Bruna Lombardi: “Eu nunca fui uma menina boazinha”
Em seu novo livro, 'Manual Para Corações Machucados', atriz, escritora e ativista reflete sobre sentimentos, rebeldia e cura para corações partidos
Sentir um aperto no peito, nó na garganta ou embrulho na boca do estômago são algumas das manifestações viscerais de uma desventura difícil de escapar: o coração machucado.
Seus batimentos podem até seguir a cadência normal, mas quem está atento aos sentimentos logo faz o diagnóstico. “É dor de amor”, dizem. Aos 71 anos, a atriz, poeta, escritora, apresentadora, roteirista, produtora de cinema e ativista ambiental Bruna Lombardi faz questão de discordar.
Às vezes o coração empedra.
Endurece como se uma argamassa de dor e raiva misturadas virasse cimento.
Um cimento que secou cheio de marcas,
de quem não prestou atenção e pisou em cima, riscou, fez um estrago.
Empedrou e agora ninguém mais repara nisso.
Amor machuca, a gente sabe,
mas sabe de um jeito errado porque o que machuca é o avesso do amor.
É o desamor, a falta, a ausência dele. O lugar onde ele não existe.
É dessa forma poética e ao mesmo tempo objetiva que Bruna descreve o que todos já experimentamos na crônica “O avesso do amor”, uma das mais de oitenta que compõem o encantador Manual Para Corações Machucados, recém-lançado pela Sextante.
“As pessoas acreditam que a defesa é o enrijecimento, mas ele quebra a pessoa porque cria um corpo duro”, me disse ela em sua casa em São Paulo, entre esculturas de pedra e luminárias de cristal translúcido.
Numa brincadeira de extremos, vestida com um vestido fluído de estrelinhas, Bruna defende de novo o oposto. “A flexibilidade faz você compreender o quanto somos maleáveis, o quanto a gente precisa se dobrar. E aí você descobre: um novo mundo se descortina quando você não se fecha.”
Sem passar por cima das cicatrizes alheias, dando contorno às nossas emoções ao partilhar um tanto das suas próprias, a autora faz uma constatação: “Se o coração não estiver aberto, ele não se cura”.
No dia dessa conversa e da sessão das fotos que integram essa reportagem — sim, Bruna Lombardi é tão bonita pessoalmente quanto idealizamos, convém saciar essa sua curiosidade natural, leitora —, ela já começava a sentir sintomas de uma virose que a faria cancelar e reagendar na sequência alguns dos eventos de divulgação do livro.
A rotina puxada e cheia de compromissos não é novidade para a artista que começou a trabalhar ainda adolescente e desde então nunca parou. “Tenho muito trabalho, muita viagem, muito avião, enfim… Nem conheci outra vida”, conta.
“Milhões de vezes na minha rotina estou exausta.” Trata-se de um cansaço do corpo, cuidado com descanso, aquietamento, meditação, alimentação saudável.
“Já esse outro tipo de exaustão, o desânimo e a perda de interesse, esse eu nunca deixei entrar na minha vida. O que me salva é o encantamento, um estado de comunhão com a natureza. Depende de como você quer olhar, por isso que eu trabalho nas redes sociais todos os dias falando de felicidade e amor”, afirma, com vitalidade.
O sentimento que fala
Criadora da plataforma digital Rede Felicidade, Bruna desfaz preconceitos com a firmeza da suavidade. “Me falavam que felicidade era uma palavra tão gasta. Assim como amor, não tem palavra mais gasta no mundo. Agora, olha que engraçado a gente achar piegas a felicidade e o amor, e achar normal o ódio, a vingança, essas coisas que predominam no mundo.”
Longe de qualquer visão ingênua, o que essa ativista quer é inspirar outras pessoas a cooperarem pela transformação: “O amor é TÃO mais poderoso, só que a gente ainda não acredita, ainda não sabe usar”.
Suas vivências com essa “força física do universo”, como ela descreve o amor, começaram com uma saudável rebeldia. “Eu nunca fui uma menina boazinha, era cheia de ideias, temperamentos, questionamentos… Nunca fui obediente! Não saía aceitando todas as regras. Mas sempre fui uma pessoa do bem. Nunca abri mão de valores básicos.”
Na união com o ator Carlos Alberto Riccelli, com quem é casada desde 1978, sempre esteve presente uma proposta de crescimento e de busca maior, junto com a paixão.
“Temos essa coisa paradisíaca que sempre nos cercou, mas ao mesmo tempo somos muito práticos. A gente não fica só no sonho, tem uma ação.” Isso vale para a criação do filho, Kim, e também para o plantio de uma árvore no seu quintal, de onde será colhido um fruto desejado depois.
Usar as próprias mãos para confeccionar objetos de arte ou escrever com a caneta em um de seus muitos cadernos são algumas das atividades diárias que servem como antídoto para a superficialidade e o imediatismo — você não verá Bruna postando seu dia a dia nas redes sociais, por exemplo, buscando algum escapismo.
“São muitas urgências, as pessoas estão sendo jogadas de um lado para o outro, sem saber direito o que que é importante. Você tem que ter discernimento”, compartilha.
Como agir, então? “Eu gosto de pegar qualquer momento disponível e transformar num encontro. Eu estou aqui conversando com você, que seja um encontro. Que exista esse momento, que ele tenha fundamento, uma importância para nós. Isso é viver.” A presença e as palavras de Bruna são remédio para qualquer desamor.