Stonewall: documentário da Netflix debate polêmica morte de ativista trans
"A Morte e a Vida de Marsha P. Johnson" investiga o que realmente aconteceu com Marsha, uma das líderes da Revolta de Stonewall.
Junho é conhecido por ser o mês do Orgulho LGBT e, neste ano, o período fica ainda mais cheio de força. Nesta sexta-feira (28), a Revolta (ou Rebelião) de Stonewall completa 50 anos. Isso significa que faz cinco décadas desde que lésbicas, gays, bissexuais e pessoas trans entraram em conflito com policiais, em Nova York, como símbolo de resistência.
Entre os nomes que fizeram história em Stonewall, Marsha P. Johnson é um dos que mais se destacam. Ela foi uma mulher trans negra que exigia direitos iguais aos LGBTs, mas que foi morta do dia para a noite em 1992. Segundo a polícia, ela teria se suicidado, mas essa versão é amplamente contestada.
Para se contrapor ao descaso feito com a ativista, o documentário “A Morte e a Vida de Marsha P. Johnson” foi lançado, em 2017, pela Netflix.
Desde o início, a produção de 1h45 é guiada por Victoria Cruz, outra mulher trans ativista duramente marginalizada pela sociedade quando mais jovem. Ela fazia parte do programa New York City Anti-Violence Project como conselheira e quis comandar a reabertura do caso de Marsha antes de se aposentar.
O intuito do filme é tentar reconstruir como aconteceu a morte de Marsha até o momento em que o seu corpo foi encontrado no Rio Hudson. Para isso, o diretor David France acompanha Victoria em entrevistas com familiares e amigos da ativista até a tentativa de falar com policiais que comandaram a investigação do caso.
Como mostra a inversão dos termos “morte” e “vida” no título da obra, a história parte do falecimento repentino de Marsha para em seguida retratar quais mulheres trans continuaram vivas e lutando em prol da mesma causa. O nome que mais ganha destaque é o de Sylvia Rivera. Ainda no trailer, fica nítido que ela foi uma das grandes amigas de Marsha e que, juntas, as duas participaram da Revolta de Stonewall com ataques diretos aos policiais. Vale lembrar que a rebelião foi tão importante que um mês depois, Brenda Howard criou a Parada do Orgulho LGBT inicialmente intitulada “Christopher Street Liberation Day March“, passeata em que LGBTs reforçaram suas identidades publicamente.
Além de contextualizar o que foi a revolta, o documentário tem como ponto alto a retomada dos fortes discursos feitos por Marsha e Sylvia na época em que o “T” era ainda mais subvalorizado dentro da sigla. Inclusive, com a produção fica nítido como a discriminação também acontece dentro do própria comunidade LGBT, especialmente se um indivíduo pertence a mais de uma minoria – uma mulher trans negra tem menos privilégios do que uma mulher trans branca, por exemplo.
O documentário da Netflix também retrata como o conceito de transgênero demorou para ser entendido até mesmo dentro da comunidade de pessoas trans. Muitas vezes, mulheres trans foram colocadas como drag queens para que a mudança de imagem ficasse menos difícil de ser entendida. Em uma sociedade com raízes tão fortes na binariedade (ou você é isso, ou você é aquilo e NÃO pode mudar), tomar consciência de que é possível transicionar e se reconhecer com o gênero oposto não foi e ainda não é simples.
Para ilustrar que a luta continua, Victoria acompanha casos de agressão e morte de mulheres transexuais que eram recentes ao período de produção do documentário. Tudo isso ajuda para concluir que: “A Morte e a Vida de Marsha P. Johnson” não é fácil de ser engolido. Você não vai conseguir desligar a Netflix e ir dormir. Não tem como. Mas assim como os conflitos por mais direitos, esse filme é necessário.