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Por trás da moda

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Renata Brosina é jornalista, host de podcast e editora de moda com foco em luxo e sustentabilidade. Com 15 anos de carreira e alguns títulos internacionais no currículo, ela é curiosa, gosta de entrevistar e vestir pessoas, e analisar as transformações que vêm acontecendo no mercado.
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Quando a moda vai além da roupa

Mesmo que rotulada como entretenimento por muitos, a indústria fashion pode surpreender com suas narrativas – e ir além do mero suspiro aspiracional

Por Renata Brosina
11 nov 2024, 08h00
A moda é capaz de levar o público ao delírio
A moda também apresenta narrativas e propostas (Getty Images/Divulgação)
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Sempre resisti à ideia de considerar a moda um mero tipo de entretenimento. Ainda que nem tudo apresentado pelas marcas seja carregado de significados profundos, é uma cilada resumir um desfile, uma coleção ou uma ideia como uma mera distração.

Para mim, por trás de cada apresentação há uma história, uma personagem, uma voz e um mistério a ser descoberto — mesmo numa passarela minimalista. E, sim, eu sei que quem trabalha nesse mercado tende a ser suspeito para defender e lutar pela indústria do sonho, da magia e do escapismo.

Escapismo, muitas vezes, necessário para nos desprender temporariamente de uma realidade que nem sempre é benéfica. Assim como quando decidimos ler um bom livro. Da mesma forma, também dá para escutar vozes, e imaginar de onde essas personagens vêm ou ainda como o cenário faz parte da narrativa. Na verdade, é bem por aí que a minha coluna deste mês vai seguir. Explico.

Moda e a capacidade de delirar

Não é apenas um desfile que me faz escapar da realidade por quinze minutos. Esse portal, por onde a gente entra, seja no ambiente físico ou digital, é, no meu ponto de vista, meio inexplicável. Talvez até confuso à primeira vista, porque parece não ter uma receita de bolo exata para levar o público ao delírio — diria que no sentido literal —  por conta de uma apresentação de… moda. Na verdade, há extremos. 

Exemplificando com fatos: nem todo desfile megalomaníaco feito por Karl Lagerfeld para a Chanel, nos domínios do Grand Palais, em Paris, nos teletransporta para outra realidade. Mesmo com um foguete, um barco ou uma estátua de leão dourada (de onde as modelos saíram para mostrar seus looks de Alta-costura para o Inverno 2010) nada disso passa de mera decoração.

Sem menosprezar o talento do diretor criativo alemão, a fórmula para um show ser mágico não é o exagero — mas algum outro ingrediente misterioso.  Apesar de não estar nesse desfile, tive a chance de viajar para o litoral francês para o Verão 2019 da marca dentro do próprio Grand Palais.

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Com direito à areia e ondas, Lagerfeld levou uma praia a Paris – e, ainda que sabendo exatamente onde eu estava, era surreal perceber o quanto era inacreditável caminhar naquele cenário e não parecer estar próxima ao mar. Assim como o supermercado, que foi construído para o Inverno 2014 da grife, com corredores, prateleiras, produtos etiquetados com o logo double C, parecia ser tão real que, algumas convidadas, passearam pelo cenário, pegaram bananas (essas, sim, de verdade), mas tiveram que devolver na saída.

Outros designers e suas construções

Mas Karl não é o único que possuía uma varinha mágica. Alessandro Michele, que já passou pela Gucci e, na última temporada de Verão 2025, fez seu primeiro desfile para a  Valentino, também é craque no quesito “descolamento da realidade”.

No bom sentido, óbvio. Suas narrativas costumam combinar elementos excêntricos, criaturas irreais e um pouco de assombração. Já teve de tudo um pouco, de rios de fogo por onde os modelos caminharam a filhotes de dragões e cabeças “gêmeas” sendo carregadas nas mãos dos modelos. 

Recentemente, no seu debut em uma nova maison, o salão por onde os 171 looks passaram era pavimentado com vidro que, a cada passo — tanto dos modelos quanto dos convidados —, se quebrava ainda mais. Além do som, que tornava real a experiência do craquelar, a atmosfera composta pelas luminárias cobertas traziam uma sensação fantasmagórica, com aquele fundinho de diversão.

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Já na Prada, a viagem é outra: é um mergulho nos pensamentos da própria Miuccia Prada. É como se entrássemos na sua cabeça. Ela é conhecida por ideias e questionamentos disruptivos, que vão além da caracterização do espaço. A sua proposta é sempre rodeada de referências intelectuais e artísticas, que envolvem o público em temas que, de tão reais, parecem ficção.

Um dos mais marcantes, dos que assisti da primeira fileira, foi o de Inverno 2016, quando suas andarilhas, algumas vestindo uniformes, de inspiração militar ou marinheiras, levavam seus destinos anotados em cadernos pendurados – sejam eles chaveiros, colares ou até dando forma às bolsas. O recado por trás dessas personagens estava relacionado às lutas diárias femininas — causa abraçada pela Sra. Prada desde a sua adolescência. 

Diferentemente das menções anteriores, Hedi Slimane gostava de entregar a sua realidade para a Celine em formato de curta-metragens. Ou seja, com direito a cenários deslumbrantes e trilhas sonoras que se encaixavam na tradução sublime do que o diretor criativo pensava em nos mostrar.

Para o Verão 2025, sua despedida da grife, a combinação entre guarda-roupa e beleza nos transportou para o final da década de 1960. Foi chique, impecável e tão real. E, confesso, de viagens no tempo, eu também gosto. 

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