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Iris Abravanel fala sobre sua carreira, família e a vida ao lado de Silvio Santos

Ela consegue o que quer do marido. E ele não se arrepende de ceder: a parceria é genial. A noveleira fala de crises superadas e de como a família trata temas delicados, como o testamento do dono do SBT.

Por Patrícia Zaidan Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 22 out 2016, 13h51 - Publicado em 11 dez 2013, 22h00
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  • Iris Abravanel decidiu escrever novelas por causa de conselhos dados por Walcyr Carrasco.
    Foto: Filipe Redondo

    Silvio Santos, 83 anos, encarna a mais perfeita versão do self-made man, e, sim, bancou a carreira da noveleira Iris Pássaro Abravanel, 65, sua mulher há mais de 40. Mas ela não é pouca coisa: se não desse conta do recado, teria parado no primeiro folhetim, Revelação,em 2008 – porque o marido não dá ponto sem nó nem torra dinheiro à toa. Pelo contrário, com fortuna de 1,3 bilhão de dólares e 30 empresas, o apresentador de TV entrou este ano no rol dos bilionários do mundo da revista Forbes. Iris, a dona de casa convertida em profissional só aos 60, encorpa o patrimônio, mas tem certeza de que na sua chegada ao SBT os diretores a desdenharam. “Acho que pensaram: ‘Ela trabalha dois meses, não aguenta e corre para o shopping’ “, afirma a autora de uma das maiores receitas da emissora, o remake da trama infantil Chiquititas. Em 2012,ela arrecadou 100 milhões de reais só com licenciamento de produtos ligados a Carrossel e colocou a TV na vice-liderança de audiência. Hoje dá 350 empregos a cenógrafos, costureiras e técnicos na cidade cenográfica,em São Paulo, que estava quase desativada. No belíssimo escritório no Morumbi, que divide muro com sua mansão e foi cenário da Casa dos Artistas, Iris conta como conheceu o seu amor, fala de crises conjugais, das suas quatro filhas, das duas filhas dele e da decisão difícil, entre lágrimas, sobre quem sucederá o líder do Grupo Silvio Santos quando ele não estiver mais entre os vivos. “Minha história tem tropeço, queda, superação, pecado. Escolha um tema para iniciar a entrevista”, diz a bem-humorada paulistana do Brás.

    Comece por um episódio em que você caiu e levantou.

    Por imaturidade, cometi erros na relação, me separei, sofri e hoje tenho a família unida. Olho para o meu marido e vejo que gosto de estar de mãos dadas, temos uma dependência emocional. Mas ocorreram crises. A separação (em 1992) foi uma guerra. Ele me deixou mal. Imagine, eu lutava com estilingue e ele com exército e canhões. Eu me defendia, ele contra-atacava.Silvio brigou bem. A partir daí, pensei: “O que estamos fazendo? Dividindo a família, acabando com tudo”. Quando ele voltou, eu disse: “Nunca mais a gente se separa. Acabou! Você vai me aguentar pelo resto da vida”. Não guardamos raiva, o que um fez para derrotar o outro está enterrado.

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    Isso significa não falar mais num eventual pecado dele?
    A falta de perdão é arrogância e soberba. Eu mentiria se dissesse: “Não te perdoo porque nunca faço igual”. Quantas vezes pisei na bola, o humilhei, falei coisas erradas. Até sem intenção. Perdoar é tudo. Tenho 14 empregados. Se um comete um erro grave, merece nova chance. Há anos estão em casa. No almoço, eles se reúnem, é uma festa. A gente ouve as risadas lá de cima. É isso que eu quero.

    Por que ocorreram tantas crises?
    Silvio tinha um ciúme doentio. Queria me guardar, me proteger. Mas atrapalhou. Me sufocou tanto e por tanto tempo que eu disse: “Você muda ou separamos”. Ele saiu. Mas viu que perdia, além de mim, o ambiente de aconchego que construí, a casa cheia de alegria, de crianças, de amigos das filhas. Era o lugar onde podia ser ele mesmo.

