Professora reúne alunos e pais para aprenderem juntos sobre a África
Em busca de maior representatividade das culturas africana e afro-brasileira no currículo escolar, Suzi Dornelas desenvolveu projeto e acabou premiada
Você já imaginou fazer uma viagem para a África dentro de sua escola? Porque é exatamente isso que a professora Suzi Dornelas e Silva Rocha, 32 anos, proporciona aos seus alunos.
Ensinar sempre foi um prazer para a educadora, que desde pequena se via nesse lugar de compartilhar conhecimento com as crianças ao seu redor. “Minha mãe dizia que eu gostava de ensinar de alguma forma, sempre juntava as crianças da família, da rua, pra gente organizar festival, fazer apresentações de dança, de teatro, e sempre ensinava o que eu sabia pra eles”, explica Suzi.
Sua participação nas atividades escolares foram um grande passo para que, mais tarde, ela se tornasse professora, e a escola era um espaço social que Suzi sempre gostou de fazer parte. “Eu também fiz balé durante um bom tempo, e ajudava a professora do balé a ministrar as aulas, me oferecia pra poder fazer isso. Acho que o que me direcionou a ser professora foram as experiências da minha infância, que foram muito significativas”, lembra.
A dedicação com o ensino resultou em uma vaga na UNESP, no curso de Educação Física. Para Suzi, era primordial adentrar em uma universidade pública, pois seus pais não tinham condições de pagar uma faculdade. “Eu me dediquei muito, estudei muito pra superar as defasagens que eu tinha na minha aprendizagem. Depois de um ano de muito estudo e dedicação eu consegui”, conta.
“Eu gostava muito da área da educação e das áreas de Educação Física, dos esportes, das danças, das lutas, então eu me encaixava muito dentro dessa perspectiva de ensinar”, explica ela, que hoje dá aulas na escola EE Vera Braga Franco Giacomini, em Lençóis Paulista, interior de São Paulo.
Educação Física se mistura com história e cultura
Suzi percebeu que nas escolas havia pouca representatividade da cultura africana e afro-brasileira. Normalmente, esses conteúdos apareciam apenas em datas comemorativas, como o Dia da Consciência Negra, ou nas aulas de História. Por isso, quando lecionava na EE Professor José Ranieri, em Bauru, também no interior de São Paulo, elaborou um projeto com base no que já vinha ensinando em suas aulas. “A intenção foi valorizar essas culturas e fazer com que os alunos se interessassem e se sentissem motivados em aprender”.
Os alunos foram convidados a conhecer os elementos do território africano, e ganharam um diário de bordo para que pudessem relatar tudo o que era aprendido sobre os aspectos culturais, históricos e geográficos da região. “Em cada aula eles viajavam por um país da África, e conheciam suas características, seus elementos culturais e também aprendiam um jogo ou uma brincadeira diferente”, conta.
Nesse processo, os alunos criaram um jogo chamado “memorafro”, um tipo de jogo da memória, com cartas sobre elementos da cultura africana e afro-brasileira. “Eles aprenderam danças, lutas, jogos, tanto dos países africanos quanto brasileiros, enquanto dialogávamos sobre questões étnico-raciais, racismo, preconceito e bullying”, esclarece ela.
Um dos principais desafios da educadora foi envolver toda a escola – e também os pais – no projeto. Desafio esse que foi superado graças aos alunos, que levavam o que aprendiam voluntariamente para dentro de suas casas. Foi quando Suzi viu a oportunidade de criar um novo projeto: o festival “Viagem pelos Caminhos da África”.
“Toda comunidade escolar se envolveu, os familiares vieram até a escola pra poder brincar e aprender com os alunos. As professoras integraram seus componentes curriculares com os conhecimentos sobre as culturas africana e afro-brasileira”. A gestão da escola rapidamente notou a riqueza do processo e passou a valorizar o que estava sendo realizado.
A participação dos parentes dos estudantes fortaleceu o projeto, que fez com que os alunos se reconhecessem como agentes do conhecimento, já que o que era contado por eles despertava a curiosidade de seus pais. “Os familiares ficaram motivados a participar do festival, como também contribuíram com a feitura de comida, com a decoração que foi realizada, com a exposição e vieram até a escola participar e brincar junto com esses estudantes”, relembra Suzi.
Outro desafio superado pela professora foi conciliar a matéria de Educação Física com outras disciplinas. “A educação física é muitas vezes vista como apenas um componente curricular de práticas, de vivências de esporte. Conseguir dialogar com outros componentes curriculares e outras áreas do conhecimento, como história, geografia, arte, português, nos mostra que é possível ir além das linhas da quadra”, explica ela, orgulhosa.
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Além da valorização do projeto dentro e fora da escola, Suzi foi uma das 10 vencedoras do Prêmio Educador Nota 10, que há 22 anos busca reconhecer a atuação de profissionais que trabalham na rede pública.
“É um verdadeiro privilégio. O Prêmio veio como um reconhecimento de toda a minha trajetória como educadora, desde a escola pública onde eu estudei na minha formação básica, como também da universidade púbica”, esclarece.
“Vem também como uma valorização, não só pra mim, mas para todos os profissionais da educação que buscam esse ensino respeitoso, de qualidade, que seja democrático e de acesso a todos, então acredito que esse prêmio veio para coroar essa trajetória e também para valorizar todos os profissionais que fazem a diferença em seu contexto”, finaliza a professora.
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