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Sabia que compulsão por comida é doença?

Veja o depoimento da jornalista que descobriu que comer sem controle é compulsão por comida, um tipo de doença. E lá foi ela descobrir qual era o tratamento

Por Redação M de Mulher
Atualizado em 15 jan 2020, 18h51 - Publicado em 7 ago 2013, 21h00
Reportagem: Sílvia Amélia de Araújo (/)
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Estima-se que 1,5% das população sofra de transtorno da compulsão alimentar periódica
Foto: Getty Images

No começo do ano, acordei uma madrugada com dores fortes no estômago que se espalhavam por todo o tórax e abdômen. “Estou morrendo!”, pensei. Igual ao meu pai, que, ainda jovem, acordou com um infarto fulminante. Fui para o hospital de ambulância. E descobri que a causa do meu mal-estar era bem simples: eu comi demais. Pelo que me lembro, foram uma bandeja de comida japonesa, um pastel frito, um brigadeirão, um quindim, três pedaços de pizza, mais de 1 litro e meio de Coca-Cola… Em duas horas! Tinha ido dormir com ânsia de vômito, como em tantas vezes. Mas dessa vez a vergonha de estar no hospital por não saber a hora de parar me fez refletir que algo não ia bem. Pesquisando, descobri que esses ataques de comer sem controle têm um nome. O transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP) é uma doença que só neste ano foi catalogada de forma definitiva pela Associação Psiquiátrica Americana. A pessoa com TCAP come um volume de comida absurdo em um curto intervalo de tempo, ao menos duas vezes por semana. Estima-se que 1,5% da população sofra disso, e os sintomas surgem geralmente entre os 20 e os 30 anos. “São os anos em que estamos expostos a situações mais estressantes se comparados a outras épocas da vida, como formatura, busca pelo mercado de trabalho, casamentos, filhos…”, diz o psiquiatra Alexandre Pinto de Azevedo, coordenador do Grupo de Estudos em Comer Compulsivo e Obesidade (Grecco). “O estresse, em uma pessoa geneticamente predisposta, é um possível gatilho dos sintomas.” Além da herança genética, também podem estar relacionados à causa do TCAP a alimentação da mãe quando grávida, hábitos alimentares da família e outras doenças psicológicas, como transtorno bipolar e depressão. As consequências do comer compulsivo são baixa autoestima (você sente nojo de si mesma), problemas gástricos, alterações nos níveis de glicose e colesterol e, obviamente, obesidade. Fiz dieta achando que assim me curaria, mas fracassei. E descobri que perder peso é só uma consequência de uma série de mudanças que um compulsivo precisa enfrentar.

Malhação

Minha primeira tentativa foi me exercitar. Passei a nadar todo dia. E aí minha voracidade triplicou! Malhar faz bem, sim, para compulsivos. Mas tem que começar devagar. “O problema é que eles costumam ver a vida na base do `tudo ou nada’”, me disse a psiquiatra Mireille Coelho, do Programa de Atenção aos Transtornos Alimentares da Unifesp. E aí exageram na dose.

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Dieta restritiva

A atitude mais desastrosa que uma compulsiva pode tomar para se controlar é fazer uma dieta restritiva. Eu tentei seguir a dieta Dukan com o meu namorado. Ele emagreceu 10 kg e eu perdi 3 e engordei 4. Ele não é compulsivo e achou fácil deixar de comer várias coisas. Eu só pensava obsessivamente em devorar tudo o que era proibido. E devorei!

Ajuda médica

Fiz uma consulta com o endocrinologista Alfredo Halpern. Ele me animou (“Com o tratamento, as pessoas ficam mais felizes e emagrecem”) e me desanimou (“Não tem cura, precisa estar sempre atenta”). Mas foi o caminho certo: o diagnóstico e o tratamento do TCAP devem ser feitos por um endocrinologista ou um psiquiatra, e não por um nutricionista.

Observe seus hábitos para se controlar

Diário da compulsão

O primeiro passo do tratamento é descrever tudo o que se come, os horários, os sentimentos antes e depois de comer e a situação em que comeu (à mesa, em pé, no computador…) e se foi por compulsão ou não. Sim, é chato! Mas é a técnica mais eficiente. Na primeira semana, nunca conseguia anotar tudo. Se comia um chocolate, deixava pra começar de novo no dia seguinte. Mas depois que engatei descobri muita coisa. Por exemplo: tenho vontade de comer compulsivamente não só quando estou ansiosa mas também quando me sinto entediada ou quando estou muito feliz. Em três semanas anotando, tive apenas uma crise de compulsão.

