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Como você se enxerga? Helô D’Angelo reflete sobre autoimagem em tirinhas

Sensibilidade e talento guiam as criações da cartunista, que conquistou as redes sociais com suas tirinhas sobre ser mulher no mundo

Por Sarah Catherine Seles
13 jan 2023, 07h39
Ilustrações Helô D’Angelo
 (Ilustrações Helô D’Angelo/Divulgação)
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Não faz muito tempo, uma ilustração de Helô D’Angelo viralizou nas redes sociais. Nela, duas garotas completamente diferentes se encaram: a primeira, com balõezinhos dizendo “cabelo lindo”, “altura nada demais”, “ossinhos à mostra”, “a ‘gordura’ era sobra de pele normal”, “algumas manchas na perna”; a segunda, “cabelo sem jeito”, “dentes horríveis”, “peluda”, “gorda”, “manchas horrendas”, “grande demais”. “Olhando as fotos, eu vejo que meu corpo era mais ou menos assim (versão 1), mas eu me via assim, um ‘monstro horroroso’ (versão 2).” Impossível ser mulher num mundo pautado pela magreza enquanto sinônimo de beleza e sucesso e não se identificar imediatamente com o quadrinho. 

O desenho, feito por Helô D’Angelo (@helodangeloarte), é um dos primeiros que aparecem nas páginas de seu novo livro, Nos Olhos de quem Vê (HarperCollins), HQ autobiográfica que aborda a relação da cartunista e ilustradora com seu corpo e o padrão imposto socialmente. A inquietação para criar veio da experiência durante a pandemia: o isolamento social fez com que os os hábitos e a relação consigo mesma fosse transformada. “Passei por diversas mudanças, mas percebi que estava ocupando demais a minha cabeça com a questão estética e não conseguia mais ver beleza em mim. Isso me fazia muito mal, então comecei a desenhar pequenas tirinhas para desabafar”, conta.

Ilustrações Helô D’Angelo
Os quadrinhos de Helô D’Angelo são um convite para repensar a autoimagem. (Ilustrações Helô D’Angelo/Divulgação)

O mergulho no autoconhecimento foi intenso, mas transformador. “No livro eu revisito várias memórias da minha infância, da minha adolescência e também algumas do início da vida adulta, do início da faculdade. E olhar para isso de novo foi [um processo] bem complicado”, explica. Além dessa caminhada em direção ao amor próprio, a autora define o livro como um “vômito” de tudo o que estava guardado desde pequena. E aí, o processo de análise se uniu ao da escrita: “Acabei misturando a terapia com esse registro e no fim, apesar de difícil, foi aliviante poder desenhar e colocar isso para fora”. 

Durante a escrita, foi inevitável não conversar e compartilhar suas angústias e pensamentos com outras mulheres próximas, fossem amigas ou familiares. “Eu consegui dividir as experiências ruins com elas e, a partir disso, elas também puderam lembrar de coisas que passaram… Algumas delas, inclusive, aparecem no livro”, conta sobre a escolha de colocar essas outras memórias que não são necessariamente suas, mas que, em certo ponto, mostram como as narrativas se coincidem. 

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“Eu dedico o livro para minha mãe e para todas as mulheres. Espero que minha mãe leia como uma mensagem de amor para ela, essa é a visão que eu quero passar. Minha mãe não é culpada de tudo, mas ela está muito presa nesse padrão. Assim como minha avó estava muito presa e todas as outras mulheres da minha família. A gente acaba perdendo muito tempo, uma energia gigante das nossas vidas pensando nisso”, compartilha Helô. Desde pequena, a artista observou que sua mãe, médica anestesista, uma das pioneiras no setor dela, que passou em primeiro lugar na residência da Universidade de São Paulo (USP), sempre esteve muito preocupada com sua beleza e aparência.

