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Educação em sexualidade: como abordar o tema nas salas de aula (e em casa)

Tanto na sala de aula quanto dentro de casa, as conversas sobre corpo, consentimento e saúde devem se firmar na objetividade

Por Kalel Adolfo
13 jan 2023, 06h08
Especialistas no tema debatem sobre as melhores formas de introduzir o assunto aos pequenos.
Especialistas no tema debatem sobre as melhores formas de introduzir o assunto aos pequenos.  (Getty/Reprodução)
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Curiosidade e infância caminham juntas. Só quem tem filhos (ou sobrinhos ou convive com crianças de alguma forma) sabe o quanto as perguntas mais cabulosas são feitas, assim, de surpresa. A tal “de onde vêm os bebês?” ainda pega desprevenida a parentalidade, mas o susto maior chega só anos depois — nada preocupa mais os adultos do que o início da vida sexual dos adolescentes. Como orientar, acolher, abrir espaço para as descobertas mas, ao mesmo tempo, ajudá-los a prevenir riscos? O que já era um dilema fica ainda mais complicado com as fake news que tomam conta justo das redes sociais, onde os jovens buscam referência. É preciso, então, se firmar num lugar de conhecimento e fatos. Para isso, é preciso um diálogo aberto dentro de casa e também nas escolas sobre a chamada “educação em sexualidade”.

O que é a educação em sexualidade?

Claudia Petry, pedagoga com especialização em sexologia clínica, explica a expressão: “Existe muito tabu em torno do tema porque as pessoas confundem o que é sexo com o que é sexualidade. Aliás, nós, profissionais e estudiosos, alteramos o termo: agora, trata-se de educação em sexualidade, já que entendemos que essa é uma conversa sobre o corpo, de onde vêm os bebês, consentimento, diversidade, o conceito de família, respeito ao próximo e autocuidado corporal”.

E por que esse é um tema para se aprender também no contexto da sala de aula? Para começar, 70% da violência sexual contra menores de idade acontece dentro de casa — segundo levantamento realizado pelo Disque 100 em 2019. “Apenas esse dado já é o suficiente para provar que não podemos deixar a educação em sexualidade apenas nos lares. Muitas vezes, é na própria residência que a criança irá encontrar o abusador”, aponta Claudia.

“Num mundo ideal, seria ótimo que os pais participassem de uma aula sobre como conversar com os filhos. Infelizmente, quando não sabemos como explicar algo, jogamos o temor nos filhos ao invés de promover uma abordagem positiva da sexualidade.”

Mas a relevância do tema nas escolas não para aí. Segundo a psicóloga e educadora sexual Ana Canosa, é no colégio que desenvolvemos os nossos primeiros laços.

“Esses vínculos irão acompanhar o desenvolvimento sexual dos pequenos. Aqui, estamos falando sobre os primeiros amores, as brincadeiras com os colegas, o reconhecimento do corpo. A sexualidade é inerente ao ser humano. Somos machos, fêmeas, não-binários, com várias orientações sexuais diferentes. Não há como não abordar o tema. A questão é como fazer isso”, aponta a profissional.

Desmistificando o tema

Todos nós já tivemos aquela aula constrangedora, colocada a força na grade de Biologia ou Ciências, em que o professor fala, em questão de minutos, sobre reprodução, ISTs e proteção contra a temida gravidez na adolescência. Fim de papo.

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Para fazer sentido hoje, a conversa precisaria ainda contemplar consentimento, orientação sexual, identidade de gênero, tudo na complexidade compatível com a faixa etária. “Trabalhe na linguagem da criança e vá até onde ela pode. Para um pequeno de 5 anos, contamos a origem dos bebês de uma maneira curta e rápida: ele vem da barriga da mãe, por conta da junção da sementinha do homem com a da mulher. Agora, isso já não é suficiente para uma criança de 9 anos”, pontua Ana Canosa.

Portanto, o cronograma nas escolas deve ser baseado em princípios relativos à idade e capacidade de compreensão da informação. “Ninguém irá falar sobre práticas sexuais do mundo adulto para quem tem 6 anos. Mas é possível falar que adultos namoram, porque mentir não é interessante”, esclarece.

Segundo Ana, quanto mais o jovem vai se aproximando da puberdade, a educação em sexualidade precisa ser mais efetiva e direta. “Tem que falar sobre mudança de corpo, hormônios e, sem dúvidas, orientação sexual e identidade de gênero.”

