Liniker e Seu Jorge brilham em segunda temporada de ‘Manhãs de Setembro’
Série da Amazon Prime reestreia nesta sexta-feira, com narrativa que ressalta a importância dos muitos laços familiares
Minha casa não é minha. E nem é meu este lugar. Esses dois versos de Travessia, canção de Milton Nascimento, dão o tom da segunda temporada de Manhãs de Setembro, série da Amazon Prime, cuja segunda temporada estreia nesta sexta-feira. A trama, que acompanha a vida de Cassandra, uma mulher trans que se divide entre o trabalho com entregas por aplicativo e o sonho de ser cantora, tem uma reviravolta emocional quando ela reencontra o pai, Lourenço, dez anos depois. Interpretada com maestria por Liniker, Cassandra é atravessada por dolorosas lembranças familiares ao voltar para a casa do progenitor, vivido por Seu Jorge, no interior do Paraná.
A canção Travessia é o ponto de partida desse reencontro entre pai e filha depois de que Cassandra (sendo ainda Clóvis aos olhos do pai) saísse de lá rumo a São Paulo. Numa das mais belas cenas de toda a série, Lourenço toca o violão para acompanhar a filha, cantando. “Essa foi a maneira de quebrar o gelo entre os dois”, comenta Seu Jorge em conversa com CLAUDIA. “A música vem sempre como esse instrumento de aproximação entre as pessoas. E Travessia fala de partida, mas também de não desistir. Tem essa mensagem de ‘vou querer amar de novo’, ‘vou tentar ser feliz de novo'”, acrescenta.
Essa reaproximação é marcada pela presença de Gersinho (interpretado por Gustavo Coelho), filho que Cassandra descobriu na primeira temporada da série, fruto de uma noite de loucura com Leide (vivida pela magistral Karine Teles). Além de se deparar com uma filha adulta, completamente transformada e na construção de sua independência, Lourenço ganha um neto, também de surpresa. E é o menino que ajuda a costurar os laços familiares esgarçados há tantos anos. Ele recebe o afeto imediato do avô e vai tecendo uma aproximação com essa mãe que, até pouco tempo atrás, desconhecia a sua existência e, ao conhecê-lo, quase o renegou. “Nesta segunda temporada de Manhãs de Setembro, o Gersinho quer conquistar a Cassandra ainda mais”, conta Gustavo.
Esse bordado afetivo conta também com Rute, personagem de Samantha Schmütz, que domina o drama da narrativa ao tentar reaproximar o marido, Lourenço, da enteada. Conhecida pela trajetória na comédia, Samantha diz que se emocionou quando foi convidada pelo diretor Luís Pinheiro para participar da obra. “É uma honra. É um roteiro muito humano, muito delicado, muito sucinto e profundo ao mesmo tempo. Marca um capítulo muito importante para a minha carreira, só tenho a agradecer.” O elenco, que, desde a primeira temporada, conta com Linn da Quebrada, Paulo Miklos, Gero Camilo, Thomás Aquino, Clodd Dias, Isa Ordoñez e Clebia Souza, se enriquece ainda com as participações de Ney Matogrosso e Elisa Lucinda.
Família e independência
As muitas maternidades possíveis continuam sendo o eixo central de Manhãs de Setembro, principalmente a partir da experiência de Cassandra, como conta Liniker. “Essa maternidade parte do ponto do impossível, se tratando de uma mulher trans. Na primeira temporada, chega esse filho à procura de um pai, encontrando uma mãe. Para mergulhar nisso e entender como é acolher uma criança tão necessitada e afetiva como o Gersinho, precisei mergulhar na minha família e entender meu pai, que me abandonou na infância, minha mãe, que me criou sozinha, e como essa personagem poderia colaborar com o crescimento do Gersinho. A série me acendeu essa vontade de criar, de ser mãe, de, a partir de um afeto, me ver transformada”, revelou a atriz e cantora.
Em contraponto, há Leide, a outra mãe de Gersinho, que está exausta da maternidade, principalmente em uma vida materialmente precária. “Ela vive o desespero da solidão e por isso tenta se enfiar na vida de Cassandra. Meu desafio era experimentar essa maternidade da Leide, que é completamente diferente da minha… Ela é toda errada, mas tem esse amor enorme pelo filho e é capaz de fazer o que seja por ele. A Leide está me ensinando a me sentir menos culpada do que me sinto normalmente. Ela erra muito, mas consegue levantar, sacudir a poeira e tentar de novo, de novo e de novo”, revela Karine Teles.
O conflito entre as obrigações e afetos familiares e o desejo de independência é outro tema pungente em Manhãs de Setembro. No momento em que realiza o sonho de ter um teto todo seu, alugando uma kitchenette, Cassandra se vê rodeada de obrigações maternais e perrengues financeiros. Enquanto a personagem vai se reconectando, pouco a pouco, com os laços de família (tanto os biológicos quanto os da família escolhida), a voz de sua ídola, a cantora Vanusa, ressoa em sua cabeça, cobrando essa independência absoluta. O desafio maior de Cassandra é encontrar esse equilíbrio. E, como diz a letra de Milton Nascimento, seguir pela vida, tendo muito o que viver.