Com Choripolvo, Notorious Fish prova que há sempre espaço para inovar
Ainda no delivery, restaurante de Pinheiros ganhou o coração dos paulistanos com hits como lanche de polvo e Shrimp Roll
Minha primeira visita ao Notorious Fish foi marcada por um sentimento de inquietude. Precisava descobrir quem era a mente criativa por trás daquilo tudo. Desde o salão de cores vibrantes ao cardápio irreverente, todos os elementos geram curiosidade. Ao conhecer Alan Finguerman, chef responsável pelo menu do restaurante, as coisas fizeram sentido.
Com apenas 27 anos, o empresário já está há quatro à frente da marca, que toca junto aos sócios Rodrigo Sanovicz e Pedro Barreto. De personalidade intensa, é possível enxergar que é na gastronomia que Alan canaliza seu excesso de energia.
Em 2020, o cozinheiro se uniu aos amigos para criar a empresa, nomeada a partir de um trocadilho que faz homenagem ao lendário rapper The Notorious B.I.G. Alan, que é muito fã do músico norte-americano, juntou o útil ao agradável, já que sua vontade sempre foi criar a partir dos peixes, crustáceos e moluscos.
“Nunca me interessei muito por carne, frango e legumes na gastronomia. O mar tem uma coisa que me pega muito, que é o fato de o ser humano não conhecer 100% do oceano. É muita opção, e era isso que eu queria, trabalhar com vertentes que não fossem todas da mesma proteína.”
Antes, o jovem já empreendia por meio da culinária, mas em banquetes para eventos e vendendo pratos por encomenda focados em churrasco de frutos do mar. Em 2020, durante a pandemia, veio a necessidade de se adaptar ao isolamento, e foi assim que a empresa se tornou um fenômeno de popularidade no delivery — chegou a bater a marca dos 100 mil pedidos entregues em São Paulo.
“Não estava a fim de buscar outro trampo, não queria voltar para a cozinha”, conta o chef, que tem no currículo estágios pela França, incluindo no premiado Mirazur.
“Não tínhamos muita grana, então começamos no meu apartamento. Fritava na minha panela, embrulhava as coisas no papel de lanche e ligava pros amigos e falava: ‘Bro, você já almoçou? Tô passando aí pra deixar um lanche’”, relata sobre o início da empreitada. “Um amigo aqui, outro ali, o negócio foi acontecendo. Assim, alugamos uma cozinha pra poder sair da minha casa e crescer.”
“Começamos a ver outras casas fazendo o lanche num formato parecido. Como chef, foi um grande prazer ser usado como referência.”
Alan Finguerman, chef e um dos sócios do Notorious Fish
Foi nesse momento que a primeira criação do chef virou hit: o Choripolvo. Se você se deparou com o boom dos sanduíches de frutos do mar nas redes sociais, muito provavelmente um deles foi o do Notorious, um dos responsáveis pela popularização dos lanches recheados com tentáculos.
“Queria uma criação bombástica, mas que o polvo não se perdesse, já que é muito delicado. A ideia partiu então do choripán, que é um lanche simples, e o polvo grelhado ganha esse sabor de brasa”, conta sobre a criação da receita, que faz jus ao nome ao ser temperada com muito chimichurri, uma delícia.
“Começamos a ver outras casas fazendo o lanche num formato parecido. Como chef, foi um grande prazer ser usado como referência. A maior gratificação é você conseguir fazer algo relevante e que outra pessoa ache legal. Não é só esse tipo de reconhecimento que busco na minha profissão, mas acho que esse é um dos que consegui.”
Em fevereiro deste ano, o Notorious abriu as portas de seu primeiro endereço físico, em Pinheiros, São Paulo. Definido como uma casa que vai “do mar ao bar”, o espaço tem clima descontraído, drinques autorais e uma gastronomia descomplicada, mas também levada muito a sério.
UMA COZINHA ACESSÍVEL
A equipe da cozinha e do salão é formada por talentos muito jovens, e é do balcão que saem receitas pensadas por Alan e executadas no dia a dia pelo sub-chef João Paulo Doria e pelo bartender Lucas Osiel.
Uma das motivações do proprietário para se especializar nos mariscos foi a intenção de transformar esses ingredientes em pratos mais acessíveis — tanto para o paladar como para o bolso. No cardápio, as opções são divididas entre sanduíches para comer com as mãos e beliscos para compartilhar, refletindo essa vontade de descomplicar as coisas.
“Sentia que existia um buraco no mercado em São Paulo. As opções eram sempre aquele mexilhão de um restaurante de 40 anos, muito clássico, ou uma porção de lula custando 130 reais. Não existia algo um pouco mais alternativo, pensado para a galera. Vi que tinha um espaço ali pra gente vender um shrimp roll, um peixinho frito, coisas que a molecada não está muito acostumada porque só tem em lugares tradicionais a preços muito caros”, e foi assim que nasceu seu primeiro menu.
Um dos segredos do sucesso do Notorious está na escolha das matérias-primas. Os pratos são elaborados a partir do insumo de produtores escolhidos a dedo, que fornecem camarões, lagosta, polvo, lula, atum, salmão e ostras frescas.
“É um processo complexo e desafiador, porque tem sempre essa busca pelo melhor produto. Mas existem milhões de maneiras de você preservar a proteína e todas as suas qualidades na textura, no sabor e nutricionalmente”, explica o chef sobre os ingredientes do mar, a exemplo do polvo, que vem de Santa Catarina. Já a polaca selvagem do Alasca é estrela de pratos como o Fish’N’Chips — cuja versão vegetariana é feita com folhas de peixinho da horta empanadas em ovo e panko.
Apesar de flertar com a inovação, é a partir de um olhar para o passado que o chef gosta de criar — basta observar o clima vintage do restaurante, proporcionado pelos ladrilhos coloridos e uma trilha sonora regada a James Brown e Diana Ross.
Um exemplo disso é o coquetel de camarão: presença certa nas festas mais sofisticadas entre as décadas de 1960 e 1980, a entradinha saiu de cena e ganhou até status de “cafona”. A receita da casa – confira aqui o passo a passo – é feita com camarão-rosa cozido e acompanha o molho mil ilhas — também conhecido como Thousand Island — feito à base de maionese e comumente usado em saladas.
“Essa receita é uma realização. Me traz uma memória do meu pai, que gostava muito desse prato com molho rosé. Ele ia ao Ceagesp só para comprar camarão e fazer esse coquetel. É um prato que eu sempre tive na manga, e estava esperando a hora dele”, revela.
Apesar de ter os pés no chão e entender os “ups and downs”, como ele mesmo diz sobre as variações do dia a dia no negócio, Alan avalia que não poderia estar em outro lugar.
“Meu sonho sempre foi ter um restaurante. Depois que entrei nesse ramo, fui jantar na casa do meu avô e contei para uma moça que trabalha com ele há muitos anos, que me viu crescer, e ela me falou: ‘Desde criança você vinha aqui na cozinha me atazanar, você pegava as panelas e colocava na cabeça’. Eu achei isso tão bacana, porque eu fui uma criança que nunca conseguiu prestar atenção na escola, não era o melhor aluno. Acho que era o pior, talvez… Aprender não era muito a minha pegada. Mas eu era gentil, cavalheiro, gostava das manualidades. Sempre cozinhei muito em casa com amigos, fazia churrasco e gostava de ter gente ao redor do alimento…” Realmente, agora tudo faz sentido.
Créditos de produção
Texto: Marina Marques
Fotos: Bruno Geraldi
Edição de arte: Catarina Moura
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