesa dele nas últimas semanas. Entre os argumentos que provariam sua inocência estão supostas “inconsistências” no laudo médico apresentado por uma das vítimas para reforçar sua denúncia, além de uma ata da equipe organizadora dos jogos que indicaria “contradição” nos relatos das mulheres. Ambas as hipóteses foram amplamente comentadas nas redes sociais.

Em um vídeo publicado no dia 4 de abril no canal de YouTube Em Off, do jornalista Erlan Bastos, é afirmado que a laceração sofrida por uma das mulheres poderia acontecer em relações consensuais, de acordo com o ginecologista Jailson Costa. O site da revista IstoÉ Gente repercutiu o vídeo com o título “Caso Prior: médico aponta inconsistência em laudo de suposta vítima de estupro”.

No relato publicado pela revista Marie Claire, a estudante diz que o sangramento devido ao ferimento decorrente do estupro foi tamanho que manchou suas roupas e o banco do carro. Ela foi levada pela mãe ao hospital, onde foi constatado que houve uma laceração “de cerca de três dedos de comprimento na região genital” da jovem.

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Laceração é o termo médico para um corte, ou múltiplos cortes, na vagina. “Geralmente, ela acontece em relações violentas. Diversas lacerações são indícios de uma relação forçada, mas um único corte já demonstra que foi usada mais violência”, afirma a ginecologista Carolina Ambrogini, coordenadora do Projeto Afrodite, que orienta mulheres sobre saúde sexual na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 

Entretanto, a ginecologista explica que é possível que um estupro não deixe nenhuma marca ou corte. “Ás vezes, é preciso usar uma lente de aumento para analisar microfissuras na entrada do canal vaginal. Ao mesmo tempo, o fato de não haver lesão não deixaria claro que a relação foi consensual”, diz Ambrogini.

Desse modo, não é possível afirmar que o fato de uma laceração não significar necessariamente um estupro represente uma inconsistência na denúncia. Assim como se não houvesse qualquer lesão um estupro poderia ter, ainda assim, ocorrido.

O Código Penal define, no artigo 213, o crime de estupro como “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”; a pena pode chegar a dez anos de reclusão.

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Não é necessário, portanto, que exista lesão para que uma relação sexual forçada seja caracterizada como estupro pela Justiça. Inclusive, exames médicos são capazes de observar lesões físicas após a violência sexual por menos de uma semana, enquanto o crime de estupro contra maiores de idade tem prazo de prescrição de 16 anos.

“O exame de corpo de delito não é determinante para os casos de estupro. Aliás, na maioria dos casos em que ocorre estupro o laudo é negativo, pois os vestígios desaparecem rapidamente. Se não há violência física e a mulher já havia mantido relações sexuais em data anterior, raramente o laudo é positivo”, afirma Valeria Scarance, coordenadora do núcleo de gênero do Ministério Público de São Paulo.

Outras provas, como roupas, relatos de testemunhas que conversaram com a vítima após o fato e avaliação psicológica são levadas em consideração para a conclusão das investigações e potencial condenação. “Nenhuma prova é absoluta, mas nossos tribunais têm reiteradamente decidido que, em crimes sem testemunhas, como os crimes contra a liberdade sexual, a palavra da vítima prevalece em relação à negativa do réu”, diz Scarance. Havendo dúvida sobre a prática do crime, o réu é absolvido.

Ata do Interfau

Em outro vídeo do canal Em Off, publicado na sexta-feira (10) e noticiado pelo site da IstoÉ Gente com o título “Caso Prior: ata da Interfau contradiz versão de estupro”, é revelada uma ata de reunião da comissão organizadora do Interfau (os jogos universitários de faculdades de arquitetura de São Paulo) afirmando que não estava claro para Prior o porquê de ele ter sido “considerado assediador”. A ata é de uma reunião do ano passado.

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A comissão havia decidido em reunião realizada no dia 21 de outubro de 2018 pela expulsão permanente de Prior de todas as futuras edições dos jogos. Após a publicação de reportagem com as denúncias, uma nota foi divulgada no perfil da comissão no Facebook com a justificativa para a punição: “Devido ao recebimento de mais de uma denúncia acusando-o de assédio, além de uma acusação de crime sexual durante o Interfau de 2018”.

