Isabelle Nassar, de ‘Travessia’, fala sobre desafios da maternidade e fama
A atriz, que interpretou Sara na novela, utiliza a arte como ferramenta de autocuidado
Quando Isabelle Nassar entrou em contato com Travessia, novela de Glória Perez, tudo o que ela sabia era que a sua participação aconteceria apenas no primeiro episódio. Todavia, o universo, as estrelas — e o talento inegável da artista — se alinharam, e Nassar conseguiu entrar para o elenco fixo da produção, interpretando a personagem Sara até os últimos capítulos.
Tamanha oportunidade que, segundo a atriz, foi uma “baita surpresa”, se tornou um divisor de águas em sua carreira. E em entrevista exclusiva à CLAUDIA, Isabelle revela o que mudou em sua vida desde então, quais são os maiores desafios que vêm com a exposição de estrelar uma novela em horário nobre, dificuldades da maternidade e muito mais. Confira:
CLAUDIA: Você comentou recentemente que a sua participação em Travessia foi inusitada. Me conte sobre isso.
Isabelle Nassar: Sim, a minha história com Travessia é literalmente uma travessia, pois eu não estava no elenco. Fui chamada para fazer uma participação no primeiro capítulo, e isso acabou me rendendo o papel fixo da Sara. Fiquei muito feliz pois sempre tive vontade de trabalhar com o Mauro e a Glória, e aí quando percebi que os dois estavam juntos no projeto, surgiu um grande interesse. Mas sim, foi uma baita surpresa ter essa perspectiva de ficar até o final.
CLAUDIA: Houve algum momento durante as gravações que ficou marcado para você? Especialmente sabendo que a sua contratação veio como uma surpresa.
Isabelle Nassar: Quando gravamos a descoberta da morte da Débora e a invasão na festa de Natal. Essas cenas marcaram tanto a mim quanto o restante do elenco. Mas, em geral, fico muito comovida por quaisquer temáticas que envolvam maternidade solo e mulheres.
CLAUDIA: Falando em maternidade, você foi mãe aos 23 anos de idade. Quais foram as transformações emocionais que você experimentou desde a gestação?
Isabelle Nassar: Acredito que a maternidade não seja uma transformação imediata, e sim uma construção. Diariamente nos tornamos mães. É um caminho de erros e acertos. Aliás, há muito mais erros do que acertos. E o amor por um filho segue a mesma linha – ele vai apenas aumentando. Inclusive, ser mãe envolve muitas questões. Há a solidão da maternidade, as negações, existem inúmeros atravessamentos nessa questão, pois precisamos ser produtivas em vários âmbitos, incluindo o familiar. Mas, sinceramente, a maior transformação pela qual passei, e ainda estou passando, é querer de fato que alguém seja muito mais feliz do que eu. E também há um amadurecimento, sinto que essa vivência vem me trazendo um aterramento e uma calma que eu curto demais.
CLAUDIA: O que você não sabia sobre a maternidade até se tornar mãe?
Isabelle Nassar: Que é muito difícil! É muita entrega, muita privação de sono, é doloroso. E por ser mãe muito nova, senti um certo abandono (quase inconsciente) dos amigos que tinham a mesma idade que eu. Além disso, existe aquela fantasia de que nos tornamos um peso. Há também o medo de nunca mais trabalhar, do corpo não voltar. Ninguém te fala sobre essas coisas. Mas hoje eu experimento a maternidade com muito mais facilidade. Minha filha está com 12 anos, já faz o dever sozinha, toma banho sem precisar de ajuda, é super responsável, tudo isso alivia bastante.
CLAUDIA: Com a maternidade, os seus papéis na televisão e outros projetos paralelos, sobra tempo para você cuidar de si mesma? Como você faz para cultivar esses momentos de autocuidado?
Isabelle Nassar: Acho que sou uma eterna filósofa contemporânea em busca de algo existencialista. Eu preciso do silêncio. Chega a ser um clichê, mas quando estou muito mal, escrevo um poema. Sou nostálgica, melancólica, bem das antigas mesmo, então preciso me nutrir deste processo. Inclusive, chego a aceitar trabalhos que não possuem cachê só porque gosto do projeto. Realmente vou para esse campo metafísico, me encontro nesses momentos que entro em contato com a minha artista interior. Isso é o que realmente me alimenta.
CLAUDIA: É possível nutrir este senso de ‘porto seguro’ dentro da atuação mesmo que este seja o seu trabalho? Como você realiza essa separação trabalhando com algo que ama?
Isabelle Nassar: Procuro sempre pensar exatamente no que é sucesso, fama, carreira e o que é um trabalho artístico, justamente para eu não me contaminar por certos ideais da sociedade. Para isso, eu sempre busco a minha artista. O teatro me visita em todos os momentos de minha vida. Procuro sempre estar lendo, revisitando clássicos gregos, assistindo essas obras icônicas, para lembrar de onde eu vim e quem são meus ancestrais. Assim, não me desconecto do real propósito.
CLAUDIA: Entrando no quesito ‘fama’. A exposição constante na mídia traz inúmeras possibilidades, mas também vem com o excesso de ataques. Como você lida com esse tsunami de informações diariamente?
Isabelle Nassar: Confesso que quando entrei na novela, fiquei um pouco assustada. Mas depois de um tempo, percebi que o que acontece na internet não é o que acontece nas ruas. Então, eu procuro não dar muita bola para os haters, pois o motivo dos ataques nunca é algo relacionado ao meu trabalho como atriz, e sim à minha aparência. É sempre algo externo. As novelas acabam, as pessoas esquecem da gente, outros trabalhos surgem, e se nos prendermos aos ataques e xingamentos, acabamos entrando num vazio emocional muito grande.
CLAUDIA: Como é a sua relação com a autoestima, especialmente por conta dos ataques na internet estarem quase sempre conectados à sua aparência? Já é difícil nos amarmos sem escutar críticas externas, e quando isso acontece, acredito que seja ainda mais complexo.
Isabelle Nassar: É muito ruim receber uma crítica em relação àquilo que você é, a sua aparência, porque eu acordo e durmo comigo todos os dias. Para mim, eu sou a pessoa mais comum do mundo, sou um doce de criatura. Então quando alguém diz que eu sou estranha ou feia, é como se existisse uma tentativa de invalidar o meu feminino. Observando com um olhar mais distanciado, percebo que isso diz mais sobre o momento que vivemos enquanto sociedade do que sobre mim. Claro, nunca é legal. Mas se você colocar numa balança, existe muito mais carinho do que ódio. O bullying está institucionalizado, ele só foge de lugar: quando não é possível fazer nas escolas, o assédio vai para a internet. Há essa necessidade de transformar alguém em oprimido, e esse esconderijo que as redes sociais proporcionam apenas facilita essa dinâmica. Portanto, o melhor a se fazer é não acreditar naquilo que estão falando, pois é sempre sobre o outro.
CLAUDIA: Qual é o maior desafio e alegria em ser uma mulher em seu ramo?
Isabelle Nassar: O maior desafio é ter certeza de quem somos, pois sempre estão tentando nos invalidar de alguma forma, especialmente em relação ao nosso feminino. Vivemos numa sociedade que impôs uma norma acerca do que é ser mulher, e essa norma é cis, branca e hétero. E olha que eu sou uma pessoa apedrejada mesmo sendo tudo isso. Mas dentro desse recorte, eu fujo do recorte! Então as pessoas vão estranhar, criticar e precisamos aprender a não escutar. Agora, a maior alegria é simplesmente poder lidar com esse ofício que eu amo de paixão. Essa é a melhor profissão do mundo. É uma delícia ser artista.