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Modelos denunciam casos de racismo na indústria da moda

Nas redes sociais, as profissionais expuseram episódios de discriminação sofridos em castings, desfiles e ensaios

Por Colaborou: Gabriela Teixeira
Atualizado em 11 jun 2020, 14h29 - Publicado em 11 jun 2020, 10h00

Discussões sobre a falta de diversidade no mundo da moda não surgiram agora. Há anos se debate a manutenção da exclusão de corpos e cores que não se encaixam nos padrões eurocêntricos, mas as mudanças nos circuitos fashion parecem caminhar a passos de tartaruga. Exaustas das situações de racismo enfrentadas na moda brasileira e impulsionadas pela força crescente do movimento Black Lives Matter, as modelos Thayná Santos, Natasha Soares, Diara Rosa, Cindy Reis e Cami Simões começaram, no último fim de semana, a expor episódios de discriminação sofridos por elas e outros colegas de profissão em castings, desfiles e ensaios.

Entre as marcas denunciadas chama atenção o número de relatos de atitudes racistas por parte dos estilistas Glória Coelho e Reinaldo Lourenço, que haviam se manifestado a favor da comunidade negra durante as ações do #BlackOutTuesday. Em um destaque no seu perfil do Instagram, Thayná reuniu mensagens que contavam as terríveis experiências vividas em trabalhos com os dois. Mas eles não são os únicos.

(Reprodução/Instagram)
(Reprodução/Instagram)
(Reprodução/Instagram)

“Uma coisa muito comum são cabeleireiros e maquiadores que não sabem lidar com o nosso cabelo e pele. Isso os frustra a ponto de nos colocarem inúmeros defeitos, dificultando bastante o trabalho”, contaram elas em entrevista à CLAUDIA. E não para por aí. O cachê de modelos negros é bem menor que o de brancos. Comentários racistas sobre corpos negros e falas sobre o tamanho de bocas, narizes, bundas e até a pigmentação da pele são normalizados. Entrando no âmbito do colorismo, muitos profissionais da moda tratam o negro de pele mais clara como branco demais para ser negro e negro demais para ser branco.“Geralmente somos vistos como estepes, aquele profissional que está ali só pra dar uma enfatizada no marketing da empresa, validando o selo da diversidade em público. Nos bastidores, porém, a história sempre é outra.”

A repercussão das denúncias escancarou os problemas de longa data. Ajudando a ampliar as vozes das modelos, Paulo Borges, criador do São Paulo Fashion Week, as convidou para participar de uma live em seu Instagram. Durante a transmissão, que pode ser assistida no perfil do empresário, Natasha contou como muitas vezes precisou deixar a dignidade de lado durante um trabalho. As jovens relataram a CLAUDIA que quase sempre precisaram ficar caladas durante situações de racismo para não perderem um job. “Somos ensinados que não importa o que o cliente diga, ele está te pagando, logo ele é quem tem razão. Nos calamos porque precisamos do dinheiro e porque sabemos que, caso haja uma reclamação relacionada a racismo de nossa parte, a agência não fará absolutamente nada. Somos nós por nós, e quando se é o lado mais fraco da corda, não há o que se possa fazer.”

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Sem contar com sindicatos ou entidades que as auxiliem a formalizar as denúncias, as modelos precisam agir de forma independente. Falta amparo das agências, que “preferem esquecer o acontecido e garantir que o cliente não deixe de os contratar”, colocando o dinheiro acima da humanidade e da saúde mental do profissional de moda. Desde que elas começaram a expôr os casos de racismo, aliás, algumas marcas chegaram a procurar suas agências, numa tentativa de abafar as manifestações. Para reverter a questão da falta de suporte, as modelos criaram o “Pretos na Moda”, um movimento de apoio ao profissional da área. No Instagram (@pretosnamoda_), pretendem manter uma plataforma que fornecerá orientação, suporte e também informação a todos que passarem por atos discriminatórios na indústria.

Na prática

Também durante a live com Borges, Natasha apontou que o sistema de cotas de 10% em desfiles não é suficiente para garantir representatividade em um país onde a população negra ultrapassa os 53% de sua totalidade. “Negros, indígenas e asiáticos nem deveriam ser cota, somos a realidade nesse país e representamos o Brasil em seu estado mais popular.  O erro já começa quando somos a maioria e somos vistos como minoria, a conta não bate e nem a lógica existe”, as modelos contestam. Para piorar, segundo elas, as marcas se aproveitam da falta de medidas punitivas para quem desrespeitar a determinação, e, nas raras ocasiões em que colocam modelos negros em suas passarelas, excluem os retintos, dando preferência aos de pele mais clara. 

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Reconhecendo que posicionamentos por parte do SPFW já não mais suficientes, Paulo Borges firmou com as modelos o compromisso de tomar medidas mais categóricas para tentar transformar o atual cenário da moda brasileira. “Com o suporte dele, está sendo criado um comitê racial com ênfase na participação e valorização dos corpos pretos, indígenas e asiáticos no evento. Novas regras serão formuladas visando a efetividade igualitária na indústria.” Em paralelo, o Pretos na Moda tem se mobilizado para reunir estatísticas do mercado nacional e históricos de profissionais que praticaram atos discriminatórios. “Estamos colocando em pauta quais mudanças urgentes precisam acontecer. Não se pode mudar o futuro sem rever o passado!”

        O que dizem os estilistas

        Pouco após as denúncias serem feitas nas redes sociais, alguns dos estilistas apontados começaram a se manifestar. Pelo Instagram, Glória Coelho contatou Thayná e se mostrou disposta a ouvir e se educar para incluir mais diversidade em sua marca.

        (Reprodução/Instagram)
        (Reprodução/Instagram)

        A socialite Lala Rudge, que também foi acusada, alegou que em suas campanhas sempre buscava colocar modelos “que lembrassem o meu perfil para associarem a marca a mim”, mas que agora quer ter cada vez mais representatividade.

        (Reprodução/Instagram)
        (Reprodução/Instagram)

        Já Lourenço declarou a Veja que reconhece ter errado. “Tenho consciência de que me faltou empatia e compreensão em relação às modelos negras e aos outros profissionais de moda. Desculpem-me. As recentes críticas e observações de quem se sentiu constrangido em algum casting, backstage ou desfile suscitaram autorreflexão. Eu vou mudar, assim como o sistema da moda será obrigado a mudar também”, disse. Segundo as modelos, ele já havia tentado se justificar na live de Paulo Borges, mas sem sucesso. “Logo após, falou que iria se desculpar, mas não sabíamos onde e quando. De repente, vimos a matéria da Veja. Nada de novo sob o sol!”

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