Pontos de fuga

O gatilho de um episódio de comer compulsivo é semelhante ao do alcoólatra quando tem uma recaída. “Você sabe que aquilo vai te arrebentar, mas naquele instante acredita que vale a pena e faz,” diz Alfredo Halpern. Depois, se arrepende e sofre. Para se controlar, é preciso identificar a aproximação desse “espírito do descontrole”. E encontrar algo prazeroso que ajude a fugir dele. Nessa hora, ver um filme, ler um livro ou ouvir músicas animadas têm me ajudado muito.

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Tudo na sua hora

“Meu amor, não coma Doritos no café da manhã.” É assim que meu namorado se despede de mim antes de viajar. Ele sabe intuitivamente que essa é uma das regras pra começar a disciplinar um compulsivo (sem reprimi-lo com restrições severas): definir um horário pra cada alimento. Ou seja, você não está proibida de comer nada, desde que seja na hora certa. Acordou e viu que tem pizza na geladeira? Nem ouse! Quando voltar pra casa, você pode comê-la no jantar. Jantou e ainda está com fome? Pode repetir. Mas não vá encher uma tigela de sucrilhos com leite, pois isso é do café da manhã. Internalizar essa regra melhorou um pouco minha alimentação.

Alguém vai ter que ceder

Para aprender a se controlar, tenha um pouco (bem pouco!) do alimento que desperta mais a sua compulsão, mas que você não quer deixar de comer. A advogada Fernanda Scaletscky, 26 anos, que eu conheci no Vigilantes do Peso, já comeu 16 bombons seguidos. Atualmente ela come um por dia e compra só dois ou três de cada vez. “Claro que não vou comprar uma barra. Porque depois de abrir vai ser impossível não comer tudo”, disse. Também quero um dia conseguir ter esse autocontrole. Por enquanto, ainda não consegui.

Menos e com mais calma

Comer devagar e deixar sobrar são duas orientações importantes, mas dificílimas de serem seguidas por um compulsivo. Eu acabo de comer e as pessoas em volta ainda mal pegaram no garfo. Uma sugestão é tentar mentalizar uma música bem calma e mastigar no ritmo. Tentei e funciona. Mas deixar sobrar comida no prato, depois que estou saciada, é muito complicado. Acho que só conseguirei resolver isso com terapia. A solução recomendada pelo médico, por enquanto, é servir porções menores (ou até usar um prato menor).

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Dieta que faz sentido

A dieta dos pontos (desenvolvida há mais de 40 anos por Alfredo Halpern) é uma das poucas que realmente ajudam o compulsivo a emagrecer. Quem entra nessa tem que anotar (e de preferência planejar) os pontos correspondentes ao que consome em cada refeição. E tem liberdade pra comer de tudo. Mas, de novo, haja anotação! Sabendo disso, decidi participar de reuniões do Vigilantes do Peso, que também usa os pontos como método. Sempre tive preconceito – achava que as pessoas ficavam bitoladas contando pontos. Mas os encontros semanais são divertidíssimos! Todo mundo faz piada sobre seu desejo de comer e sobre “aqueles magros que não ligam pra comida”. Me senti em casa! “O Vigilantes pode ajudar um compulsivo a reeducar sua alimentação e manter a motivação durante o emagrecimento. Mas o diagnóstico de compulsão só pode ser feito por um médico”, ressalta Michelle Bento, nutricionista do grupo.

Trabalho em grupo

Também fiz minha inscrição no Programa de Atenção aos Transtornos Alimentares (Proata) da Unifesp. Após preencher uma ficha, você passa por uma triagem que define o tipo de tratamento mais adequado – em grupo ou com psicoterapia individual (quando o paciente tem outras questões psicológicas relacionadas à sua compulsão). O contato do Proata é proata@psiquiatria.epm.br, (11) 5576-4990 (ramal 1338). O Instituto de Psiquiatria da USP tem o mesmo serviço grátis. No site do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares há uma lista de outras instituições da área.
 

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