    Você não tinha ciúme das moças da TV em torno dele?O selinho, acho, foi inventado por Silvio. Tinha uma Silmara, Silmara não sei o quê… Ele dava selinhos nela. As mulheres se penduram. Depende de cultivar a autoestima, o amor-próprio. Eu cultivei. O ciúme destrói. Minha mãe acabou com o sonho do meu pai: ele fazia filmes amadores e beijava em cena. Ela não suportava, quebrou os faróis do carro dele com o salto do sapato. Não repetiria isso. Conheço o medo de perder desde o útero: a gravidez da minha mãe foi cheia de temores. Ela havia perdido o primeiro bebê num parto a fórceps, no hospital. Eu nasci em casa, com parteira. Gostava de me atirar no mar, nadar contra a correnteza, correr riscos. Isso me fez segura.

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    Como conheceu Silvio Santos?
    Foi no Saco do Major, no Guarujá. Eu tinha 19 anos, era rata de praia, estava preta e me lambuzava de mariscos crus quando Silvio desceu de uma lancha. Falei: “Caramba, que brancura!” Os amigos dele o enfiaram debaixo de uma pedra para poupá-lo do sol. Eu era professora, o Silvio estava casado (com Cidinha Abravanel, morta por um câncer em 1977). Foi estratégia dele me tirar do magistério e levar para trabalhar no Baú da Felicidade – ele tinha outras intenções. A gente foi se apaixonando. Meu pai, italiano exagerado, batia a cabeça na parede alegando desgosto. O Silvio chamou-o para conversar. Meu pai voltou dizendo: “Ele te ama, você o ama, não há o que fazer”. Só me perdoou quando nasceu minha filha mais velha.

    Como convenceu Silvio de que podia escrever novelas?
    Foi surreal. Terminava o contrato do SBT com a Televisa (empresa mexicana que produz novelas), e o Silvio, aflito, procurava autores. A maioria está na Globo. Nunca me envolvi com a TV, mas ouvia as conversas em casa. No café da tarde, que é a melhor hora do dia, perguntei: “E se eu fizesse novelas?” Na maturidade você não tem vaidade, age para ajudar. Ele gostava do que eu escrevia na coluna que mantive na revista Contigo!. Falava do cotidiano e mandava recados para Silvio. Os leitores não percebiam, eram situações fictícias. Eu dizia que o homem machista arrasa a mulher, aquele que aproveita a intuição dela vai mais longe, e outras mensagens parecidas. Até na separação, ele leu os recados. Eram duros. Então, naquele café, concordou: “Acho que você fará boas novelas”.

    O folhetim exige técnica apurada. Como aprendeu isso?
    Meu diretor na Contigo!, Walcyr Carrasco (autor de Amor à Vida, da Globo), sugeriu que fizéssemos novelas. Começamos, mas não deu certo. Com aval do Silvio, fui ao SBT falar com o diretor de dramaturgia. Ali, não me conheciam, acabei barrada pelo porteiro. Me propus a fazer uma sinopse e chamei minha amiga Rita Valente, craque em informática, para ajudar com o computador de casa, que era velho. Pedi a ela para criar uma cena, vi que tinha jeito. Rita está na equipe até hoje.

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    Por que o café da tarde é uma instituição? O que vocês comem?
    Está vendo a luz acesa da sala de almoço lá de casa? (mostrando da janela). Meu marido tomou café sem mim. Quando sabe que estou ocupada, não interrompe. Nos outros dias, me chama e espera. A gente fala das filhas, de tudo, dá biscoito para os cães. Três ficam dentro de casa. Ao todo são 14. Silvio se apegou desde o nascimento da ninhada. Eu tinha saído à noite, ele se viu em apuros, com um holofote na mão, enquanto nossa lhasa paria. Eu cheguei, ele gritou: “Vem ver, um cachorrinho acabou de nascer no meu pé”. O que comemos? Pãozinho com manteiga, café com leite. Não é chá refinado, é média, mesmo. Silvio devora doce de padaria, rocambole, bolo. É um formigão.

    Globo e Record reconhecem seu sucesso? E a crítica?
    A Globo é a Globo. Não sei como sou vista lá. A crítica colabora, mas tem a maldosa, que só derruba. Minha preocupação é dar empregos. E também com o elenco de Chiquititas. A psicóloga Rosa Naccarato apoia os atores e seus pais. A criança está no ar e é o máximo. Sai e não é mais ninguém? Com Rosa, elas separam o ator do personagem. Está dando tudo tão certo que vamos estrear Patrulha Salvadora, série com 13 capítulos.