Ilustrações Helô D’Angelo
E você, já parou para pensar no quanto está se cobrando? (Ilustrações Helô D’Angelo/Divulgação)

Ao compartilhar suas vivências e ouvir histórias de outras mulheres, a desenhista percebeu que as marcas de vida são apagadas, rugas, cicatrizes e estrias são tidas como feias. “Só que essas marcas são marcas de vida, são marcas de experiências. Quando a gente quer apagar tudo isso, principalmente essas marcas de pele, significa que a gente não quer olhar para o nosso crescimento. É como uma concha, ela tem marcas de crescimento e não deixa de ser bela, por que a gente ia querer apagar isso?”, aponta.

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“O próprio livro se tornou uma forma de mudar a minha visão sobre o meu corpo. Eu botei muita coisa pra fora e me desenhar muitas vezes, porque me desenho de todas as formas ali naquele livro, pelada, jovem, em projeções de como vou ser mais velha, me fez olhar muito meu corpo e mudar minha visão sobre como ele é”. A cartunista passou a ressignificar o que antes ela considerava “defeitos ou feiuras” e abraçar as características socialmente “negativas”.

Helô compartilha que, ao longo da escrita, ela passou a entender e compreender mais a fundo a relação com seu corpo e como estigmas sociais a afetaram. “Eu me senti mais tranquila com a visão ruim que a gente tem sobre os nossos corpos. E tudo isso me deu mais tranquilidade para encarar o meu corpo como um corpo bonito e um corpo que me leva onde eu quero ir, é um corpo que funciona, sabe? É um corpo que está aqui, já passou por tantas coisas terríveis e continua de pé”, compartilha a cartunista.

Ilustrações Helô D’Angelo
Para a artista, a falta de contato com o mundo real reforçou padrões estéticos criados e alimentados pelas redes sociais. (Ilustrações Helô D’Angelo/Divulgação)
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A sensação de insatisfação e insegurança com o próprio corpo se fortaleceu durante a pandemia. Para a artista, a falta de contato com o mundo real reforçou padrões estéticos criados e alimentados pelas redes sociais. “O único contato que você tinha era o mundo digital, onde tudo tem filtro, um ângulo e uma edição. As pessoas sempre pareciam estar mais mais belas do que elas de fato são, no sentido do padrão de beleza. E você começa a se sentir mal por não ser da mesma forma”, explica. O livro é um caminho para ser quem é, sem depender das redes e de padrões impostos socialmente.

O livro de Helô D’Angelo

“Nos olhos de quem vê” é dividido em partes do corpo, ou seja, cada capítulo aborda uma área. Helô fala de pele, cabelo, pelos, peso e autoestima, mesclando suas vivências ao longo da vida. “Dentro dessas partes do corpo, eu ia contando as lembranças. Então não é cronológico, o livro mistura coisas da infância. E eu escolhi assim porque eu achei que ia ficar mais dinâmico também”, explica.

Como Maqui Nóbrega fala no prefácio, este é um livro que não deveria existir, eu também gostaria que mulheres não precisassem falar sobre momentos tão dolorosos. “Nos olhos de quem vê é para a Maqui de treze, mas também para os pais, para os professores, para as meninas novinhas e para as mulheres formadas, para os moleques babacas da escola e para os homens que se acham inadequados […]. Todo mundo tem que entender que a gente não precisa e não quer mais sofrer por tudo o que vai ler nas próximas páginas. Espero que, ao terminar de ler este livro, você encontre acolhimento e inspiração para olhar para si e encontrar beleza (ou pelo menos começar a pensar sobre isso)”, escreve a blogueira e digital influencer. De forma leve e ao mesmo tempo profunda, Helô faz refletir sobre as mazelas e consequências da pressão estética no desenvolvimento de meninas e adolescentes como ela. 

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“Eu já tinha projeto de fazer esse livro há um tempão, só que geralmente eu faço e publico os meus livros de forma independente, com financiamento coletivo. E eu nunca fazia [um livro com esta temática] porque achava que não ia virar e eu precisava conseguir os apoios para a publicação”, conta Helô D’Angelo em entrevista à Revista CLAUDIA. 

E assim, quando a proposta da Harpers Collins, publicadora do livro, surgiu, ela tinha certeza que ia seguir com o tema da autoimagem.

Nos olhos de quem vê

Nos olhos de quem vê

Nos olhos de quem vê (capa dura)

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