Na reunião mais recente, que teve o conteúdo divulgado, os organizadores discutiram se deveriam comunicar o banido dos motivos da expulsão e também não especificam os crimes, dizendo apenas que ele era “considerado” assediador.

O fato é que a comissão recebera denúncias de crimes envolvendo Prior – embora menos grave sob o ponto de vista penal, assédio se enquadra no crime de importunação sexual com pena de um a cinco anos de prisão. Evidentemente, ainda que a comissão não soubesse de quaisquer crimes não quer dizer que eles não aconteceram. A investigação é feita pela Polícia Civil e, posteriormente, pelo Ministério Público.

Além disso, ainda que pese o fato de que, de acordo com o documento, Prior não teria sido comunicado sobre as suspeitas que pairavam sobre ele, caso exista denúncia formal de crimes pela polícia e MP, ele terá o direito à defesa na Justiça.

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O caso

Denúncias contra Prior nos jogos universitários de arquitetura e urbanismo, o Interfau, começaram a circular nas redes sociais em janeiro, quando o programa já estava no ar. Ao final de março, uma foto de uma declaração da organização do InterFau foi postada no Twitter. No texto, a entidade confirma a expulsão do arquiteto do evento – ele teria sido banido dos jogos futuros também.

Nenhuma denúncia havia sido formalizada contra Felipe Prior até sua entrada no BBB, quando a advogada criminalista Maira Pinheiro teve contato com a primeira vítima. Deu-se então início uma investigação abrangente através da qual foi possível localizar as outras duas jovens e testemunhas dos ocorridos.

Uma possível quarta vítima teria preferido não depor. Em entrevista a Marie Claire, a advogada explicou que a relutância em denunciar se dá ao “tratamento revitimizador que muitas dessas mulheres recebem”, além da cultura do estupro, que tende a normalizar a violência sexual. “Todas as vítimas relataram sentimentos de culpa após os fatos. Isso é emblemático, pois revela como, diante desse tipo de caso, o senso comum tende a focar mais numa suposta ‘responsabilidade’ da vítima em não ser capaz de evitar os atos do agressor”, disse ela à revista.

A declaração de Prior

Pelo Instagram, após não ter atendido a reportagem que expôs as denúncias, o arquiteto postou um comunicado em que diz que “não tomou conhecimento do teor de acusações de crimes que jamais cometeu, e que jamais cometeria.” A publicação segue dizendo que o BBB repudia, veementemente, as levianas informações espalhadas sobre supostos fatos que teriam ocorrido há anos, mas que somente agora, depois de ter adquirido visibilidade pública, são manobrados”. Ele se colocou à disposição das autoridades para esclarecimentos.

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Ainda num vídeo postado na mesma rede, Prior se diz inocente e que “desconhece todos os fatos apresentados”. Ele afirma que nunca cometeu violência sexual contra ninguém, mas que os advogados estão tomando as previdências.

Pouco tempo antes, segundo coluna de Patrícia Kogut, o Ministério Público de São Paulo havia pedido a abertura do inquérito policial para apurar as denúncias. O caso vai correr em sigilo.

No Big Brother

Felipe Prior teve sua participação no reality show da Globo marcada por polêmicas que dividiram a opinião do público. Foram as várias as vezes em que ele esteve envolvido em discussões com outros participantes, especialmente com as mulheres.

Prior foi um dos protagonistas de um dos momentos mais controversos da edição, quando alguns dos integrantes decidiram montar uma estratégia para prejudicar as garotas, tentando induzi-las a trair seus parceiros e sujar suas reputações com o público.

Em outra ocasião, enquanto discutia com Flayslane, que reclamou do tom que ele usava, Prior chegou a dizer que gritava até com a própria mãe, então que gritaria também com ela. “Grita com a sua mãe, o desrespeito quem aceita é ela, eu não aceito desrespeito. Seu macho escroto”, rebateu Flay. Outras participantes também reclamavam constantemente de sua postura e, nas redes sociais, eram frequentes as hashtags que apontavam o machismo nas atitudes do arquiteto.

Durante o Jornal Nacional no dia da divulgação das denúncias, a Globo afirmou em nota que “é veementemente contra qualquer tipo de violência, como se percebe diariamente em seus programas jornalísticos e mesmo nas obras do entretenimento, e entende que cabe às autoridades a apuração rigorosa de denúncias como estas”.

 

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