A pressão estética para ter os seios perfeitos e seus problemas
Câncer de mama, gravidez e envelhecimento são apenas alguns dos fatores responsáveis pela mudança dos peitos, e a sociedade não poupa julgamentos a eles
Peito, teta, mama, seios. Palavras de quatro a cinco letras que nomeiam uma parte do corpo que muitas vezes pressiona esteticamente as mulheres. Eles precisam ser grandes, mas não tão grandes. Devem ser simétricos, sem esquecer o bico para cima, e nunca, nunca mesmo, flácidos. Caso uma fatalidade, como o câncer, te obrigue a passar por uma cirurgia, é provável que você não seja poupada dos olhares de pena ou desgosto. Se eles caírem depois da amamentação, o silicone será indicado por dezenas de pessoas, que não dão valor à beleza de alimentar um bebê. E, se resolver reduzir a mama por questões associadas à saúde, os homens farão questão de pontuar a sua “burrice”.
A chegada das mamas não é tranquila: com os primeiros sinais, que surgem lá pelos 10, 11 anos, as meninas não só estranham o crescimento, mas também as mudanças decorrentes desse processo. De repente, usar sutiã é uma obrigação, aguentar as possíveis comparações, piadas e opiniões não solicitadas, também.
“Bastava usar uniforme branco para os meu colegas fazerem piadas, inclusive me chamavam de vaca”, lembra a professora universitária Paula*, que escondia o corpo com amontoados de roupas de frio para não escutar comentários sobre ele.
A escritora Simone de Beauvoir defende que, desde a infância, somos socializadas como “o outro”, enquanto o homem é “o sujeito”. Nossa existência, portanto, dependeria deles. Para Simone, somos ensinadas a buscar a aprovação e valorização dos homens também no âmbito do corpo. Quem está fora do padrão é pressionado socialmente a se encaixar pelo machismo estrutural, mesmo que tenha passado por mudanças originadas por processos naturais, como gravidez, envelhecimento ou doenças.
O drama permanece na adolescência. O primeiro namorado de Ana*, que, ao contrário de Paula, tinha baixo volume de seios, disse para ela colocar silicone. “Não consegui fazer sexo sem blusa nos próximos cinco anos daquele dia.” O hábito acabou apenas depois do término do casal e do assunto virar pauta no consultório de sua psicóloga.
“A pressão por seios perfeitos possui muitos impactos na vida das mulheres. Primeiramente, a questão da pressão estética emerge, impactando negativamente na autoestima delas, possibilitando o desenvolvimento de transtornos de imagem”, pontua Manoela Veras, historiadora que estuda colonialidade e gênero na UFSC.
A ideia de seios perfeitos também é atravessada pela questão racial, no ponto de vista da pesquisadora, uma vez que aquilo que é entendido como ideal costuma ser o corpo magro branco. “Esse ideal acarreta na desvalorização da mulher negra.”
O avanço da idade, que naturalmente vem acompanhado da flacidez dos seios, também gera medo e desgosto. Joana*, aos 78 anos, não tem uma boa relação com seu busto. “Acho difícil me olhar no espelho, porque meu peito está caído, flácido. Não gosto do que vejo.”
Luana*, que precisou fazer a retirada de uma das mamas depois de um diagnóstico de câncer, também tem dificuldades para se aceitar. “É uma marca que me lembra a doença, mas o fato de não ser considerado esteticamente bonito, de não ter representações disso como algo normal também me fere. É muito difícil me relacionar amorosamente. Muitos homens perdem o interesse depois de descobrir.”
Mulheres com câncer de mama, garotas frustradas com o tamanho dos peitos, mães que tiveram o prazer de amamentar. A lista não acaba, e a pressão estética tem um custo alto para a autoestima dessas pessoas. Muitas delas recorrem a uma sala cirúrgica e remodelam o busto, mas essa é a solução?
A banalização de cirurgias plásticas é uma realidade brasileira: são realizados mais de 200 mil procedimentos para a implantação da prótese de silicone anualmente, segundo dados da Sociedade Internacional de Cirurgias Plásticas. Colocar a própria vida em risco em nome de um ideal estético é um problema, de acordo com Manoela.
“A indústria das cirurgias plásticas e a banalização desses procedimentos não são soluções, mas parte do problema, uma vez que elas possibilitam que nós individualizemos os problemas que são coletivos, tendo uma compreensão errônea de que a solução para a pressão estética é a modificação corporal e não a crítica a uma estrutura que não nos respeita e não nos reconhece como sujeitos”, termina a historiadora.
*Nomes alterados para preservar identidade das entrevistadas