    Como usa o dinheiro que ganha? Compra bois, terras?
    Não ganho tanto assim. Invisto na educação de pessoas que quero ver crescer. Diversifico em aplicações bancárias. Mulher tem de aprender a mexer com o dinheiro.

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    É Silvio quem escolhe os cargos das filhas no grupo?
    Elas chegaram ali como estagiárias, sem mesa ou telefone, e subiram. (As filhas dele: Cintia, 50, cuida dos shows de Carrossel e Silvia, 43, dirige o núcleo infantil. As dela: Daniela, 35, é diretora artística, Patrícia, 33, apresen­tadora, Rebeca, 30, diretora da Jequiti, que faturará 1 bilhão de reais neste ano com cosméticos, e Renata, 27, atua ao lado de Guilherme Stoliar no comando da holding.)

    Na sua casa, fala-se de um tema tabu, a morte? Do testamento e de como será a vida sem Silvio?
    Existe a preocupação. Preparei as meninas, desde cedo, para sobreviverem sem mim. Mostrei ao Silvio a necessidade disso, e ele tem visão de futuro. Não somos só nós e as filhas. A nossa morte vai envolver coisas grandes no Grupo Silvio Santos, afetar milhares de famílias dos que trabalham lá – elas precisam se ver seguras. Não gostávamos de tocar no assunto. Silvio, com habilidade, foi falando. As meninas choravam, demoraram a aceitar a realidade. Apesar da clareza das leis, seria inconsequência não deixar tudo acertado. Até a padaria tem de pensar em continuidade.

    Já se sabe quem será a chefe da família e dos negócios?
    Dos negócios, sem dúvida, a Renata. A caçula, a menorzinha, um Golias. Já está sendo preparada pelo pai, porque gosta. A luz da sala dela é a última que se apaga. Silvio percebeu que seria Renata quando fomos visitá-la na universidade, nos Estados Unidos. Para ganhar um dinheirinho,ela administrava dois andares da moradia estudantil. Levava tudo aquilo na ponta do lápis, com técnica, mão de ferro e não perdeu a amizade das colegas.

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    Vocês têm bons encontros de família?
    Às vezes ocorre, como no noivado da Silvinha, na minha casa. Neste Yom Kipur (dia do perdão para os judeus, que aconteceu após a entrevista,em setembro) reunirei também os irmãos do Silvio. Encomendei comida kasher e fricassê de frango, que ele prefere. O pai abençoa as meninas, pede que ensinem valores da família aos filhos.

    Seu marido é judeu, você e as filhas viraram evangélicas. Houve intolerância em casa?
    Silvio estranhou. As meninas estudaram hebraico, fizeram o bat mitzvah (cerimônia de maturidade) e, de repente, começaram a pregar a Bíblia. Isso o chocou, gerou conflito entre nós. Como muitas vezes eu o contestei, achou que fosse para enfrentá-lo. À medida que ele via a mudança delas para melhor, se acalmou. A gente ora com ele, como aprendemos com os evangélicos. Lemos o Velho Testamento juntos, não há contradição com o que ele acredita. Somos judaico-cristãs. A diferença é que reconhecemos Jesus como Messias. Ele está tão intrigado que tem lido livros e visto filmes sobre o Novo Testamento.

    Como vê as brincadeiras picantes que Silvio faz na TV?
    Ele adquiriu o direito de se soltar. Eu jamais o censuraria. Às vezes pega pesado, fala umas coisas feias. Dependendo do horário, deve se policiar. Sem perder a espontaneidade que o faz querido pelo público. Em casa, ele não fala palavrão. Conta umas piadinhas bobas, só ele ri.

    Como é seu relax? Qual é o seu maior defeito?
    Brinco com meu neto, Gabriel, de 1 ano e meio, e vejo séries de TV com Silvio. Faço pilates e fisioterapia. Passo três meses por ano na nossa casa em Orlando. Eu cozinho, o Silvio lava a louça e o fogão. Meu deleite é saber que as meninas são unidas. A Renata mora com a gente e as outras três são vizinhas no mesmo condomínio e se ajudam. Falo demais, esse é o defeito. Comia muito, mas resolvi: emagreci 10 quilos. Me sinto ótima para subir escada, a roupa fica bonita.

    Do que mais você se orgulha na sua trajetória?
    De começar uma profissão aos 60 anos. Estava na minha casa, cercada de conforto, saí e coloquei a cara a bater.
     

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