Claudia Petry complementa: “É melhor que a criança tenha a informação cinco anos antes do que cinco minutos depois. A missão de educar não deveria ser apenas da escola, pois os pais são os primeiros educadores. Em contrapartida, não deveria estar só sob os cuidados dos tutores, pois os adultos têm vivências problemáticas e acabam passando traumas e tabus para as crianças. Dificilmente os pais trarão um conhecimento ligado à pesquisa ou à ciência para informar o jovem de forma neutra”.

Uma questão de identidade e vida em comum

Para além do sexo, a educação em sexualidade explora a possibilidade de sentirmos que a nossa identidade está integrada à sociedade: “Falar de gênero, por exemplo, possibilita que os alunos compreendam a desigualdade histórica entre homens e mulheres. Eles podem entender os impactos do patriarcado e também estar conscientes de que quaisquer expressões afetivas e sexuais são válidas e devem existir”, diz Ana Canosa.

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Desejar que as crianças tenham acesso a essas e outras informações não é uma questão de “ideologia”. De acordo com Ariane Senna, psicóloga e mestra pela UFBA, as temáticas intrínsecas à sexualidade influenciam camadas sociais mais profundas do que podemos imaginar.

“Sem essa orientação nos colégios, mulheres podem aceitar o lugar de vítimas de violência doméstica e sexual, naturalizando tais violências para as próximas gerações. A população LGBTQIAPN+ pode internalizar que a sua existência é uma vergonha e, com isso, desenvolver diversos problemas psicológicos como fobia social, ansiedade ou depressão”, enumera a profissional.

E continua: “Homens, por sua vez, podem entender que os cuidados com o corpo dizem respeito apenas às mulheres e, a partir dessa ideia, passar a colocar em risco a saúde sexual de suas famílias, baseando-se em uma criação patriarcal”.

Entraves atuais

Ana reforça que, mesmo com a política realizando uma série de mudanças conservadoras no currículo básico nacional — a palavra “gênero” foi retirada do trabalho em sexualidade —, as escolas ainda têm liberdade para abordar a temática do jeito que acharem necessário. Contudo, é essencial que as instituições estejam prontas para assumir esse posicionamento e defender os seus educadores.

“Existe interesse tanto das escolas quanto dos pais para que o tema seja trabalhado, mas o silenciamento continua sendo grande. Muitos não entendem que o educador jamais opinará sobre valores”, diz.

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A psicóloga elucida esse posicionamento com um exemplo: se um pai é testemunha de Jeová e a sua filha só pode transar dentro do casamento, não é papel do colégio afirmar que isso está certo ou errado.

“A nossa função é dizer que os adolescentes estão se iniciando sexualmente em torno de 15 anos, esclarecer as questões mais urgentes, se dói ou não dói, como a experiência poderia ser mais legal… Se todos soubessem disso, funcionaria bem. Mas não adianta o professor falar algo na sala de aula, o pai reclamar e a diretora demitir o funcionário”, aponta. Que seja uma conversa relevante e coerente de ambos os lados.

Para aprofundar as reflexões

Uma temática complexa tal qual a educação em sexualidade merece conteúdos extras de apoio para compreender a situação macro e micro da coisa:

Sexualidade Começa Na Infância

livro Sexualidade Começa Na Infância

Sexualidade Começa Na Infância

O livro da autora Maria Cecília Pereira da Silva aborda temas como masturbação, violência sexual, orientação sexual e sexualidade em crianças portadoras de deficiências. Além disso, ainda mostra como trazer esses assuntos para dentro de casa e para a escola.

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Educação sexual na sala de aula

livro Educação sexual na sala de aula

Educação sexual na sala de aula (E-book)

Doutora em Educação pela UFRGS, a professora e pesquisadora Jimena Furlani esclarece neste título porque a discussão em torno da sexualidade não pode mais ser adiada nos colégios, em distintos níveis de escolarização.

Sex Education (3 temporadas, Netflix)

Série original do canal de streaming é sucesso no mundo todo (principalmente no Brasil) por conseguir retratar as angústias e curiosidades que acompanham a puberdade. De maneira bemhumorada, os personagens se enroscam em ciladas amorosas e sexuais, além de identidade.

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