Por que devemos ter mais mulheres no poder?
A presença feminina em espaços de destaque sempre foi tolhida. Agora, temos a chance de começar a mudar essa história
A Rainha Elizabeth II (1926-2022) talvez tenha sido o maior exemplo contemporâneo de uma figura feminina num lugar de poder. Entre tantas coisas, cuidou com esmero de um Reino Unido devastado pelo pós-guerra. Apesar de feitos questionáveis, um ponto deve permanecer: ela abriu caminhos.
Antes dela, vieram outras. Quando penso em política, gosto de conjecturar Cleópatra, egípcia que governou em um período conturbado, mantendo seu povo unido. Exaltada como deusa, escreveu dezenas de livros — queimados no incêndio da Biblioteca de Alexandria — e estudou medicina e a ação curativa das ervas, além de astronomia, astrologia, história, economia e diplomacia internacional. Poliglota, dominava o latim, o grego antigo e os hieróglifos. Apesar de grande líder e mulher erudita, foi marcada como sexualmente depravada, que mantinha seu poder pela sedução.
O suposto descontrole emocional e sexual das mulheres é a coluna espinhal do sustentáculo patriarcal. Às mulheres, a história reservou o lugar de tuteladas. Tuteladas pelos homens que as salvariam da “loucura”. Àquelas que ousaram desafiar, a fogueira, na Idade Média, foi o destino.
“Hereges”, “bruxas” questionaram as imposições de um tempo no qual a mulher deveria falar pouco. O Malleus Maleficarum — compêndio de normas que autorizou o assassinato de milhões — previa, por exemplo, que “elas são naturalmente mais impressionáveis e, portanto, mais maleáveis ao diabo. São faladoras e não conseguem deixar de transmitir os seus conhecimentos sobre magia”. A pena para as que “falavam demais” era a tortura. Para além da fogueira, havia afogamento, empalamento, entre outras práticas.
Nestas eleições, garantir o acesso das mulheres à política é simbólico
Izabella Borges
Mas note que a fala é o ato simbólico do poder. Quem fala, expressa. Angaria público, rompe padrões. Na contemporaneidade, as mulheres que ousam falar e ocupar espaços públicos seguem perseguidas. Seja ao modo medieval, com o ceifamento de suas vidas — como aconteceu com Marielle Franco e quase o foi Cristina Kirchner, salva por uma arma que falhou no disparo —, seja por métodos já muito naturalizados. Esses, baseados em uma cultura que insiste em manifestar o ódio às mulheres, em silenciá-las, como ocorreu com a vereadora Katyane Leite na Câmara Municipal de Pedreiras, no Maranhão, que teve o microfone violentamente arrancado de suas mãos por duas vezes pelo vereador Emanuel Nascimento, enquanto expunha seu ponto de vista.
Exemplos não faltam. Simone Tebet, durante a CPI da Covid-19, foi chamada de “descontrolada” por Wagner Rosário. Lembremos, ainda, de Isa Penna, cujo corpo, projetado como disponível às satisfações sexuais masculinas, foi apalpado em plena sessão na Alesp.
Nestas eleições, garantir o acesso das mulheres à política é simbólico. Em um país com 80% do poder legislativo preenchido por homens, eleger mulheres é mais que um dever, é uma revolução. Que manifestemos nossas vozes nas urnas para que outras possam ecoá-las em espaços de poder. Que busquemos a verdadeira representação: até quando permitiremos que eles, e entre eles, decidam os rumos da política brasileira? É hora de agir.