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Flávia Piovesan, dos Direitos Humanos: uma estranha no ninho de Temer?

Ela causou um rebu entre seus pares ao aceitar o convite de Temer. A feminista, doutora, professora e procuradora decidiu emprestar sua biografia ao interino com o desejo de defender os direitos humanos

Por Patrícia Zaidan Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 out 2016, 21h17 - Publicado em 21 jul 2016, 17h19
Filipe Redondo
Filipe Redondo (/)
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Os protestos foram grandes. Mas juristas, ex-ministros de direitos humanos, feministas, ativistas e alunos não demoveram Flávia Piovesan, 48 anos, da decisão de integrar o segundo escalão do governo interino de Michel Temer – que havia sido duramente criticado por não incluir mulheres e negros no comando. Sem status de ministra, Flávia assumiu a Secretaria de Direitos Humanos garantindo que sua presença é uma tentativa de evitar retrocessos e de defender a causa abraçada por ela há 25 anos. “Perguntei se teria liberdade para agir e ouvi um sim. Se perceber que não me deixam trabalhar, eu saio”, explicou. “Não tenho apego ao poder, a carro oficial. Aliás, adoro andar de bicicleta e a pé.”

Licenciada do cargo de procuradora do Estado e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Flávia conta que apenas uma questão a fez balançar: “Tive insônia só de pensar em passar a semana em Brasília, longe da minha filha”. Sofia, 8 anos, permanecerá na capital paulista com o marido de Flávia, o advogado Marcos Fuchs. Ela recebeu CLAUDIA em casa, com chá de gengibre, e a poucas horas de seguir para dois compromissos firmados antes de virar governo. Em Genebra, participaria de uma conferência da ONU e, em Berlim, falaria dos direitos dos povos indígenas.  
    
Pesou na sua decisão a amizade com Temer e Luciana, filha dele e secretária de Assistência Social em São Paulo?
Luciana é uma irmã querida desde nossa infância no Colégio Santa Cruz. Temer é apegado aos valores constitucionais, foi meu orientador no mestrado. Confio nele. 

Não se considera uma estranha no ninho – como seus críticos disseram – em um governo sem diversidade?
Meu partido se chama Direitos Humanos. Falo o que sempre falei de outro lugar e com nova escuta. Tenho posições contundentes e publicadas. Sou independente. Compartilho a sua angústia: falta diversidade e igualdade de gênero. Por isso, é um contrassenso a crítica. Quando veio o convite, pensei: “Pelo menos uma mulher entra. Não deveria recusar só porque todas se negariam. Sou séria, competente. E há outras. Cito Maria Silvia Bastos, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, e Maria Helena Castro, secretária executiva do Ministério da Educação, que, na verdade, é quem toca a pasta.

A mulher na retaguarda. Toca a pasta, mas não é a ministra. No mínimo, uma injustiça. Não acha?
Concordo. Estamos mal representadas. Nos partidos, somos 15%; no Congresso, 11%. Assumi em uma emergência. E cada vez que entro na secretaria noto que tomei a decisão certa: há vidas correndo riscos. Vou manter programas de proteção à criança ameaçada de morte, às testemunhas e aos defensores de direitos humanos. Assim como as ações de combate ao trabalho escravo, à tortura, à homofobia. O meu adjunto, embaixador Silvio Albuquerque, um negro que chefiou o gabinete de Joaquim Barbosa no Supremo e defendeu uma tese sobre racismo, no Itamaraty, disse: “Que bom que somos nós. A secretaria não foi rifada”. 

A portaria 611/2016, de junho, que suspende gastos por 90 dias, paralisará a defesa dos direitos humanos e de conselhos que protegem, idosos, homossexuais, pessoas com deficiência. Como agirá? 
Ela diminui a agilidade, sim. Mas aumenta o cuidado com a verba pública. Eu podia decidir sozinha sobre convênios, viagens de servidores em missões, por exemplo. A partir da portaria, tenho que pedir ao ministro para comprar passagens etc. Ajuda a conhecer e arrumar a casa. Havia muitos problemas com convênios e prestação de contas.  

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O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, a quem você responde, chefiou a PM paulista, a mais violenta do país, que matou duas pessoas por dia nos primeiros meses de 2016. A maioria pretos e pobres. Como vê isso?
Alexandre me respeita, escuta e me tem como referência na área. Já pude convencê-lo algumas vezes. O diagnóstico está feito: pretos e pobres são o alvo preferencial da violência policial. Vamos pensar em prevenção e encorajar o Estado a investigar, processar e punir essas violações. 

Você atuará no combate à violência contra a mulher com a secretária da Mulher, Fátima Pelaes, que condena o aborto legal e é investigada por desvio de verbas?
Eu a respeito. Ponto. Meu mantra é respeito, pluralismo, tolerância e diálogo. Tenho divergências e convergências. Agiremos no que converge. Também farei um pacto com as universidades para combater o sexismo e o racismo. Estupro e abusos entre estudantes são ainda mais intoleráveis. Outro pacto será com o Conselho Nacional de Justiça, Defensorias e Ministério Público e envolverá as delegacias de polícia. Agentes dessas áreas precisam ser sensibilizados. Veja a apuração do estupro coletivo contra a jovem carioca: houve diferença no tratamento dela e as apurações andaram, quando o delegado foi substituído por uma delegada.

As mulheres estão protestando nas rua de todo o país. Como ajudará nas demandas que elas apontam? 
Quando comecei no feminismo, éramos solitárias. Fico emocionada ao ver milhares de garotas militando e me ofereço como canal de comunicação com o governo. Mas não tenho esperanças quanto ao Congresso, refém dos religiosos. Fico na resistência para barrar recuos. O momento é duro, mas há perspectiva de mudanças na democracia. A lei alcançou o poder econômico e político. Votei em Lula e em Dilma duas vezes. Mas não consegui mais defender. Ocorreu uma corrupção sistêmica que me deixou desencantada.

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Você acredita que a gestão atual não tem os mesmos problemas, com três ministros demitidos, outros sob suspeição e o presidente citado em delações?    
Felizmente ocorreram as exonerações. E há o compromisso de endossar as medidas do Ministério Público Federal no combate à corrupção. Tenho certeza que nesse governo ninguém fará nada para impedir a Lava-Jato. 

O QUE FLÁVIA PIOVESAN PENSA SOBRE: 

Aborto O Brasil é signatário de convenções internacionais que asseguram à mulher o direito à saúde. O aborto clandestino provoca mortes evitáveis. A voz dela deve ser respeitada também no caso de zika: se decidir interromper a gestação deve ter o direito garantido, sem risco de ser presa. O Supremo pode discutir e decidir sobre isso.

Redução da Maioridade Penal Sou contra.

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Revisão do Estatuto do Desarmamento Não devemos flexibilizar a compra de armas. Em uma reunião no Ministro da Justiça, os secretários de Segurança Pública mostraram tendência favorável. Isso preocupa.

Criação do Estatuto da Família, que reconhece só a união entre homem e mulher como unidade familiar Contra. A família se move pelo afeto. O Supremo julgou que as uniões homoafetivas merecem proteção do Estado.

“Se não me deixarem trabalhar, eu saio. Não tenho apego ao poder”

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