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A dignidade menstrual deve ser tratada pelas empresas também

O segmento de menstrual care vem crescendo no Brasil e no mundo, mas essa conversa não deve ficar apenas com quem produz absorventes

Por Larissa Agostini
Atualizado em 14 dez 2022, 16h52 - Publicado em 13 dez 2022, 09h00

O segmento menstrual care deve crescer cerca de 6,7% até 2026. Não à toa, o setor tem recebido mais atenção de empreendedores que buscam soluções inovadoras, de custos mais acessíveis e baixo impacto ambiental. Há uma crescente de novos produtos e marcas no mercado, muito se deve ao fato de as mulheres estarem ocupando o mundo dos negócios e desenvolvendo produtos para problemas enfrentados por elas, em um segmento que liderado por homens ficou mais de 80 anos sem inovação.

No Brasil, cerca de 60 milhões de mulheres menstruam, segundo dados do relatório da ONG Girl UP. Além de serem 51,8% da população brasileira, são elas as responsáveis por 90% das decisões sobre cuidados e higiene. Segundo o estudo Femtech Landscape Report 2021, o mercado mundial de saúde da mulher deve atingir o marco de US$ 1,186 trilhão em 2027. Com esse breve contexto sobre um mercado que movimenta uma fatia significativa da economia e com consumidores em potencial representando mais da metade da população mundial, podemos nos questionar: como a dignidade menstrual foi deixada de lado por tanto tempo?

A pobreza menstrual ganhou visibilidade a poucos anos, à medida que mobilizações de ativistas e instituições conseguiram abrir diálogo com marcas do setor e esfera pública. Com a pandemia da Covid-19 em 2020 o debate ganhou força e vem sendo amplificado, mas ainda é preciso percorrer um longo caminho. A falta de acesso a produtos menstruais é somente a ponta do iceberg, discutir dignidade menstrual é por luz à problemas interseccionais de desigualdade e vulnerabilidades, no qual as mulheres são sempre mais afetadas.

Mulheres têm menos participação no mercado de trabalho, ganham menos e enfrentam níveis maiores de desemprego ou empregos precários. As barreiras econômicas de gerir o período menstrual com dignidade tem impactos na saúde, na educação e no empoderamento financeiro dessas pessoas e isso afeta toda a sociedade.

Segundo dados da ONU, 1 em cada 4 meninas no Brasil deixou de ir à escola durante a menstruação, mas o que ninguém está olhando é que as mães dessas meninas também estão deixando de ir ao trabalho, ou buscando empregos informais que possibilitem flexibilidade na agenda durante o período. Sabemos que as mulheres priorizam fornecer o absorvente para suas filhas, o que significa que se existe uma menina com dificuldade de ocupar espaços sociais, por trás também existem mulheres sendo excluídas de diversas áreas. Porém, a precariedade menstrual não está só na privação de recursos, mas também na falta de educação sobre o tema e na estigmatização da menstruação. A educação em saúde menstrual é urgente, a falta dela favorece a disseminação de informações erradas e tabus e isso tem impacto direto na desigualdade de gênero e na qualidade de vida de quem menstrua, se desdobrando em problemas maiores também para o Estado acarretando em maiores custos em saúde por exemplo.

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Só vamos combater a estigmatização da menstruação quando as mulheres conhecerem seus corpos e seus direitos. O silêncio em torno do tema favorece a invisibilidade dele. Se você não nomeia uma coisa, significa que ela não existe e assim você não precisa resolver. E tem muita gente ganhando com o silêncio em torno da menstruação. Existem diversos projetos sobre educação e pobreza menstrual parados devido à barreiras culturais e machistas na política. Se a menstruação continuar a ser tratada como um assunto íntimo e restrito aos tabus, políticas públicas nunca serão implementadas.

Ainda assim, mesmo com acesso a itens de higiene pessoal e poder de compra, as mulheres ainda passam pelo preconceito com a menstruação que existe no mercado de trabalho. A questão a ‘TPM’ utilizada  para descredibilizar uma mulher diante de alguma ação ou, então, a falta de sensibilidade ao lidar com as pessoas que têm períodos mais críticos e enfrentam por exemplo, a endometriose ou a TPDM – transtorno disfórico pré menstrual – que é um caso agravado da TPM e que leva até mesmo à pensamentos suicidas.  

O ciclo hormonal tem impacto direto na regulação das nossas emoções e no caso de pessoas trans ou não binárias, o aspecto psicológico é ainda agravado impactando negativamente a autoestima e a sociabilidade no ambiente de trabalho. Por isso, acredito que as empresas precisam pensar em estratégias que modifiquem esse cenário em torno da menstruação. Não importa onde você trabalhe haverá alguém com questões menstruais perto de você e a pobreza menstrual pode ser uma delas.

Uma pesquisa da USAID (agência dos EUA para desenvolvimento internacional) mostrou que funcionárias nas Filipinas estavam ausentes pelo menos um dia por mês durante o período menstrual devido à falta de instalações adequadas em seus locais de trabalho. O estudo estimou 13,8 milhões de ausências com uma perda econômica de 13 milhões de dólares por ano.

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A meu ver, as empresas do setor devem seguir no caminho de desenvolver inovações que gerem impacto positivo na vida das pessoas que menstruam, além de promover a saúde e bem-estar nesses momentos. O mercado de trabalho precisa aprender a respeitar os ciclos hormonais, assim como a menopausa e traçar estratégias que melhorem a qualidade de vida delas no ambiente corporativo. O setor público tem o papel de oferecer cuidados básicos para a população com o objetivo principal de reduzir as desigualdades, além de, junto com especialistas da área, educar a sociedade para desfazer os tabus que existem em torno deste tema.

A pobreza menstrual é um problema de infra-estrutura, renda e normas culturais e precisa ter o engajamento de todos. Apesar de ser fundamental não basta apenas fornecer absorventes, é preciso fornecer educação, saúde e protagonismo.

 

Dignidade menstrual deve ser assunto nas empresas também
Larissa Agostini é especialista em saúde menstrual e gine-ecologia. (Divulgação/Divulgação)
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