Jennifer Garner fala a CLAUDIA sobre “Dia do Sim”, novo filme da Netflix
Uma vez por ano, a atriz serve para os filhos sorvete no café da manhã. É o dia do sim, tradição que virou roteiro. Ela fala de pandemia e maternidade
Num dia especialmente frio do inverno norte-americano, em janeiro, uma figura de camisola xadrez, daquelas de vovó, bem compridas, e pantufas de pelo apareceu na tela do meu celular escalando uma banqueta na cozinha para alcançar uma prateleira alta do armário.
Tamanho estranhamento me fez parar de rolar o feed do Instagram para reconhecer quem teria postado aquele vídeo. Era ninguém menos do que Jennifer Garner, que, aos sussurros, contava que iria fazer biscoitos amanteigados para seus filhos.
Nos minutos seguintes, ela misturou ingredientes, cantou e dançou enquanto esperou os biscoitos assarem. Era mais um episódio de “Pretend Coooking Show”, ou programa de culinária de mentirinha, numa tradução bem fiel, um quadro que a atriz de 48 anos inventou para mostrar aos seguidores os pratos que ela faz em casa.
Jen nunca foi uma gênia da cozinha. Aliás, ela assume que, nos primeiros anos, era um desastre. “Mas eu amo programas de culinária. Martha Stewart e Barefoot Contessa são minhas favoritas. É o que eu assisto quando preciso relaxar e também quando um dos meus filhos está doente e passamos o dia na cama”, diz ela, se referindo às populares apresentadoras norte-americanas.
Aos poucos, foi absorvendo técnicas e se aventurando. A autoconfiança cresceu a ponto dela preparar pães diversos em vídeos postados durante a quarentena – gente como a gente.
O mais incrível, contudo, não são as receitas, mas o jeito despojado e acolhedor da atriz. A impressão que fica é que ela é sua amiga. A sensação só se confirmou na chamada por telefone feita com CLAUDIA para falar de Dia do Sim, filme que ela lançou agora pela Netflix.
Jen responde às perguntas com sinceridade e emoção. Ser blasé não tem nada a ver com ela. Talvez more aí o segredo dos quase 30 anos de carreira sem nenhuma grande crise de imagem – até o divórcio com o ator Ben Affleck, em 2018, foi pacífico.
Para quem não se lembra, o grande estouro da atriz foi em Alias – Codinome Perigo, série de J. J. Abrams sobre uma espiã internacional. Foram cinco anos interpretando Sidney Bristow e encarando cenas de luta e ação, habilidade que ajudou Jen a conquistar o papel de Elektra, a super-heroína que apareceu primeiro no filme Demolidor, onde conheceu o futuro marido.
Jennifer diversificou o currículo participando de outros sucessos de público, como De Repente 30, Juno e Clube de Compras Dallas. Lançou praticamente um filme por ano desde que começou, além de assumir funções de produtora vez ou outra.
“Fico envergonhada de falar, mas meus filhos não sabiam lavar um banheiro antes do isolamento. Eu passei a confiar neles para tarefas da casa”
Sua mais recente empreitada nesse cargo é em Dia do Sim, uma ideia que não existiria sem suas experiências como mãe de Violet, Seraphina e Samuel, de 15, 12 e 9 anos, respectivamente. É que há nove anos, após ler um livro infantil homônimo, escrito por Amy Krouse Rosenthal, ela instituiu uma data em sua casa em que não negaria nenhum pedido dos filhos. “Mas não fica tão selvagem quanto no filme”, alerta. “O que nunca falta é sorvete no café da manhã, acampar numa barraca no quintal e usar fantasias”, diz ela.
A trama toda começa porque Allison Torres, a mãe interpretada por Jen, está cansada de ser considerada a chata da família. Na ficção, ela perde um pouco o controle dos acontecimentos. Em uma das cenas, passa por um lava-rápido, daqueles com jatos de água e escovões, com os vidros do carro abertos.
“Eu consigo 100% me conectar com essa mulher. Quando você está tentando levar todo mundo de casa para a escola, alimentado, com a lição feita, sem esquecer o equipamento da aula de futebol, manter controle dos check-ups médicos, fazer as compras e cuidar da casa, fica difícil ainda ser divertida e despojada. É muito pra dar conta. Aí falam que mulher é rígida ou fria. Isso é misoginia. Gostei que endereçamos isso no filme, porque o marido, Carlos, interpretado por Édgar Ramírez, vê que não há equilíbrio e se propõe a mudar sua atuação dentro de casa”, desabafa a atriz.
Falando em tarefas, a pandemia foi uma virada de chave no lar dos Garner. “Fico até envergonhada de falar, mas meus filhos não sabiam lavar um banheiro antes do isolamento. Eu passei a confiar mais neles para fazer parte do processo da casa”, revela a atriz, que conta ter descoberto o conceito da negligência benigna. “É uma teoria séria, mas eu basicamente ignoro meus filhos algumas vezes para que eles possam aprender coisas sozinhos”, diz a atriz sem conseguir segurar o riso.
Apesar de ser uma mãe sem dificuldade de dizer não, Jen assume que nem sempre foi tão fácil manter a assertividade em questões de trabalho ou em outras relações. “A maturidade me trouxe mais intimidade com recusas. Outro dia, uma amiga me ligou e me chamou para participar de um projeto. Eu fiquei animada, porque a ideia é incrível e seria muito bacana trabalhar junto com ela, porém, depois de ler o roteiro, falei: ‘Acho que esse papel não é para mim, você deveria levá-lo a outras atrizes’. Há alguns anos, essa ligação teria me destruído. Hoje, consigo fazer isso com tranquilidade. Entendi que, da mesma forma que sou recusada em testes, posso dizer não a ofertas”, explica.
Mas Jennifer Garner é rejeitada com tanta frequência? “O tempo todo! Essa carreira é uma destruidora de corações!” Para dar conta das decepções e não desistir, Jen criou um método. Quando recebe um não, ela foca em outra coisa no dia, uma pequena vitória, como uma conversa com os filhos ou um colega se dando bem. “Desde bem cedo estabeleci que não deixaria apenas a minha profissão me fazer feliz ou infeliz”, explica.
Mesmo bem-resolvida com o mundo do entretenimento, há algum tempo, a atriz tem variado suas atividades. Desde 2017, é sócia e chief brand officer (algo como chefe de marca) da Once Upon a Farm, empresa de comidas orgânicas e saudáveis para grávidas, lactantes e crianças até 5 anos.
Em um ano de sua participação, o negócio cresceu dez vezes. Fora a venda, a marca participa de um programa do governo para levar comida a pessoas em situação de vulnerabilidade. “Nós, mães, precisamos umas das outras. Criar filhos sozinhas é duro demais. A comunidade colabora demais. E isso pode aparecer em um grupo da sala do filho quando uma mãe diz pra outra que tudo bem ter tido dificuldade na lição de matemática até iniciativas como essa que garantem que mães pobres consigam alimentar seus filhos”, defende ela.
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