“Muito bom para ser verdade” ou “Muito bom e é verdade?”
Quanto tempo a gente perde na vida sem se permitir aproveitar o que está bom porque temos medo de que aquilo vai acabar?
Há dois meses, eu e meu marido, Thiago Arruda, estamos conduzindo um novo grupo na nossa jornada de autoconhecimento chamada “Novos Caminhos – como usar o corpo para hackear a mente”. Temos encontros bimestrais presenciais, áudios e exercícios semanais passados através do celular e, a cada mês, uma roda de conversa online ao vivo com os participantes.
Ao todo são aproximadamente 30 pessoas e, na nossa última conversa, fiquei impressionada com a quantidade de gente que questionou se estava fazendo os exercícios corretamente:
– “Não sinto dor e acho que estou fazendo alguma coisa errada”
– “Quando parou de doer, parei de fazer porque achei que não estava mais funcionando”
Estas foram algumas das frases dos participantes. E aí te pergunto: por que a gente valoriza tanto a dor como um balizador de que estamos no caminho certo?
O exercício da academia só vale se os músculos ficam doloridos depois, o dinheiro só é merecido se veio com muito esforço, o relacionamento só é bom se a gente sofre, a balada só tem sentido se eu me acabo de dançar e desmaio na cama depois.
“No pain. No gain”.
Por outro lado, também ouvimos de algumas pessoas alguns depoimentos do tipo:
– “Eu estava com muitas dificuldades com meu parceiro e agora as coisas começaram a melhorar. Mas sinto medo porque sei que o que está bom deve acabar logo, não vai durar”
– “Há muito tempo estava procurando um novo relacionamento, mas não queria qualquer pessoa. Queria O CARA. Agora ele apareceu e tá bom demais para ser verdade”
E aqui deixo outra pergunta: por que não trocar o “ é bom demais para ser verdade” por “é muito bom e é verdade”?
Quanto tempo a gente perde na vida sem se permitir aproveitar o que está bom porque temos medo de que aquilo vai acabar?
Não é preciso ter medo porque a real é: vai acabar sim. O momento vai passar, você aproveitando ou não. A única diferença é que, se você aproveitar, vai poder ter o registro, a memória. E a cada vez que faz isso, você ganha mais referências de como ser feliz. A felicidade também é uma habilidade que se treina.
A natureza das nossas emoções e das nossas sensações é transitória, ou seja: elas não duram para sempre, nos atravessam como ondas, mudando a temperatura, a agitação e, às vezes, até a cor do nosso oceano. Se você tentar freá-las, o máximo que pode conseguir é um bom caldo que te levará para uma profundidade escura onde talvez falte ar e sobre ansiedade.
E se você ainda está presa no “é muito bom para ser verdade” ou no “nada é tão ruim que não possa piorar”, não se culpe! A humanidade tem uma longa trajetória de viés de negatividade – vivemos muitos e muitos anos lidando com ameaças e perigos reais – como ataques de animais ferozes, guerras entre tribos rivais e falta de comida. Nosso cérebro “evoluiu” para se proteger e virou expert em prever acontecimentos negativos.
Infelizmente, ainda há muita gente no planeta que convive com inseguranças e violências inadmissíveis de diversos tipos no dia a dia. Mas também há uma parcela imensa de pessoas que, apesar de não terem ameaças palpáveis no cotidiano, carregam na mente o tempo todo o medo de que algo ruim aconteça.
Eu não te conheço, mas te peço um favor. Respire fundo e responda sinceramente para você mesma: na maior parte do tempo em que você se preocupa há MESMO algo errado acontecendo? Ou existe “só” o medo de que algo vá acontecer?
Na minha opinião, uma das coragens mais profundas que cada uma de nós, que cada um de nós, precisa ter é a de elevar nossos pensamentos e nossas emoções acima do nevoeiro do medo, conseguir, de verdade, ter a esperança de que a vida seja boa e fique ainda melhor. Isso começa quando a gente se permite aproveitar aquilo que já está gostoso. E não é fácil porque – de verdade – quem consegue fazer isso está remando contra uma maré poderosa e brutal conduzida intencionalmente – ou não – por todas as outras pessoas do planeta que vibram na energia do medo.
Mas de que lado você quer ficar? Eu tenho feito uma escolha diária por um novo caminho em que a paisagem me assusta menos, tem mais cores, mais alegria, mais luz e mais milagres cotidianos. Estive no Peru no mês passado, e lá eles usam uma palavra que eu adoro: Desfrute! É como um convite para um dia de delícias! Os meus receios ficam menores quando me permito desfrutar da história que leio para meus filhos à noite, quando sinto o sabor de uma refeição feita sem celular, quando minha pele é tocada por um raio de sol, quando o vejo o céu rosado do outono, quando sinto meu corpo aconchegado em quem amo.
Estou lendo o terceiro livro de uma grande amiga que não está mais aqui com a gente, a Ana Michelle Soares, Entre a lucidez e a esperança” Ana Mi morreu em janeiro, mas segue viva em suas sábias palavras: “O dicionário define milagre como ‘acontecimento inexplicável, formidável, estupendo’ e, sendo assim, ele só existe para quem o sente. Não sei explicar a beleza de um pôr do sol…nem a satisfação de um abraço apertado cheio de amor… O único milagre que não se realiza é aquele que você não enxerga. Porque, acredite, a vida pode ser extraordinariamente estupenda quando aprendemos a sentir que tudo pode ser milagre.”
É tão bom ler isso e é tão verdade que, para acabar, quero te fazer a pergunta que a Ana Mi faz no livro:
“Qual foi o seu milagre de hoje?” Como meu dia está começando, vou ali atrás de alguns milagres e volto no mês que vem!
Espero te encontrar cheia de milagres também.