Por uma sustentabilidade que pense a natureza como expressão do feminino
Foi durante uma viagem à Patagônia que reafirmei dentro de mim o entendimento de proteção ambiental atrelado ao cuidado social
Foram muitos voos e carros para chegar até a Villa Angostura, na Patagônia argentina. Eu que sou uma pessoa emocionada, não consegui encontrar ainda as palavras certas para descrever a grandeza desse lugar. Abrir a janela do hotel e olhar um horizonte desenhado por montanhas de gelo, um sem número de estrelas e lagos de um azul jamais visto. O presente que a natureza nos dá é diário e o que fazemos em troca? Fechamos os olhos, nos ocupamos com telas num entra e sai de computador-celular-redes-sociais para chegar aqui, olhar o pescador das seis da tarde e imaginar como será a vida desse homem, despreocupado com o frio subzero da água que bate nas suas botas de borracha enquanto tenta caçar lagostins e peixes no quintal de casa. Do alto da varanda do meu quarto no hotel Correntoso Lake & River Hotel, e da minha inocência, desejo, por um instante, ser quem avisto dali. Sempre falamos da grama do vizinho parecer mais verde que a sua. Mas quando se tem formações rochosas e ovelhas ladeando a sua estrada do trabalho para casa, me questiono o propósito da nossa existência, enquanto seres humanos mesmo. Um papo bastante filosófico para uma jornalista que, a convite da Volvo, foi “apenas” viajar para testar os modelos híbridos do XC60 e XC90, como novos recursos de autonomia e maior potência dos motores elétricos.
Contudo, não sei ser diferente disso. De apreciar o silêncio do carro, as enormes janelas para o lado de fora, com as mãos quentes do aquecedor que sai em direção ao volante. O pé no acelerador, mas sem pressa de correr, porque não queremos chegar no destino final sem termos apreciado o caminho que nos levou até lá. Até os 7 lagos, com vaquinhas peludas amamentando seus filhotes na beira da estrada. Cachorros de aparência desgovernada recebendo com o amor mais puro que há um grupo de jornalistas estrangeiros, e não só no passaporte. Mas na vivência de apreciar com peito aberto a imensidão que são as várias vidas que se multiplicam diante de nossos olhos. A família de patos, os cogumelos no canto das raízes grossas de árvores milenares.
Estávamos ali para também sermos acolhidos por carros dos mais seguros do mundo, que nos dão confiança para dirigir em terrenos desconhecidos sem a preocupação do trânsito, do caos, da falta de qualidade do asfalto. O básico e além está dado em nossas mãos. Assim, fica fácil de olhar para fora e encontrar o que se tem dentro também. Fica fácil se abrir com a companheira de viagem, colega que conheci ali mesmo no lobby do hotel. Amigas que trocam confidências, se apoiam, se escutam, se acolhem; falam da política do mundo, da qualidade de um carro Volvo, do modo One Pedal Drive que te ajuda na dirigibilidade em curvas tomadas pela geada matinal, da beleza incansável que nos cerca do lado de fora. “Não canso de olhar” era uma constante. Enquanto uma dirige, a outra filma, fotografa, mostra os animais na pista, e vice-versa.
Toda parada é um evento, gastronômico e social. São empanadas fritas de queijo com ervas acompanhadas de chocolate quente, o calor da comida que se mistura com o ar gelado saindo das conversas do lado de fora. As botas enterradas no gelo, o colega que senta no chão frio para fazer uma tomada de sua reportagem para a TV, outra equipe de vídeo solícita que te guia por dentro do veículo para você ter os melhores takes das matérias que, agora, também precisam ser filmadas. É um admirar e trocar e gostar do que se faz que até irrita.
As paradas também são para discutir o futuro da indústria, ao lado de pessoas que pensam o agora e o futuro de maneiras disruptivas. Luiza Brasil e Nina Silva, embaixadoras da Volvo, argumentam sobre carros pelo viés do comportamento, das finanças pessoais, da empatia da troca, da educação social, das políticas públicas. Excelentes nas respectivas áreas de atuação, elas trazem um olhar fresco para uma indústria das mais clássicas do mundo capitalista-globalizado. São nomes como esses que, de fato, se propõem a fazer diferente, seja dirigindo um carro elétrico ou inspirando jovens mentes a refletir sobre um mundo que ainda não chegou, mas que precisamos repensar para ontem. Do jeito que está não é possível continuar, se não aquela estrada, aqueles animais, aquele gelo jamais estarão ali para contar a história que lhes pertence. E nós aqui com a mania de nos acharmos superiores. Perto disso tudo, nada somos.
Seguimos viagem, dirigindo por outros quilômetros inéditos no repertório, ouvindo histórias das mais divertidas, por vezes tristes também. Refletimos em conjunto sobre as ações da marca em prol da sustentabilidade, porque o exercício da crítica nos cabe, e não só profissionalmente. Apreciamos a boa comida da região, a vista, sempre lá, os sorrisos de quem nos cerca à mesa. Falamos do nosso exercício enquanto jornalistas e, de novo, percebemos o quanto a vida é muito mais do que a pequeneza que nos propomos diariamente a aceitar. Penso no equilíbrio entre o aqui e o que vem depois, no final de Senhor Fantástico, no Heroes em alemão que toca em Jojo Rabbit, no cheiro de mato gelado às seis da manhã, no livro de Olga Tokarczuk e em outro de Silvia Federici, no sabor do almoço que meu companheiro faz para nós, no carinho no cabelo, nos versos de Chico e Gil, na beleza do simples. Na exuberância das emoções que temos possibilidade de sentir diariamente.
Teria sido perfeita, mesmo com uma logística cansativa, se não fosse aquilo que não temos controle, de outra ordem. Éramos lembradas da nossa condição enquanto mulheres numa sociedade machista. Homens espaçosos física e verbalmente, confortáveis demais para falar o que queriam sem serem chamados a atenção. Do contrário, disponíveis a corrigir quem não precisa de correção pelo mero prazer de se sentir superior, como forma, talvez inconsciente, de contra-atacar a nossa presença cada vez maior nos espaços que antes eram só deles. Prontos para desmerecer o seu trabalho de anos com uma piada ínfima, um comentário que reduz as mulheres as suas aparências. São comentários assim que nos deixam cansadas, desmotivadas, irritadas. Por mais que tenham sido poucos os indivíduos que agiram de tal forma, e que nada tinham relação com a empresa Volvo, eles ainda existem e isso ainda machuca. E aí quando retrucamos a babaquice masculina, ainda temos que escutar “estava só brincando” num sair de cena totalmente despreocupado com os efeitos das palavras que atravessam nossos corpos diariamente. Porque, de fato, não há preocupação, não há consciência de responsabilidade da própria fala e ações. Por certo, nenhum deles vai entender, tratados com a mão na cabeça desde criança, incapazes de reconhecer seus erros individuais como manutenção de um sistema que, não importa o que façamos, os espaços que ocupamos, a qualidade do nosso trabalho, o cuidado da nossa fala, sempre (sempre) irá nos reprimir.
Não temos controle do real da natureza, nem do real estrutural da nossa sociedade. De um lado, a exuberância, do outro, o preconceito refinado. Gostaria que a vida fosse como o carro que nos dá o básico, como Viena que tem projetos de políticas públicas para ações sustentáveis na cidade, para apenas existirmos com o privilégio coletivo de contemplar, vez ou outra, a beleza de existir. Pensar em um mundo melhor para as futuras gerações é também pensar em educação inclusiva, que fale de verde, que fale de gênero. Afinal, a natureza é também uma expressão feminina.