Por que “Emily in Paris” foi parar em escândalo do Globo de Ouro
Viagens luxuosas, festas exclusivas e salários altos estão entre as acusações contra a associação responsável pela premiação
Vamos falar de Globo de Ouro, mas, por um momento, esqueça a pompa do tapete vermelho, as estatuetas e os discursos emocionantes, porque o assunto é embaraçoso. No último domingo (5), o jornal Los Angeles Times publicou uma reportagem com uma série de acusações de atos irregulares da Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPQ), instituição responsável pelas indicações e premiações da cerimônia.
Para quem não está familiarizado com o Globo de Ouro, ela é uma das principais premiações de cinema e TV dos EUA e a 78ª edição acontecerá no próximo domingo (28). A escolha dos finalistas é feita por 87 jornalistas de diversas nacionalidades, que são coordenados pela HFPQ.
O caso veio à tona a partir de um desentendimento da jornalista norueguesa Kjersti Flaa com a associação. Segundo Flaa, a HFPQ alimentava uma “cultura de corrupção” por impedir o ingresso de especialistas, como ela, no comitê de avaliadores, que receberiam “milhares de dólares de estúdios, canais e celebridades para quem eles entregam os prêmios.” Os regalos seriam a moeda de troca pelo silêncio dos possíveis infratores.
A acusação da jornalista foi julgada como improcedente por um juiz federal em novembro do ano passado, porém a história não foi esquecida. “Achei que o processo fosse mexer nas coisas. Somos uma organização arcaica e a Associação de Imprensa precisa de pressão externa para se transformar”, disse um membro da HFPA em depoimento anônimo para o veículo.
“Quando você pensa que é um grupo tão pequeno que toma as decisões, é assustador. Mas o verdadeiro problema é que os estúdios precisam deles. O Globo de Ouro é o evento mais importante antes do Oscar”, informou outra fonte da associação sem revelar a identidade.
Quais são os atos irregulares cometidos?
Com a possível desculpa de analisar os bastidores das produções, jornalistas da HFPA seriam presenteados com viagens luxuosas em hotéis com diárias de mais mil dólares, festas exclusivas com estrelas do cinema e da TV e jantares na conta dos produtores de Hollywood.
Outra fonte de dinheiro para os membros da associação é contrato da premiação com a emissora NBC, que transmite a cerimônia. De acordo com a reportagem, em 2020, os jornalistas receberam 27,4 milhões de dólares, aproximadamente 150 milhões de reais pela atuação no prêmio.
E não para por aí! Para assistir aos filmes, os 24 membros recebem individualmente cerca de 19 mil reais, que são somados aos 17 mil reais para oito artigos escritos para o site da Associação.
A quantia exorbitante foi atenuada pela associação com a adoção de práticas de solidariedade, como a abertura de bolsas de estudo voltadas para cursos de arte e cinema.
“Associações como essa existem para benefício da indústria e não para benefício dos membros”, alertou o advogado Douglas Varley para o jornal. Assim como ele, Daniel Kurtz, advogado especialista em instituições sem fins lucrativos, como a HFPA, entende que o cenário financeiro da premiação é incomum.
“Às vezes, faço piadas com produtores sobre quanto custaria para comprar uma indicação ao Globo de Ouro”, respondeu um especialista em marketing do Oscar.
Bola fora
A indicação de Emily em Paris, série da Netflix, a duas categorias é vista como um exemplo dessas acusações de luxos em troca de nomeação para o prêmio. Segundo o veículo, em 2019, 30 integrantes da Associação visitaram o set de gravação da série em Paris com direito à hospedagem em hotel cinco estrelas.
Do outro lado, sem denúncias de regalias para os membros, está a série I May Destroy You, da HBO, de fora das indicações mas prestigiada pela crítica.
“Mas no final, todo mundo adora ganhar um prêmio, e com todo o dinheiro e exposição que aparecem com algo dessa magnitude, se torna uma bola de neve que você não consegue impedir”, afirmou outra fonte da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood.