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Por Ana Carolina Coelho. Feminista, mãe, escritora, poeta, dançarina, plantadora de árvores, pesquisadora e professora universitária
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Belezas ensinadas: “amaternei” sendo “amaternada”

Descobri o óbvio com a experiência: a criança é apenas uma promessa enquanto não é real

Por Ana Carolina Coelho
11 fev 2021, 09h00

Quando eu soube que estava grávida, pela segunda vez, e a gravidez foi chegando ao final, eu fui me permitindo lentamente sonhar em como seria a vida com uma filha. E, obviamente, eu fiz uma lista de brincadeiras, atividades e habilidades que eu queria que minha criança aprendesse.

Eu sabia EXATAMENTE que tipos de filmes e músicas iriamos ouvir e ver. Eu tinha toda nossa vida planejada na minha cabeça. Eu sabia TOTALMENTE o que eu NUNCA faria com a minha filha. Essa lista foi refeita no primeiro mês de vida da minha neném; no segundo; no terceiro, e assim foi até o primeiro aniversário, quando eu rasguei todas as versões em tantos pedaços quanto estavam as minhas expectativas de que eu seria a “mãe perfeita”.

Essa lista mora agora na “lixeira” da estupidez da naturalização da maternidade: de que eu saberia TUDO e nunca teria dúvidas sobre como agir ou o que fazer em relação ao maternar. 

Eu descobri o óbvio com a experiência: a criança é apenas uma promessa enquanto não é real. E que embora a minha função seja ensinar-lhe sobre a vida, ela terá uma maneira singular de entender o mundo. Muitas vezes, ao longo dos anos, fui surpreendida com as opiniões incisivas e diferentes de minha filha – e são muitas, acreditem – outras com apenas um olhar diferente sobre algo que eu não tinha reparado. Eu igualmente descobri que maternar é uma troca constante.

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Há alguns anos atrás, tivemos um momento de troca muito forte e significativo aqui em casa. Eu fui uma criança gorda. E, conforme me tornei adulta, tive vários formatos de corpos, por razões variadas. Naquele ano eu estava perdendo peso e uma monitora de uma das escolas em que minha filha estudou, na entrada da aula, disse-me que eu estava “ficando linda”, em uma tentativa do que se pode chamar de elogio em uma sociedade gordofóbica. Como eu estava atrasada, nada falei.

Alguns dias depois, estávamos assistindo TV – um programa de noivas que eu detesto e minha pequena adora (fazer o que?) – e ela declara: “essa mulher é muito feia!” A moça em questão era muito bonita mas…era gorda. Eu olhei para minha filha e disse: “o que ela tem que você acha feio?” e ela, na hora, sem titubear, respondeu: “Ela é gorda demais, mãe!”. No segundo em que as palavras foram proferidas, eu disse: “Filha, a sua mãe é gorda demais. Eu sou feia?” e ela respondeu: “Mãe, VOCÊ não é gorda e claro que você é linda!”

Eu me levantei, tirei minha roupa e completamente nua disse: “Olha para o corpo da mamãe. Ser gorda significa que eu tenho gordura no corpo e esse formato aqui ou aquele ali da TV, é um formato mais cheio. EU SOU GORDA SIM.” E minha filha respondeu: “Mas você é linda, mamãe!” 

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E eu entendi a confusão: minha doce criança estava reproduzindo as normas aprendidas fora de casa sobre beleza. À essa altura, lágrimas escorriam de mim e o tempo se dissolveu. A criança gorda tão ferida com os comentários maldosos e a falta de amor porque tinha um formato de corpo que a desqualificava a ser uma “criança bonita”, guardada dentro de mim, foi abraçada pela primeira vez, por outra criança.

Eu fui, tanto anos depois, acolhida e amada e algo dentro de mim foi, aos poucos, se curando. O mundo tentou ensinar preconceito para minha pequena e ela devolveu com o amor puro e cheio de ternura tão próprios da minha Clara Rosa.

Ato contínuo a esse abraço que durou segundos e curou décadas de tristeza e sofrimentos, ela olhou para a TV e disse: “A moça é bonita mesmo, igual a você. Você tem razão, mãe!” Naquele dia, eu ensinei e aprendi. Eu “amaternei” sendo “amaternada” em minhas cicatrizes de uma sociedade cujos padrões de aceitação são cuidadosamente desenhados para o reforço das nossas inseguranças como mulheres. 

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Maternar é aprender, na prática, a famosa frase de Nelson Mandela “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.”

Evidentemente, aproveitei essa experiência para muitas outras conversas que foram surgindo sobre belezas, preconceitos de gênero, classe, raça e orientação sexual, dentre outros preconceitos que existem em nosso mundo. E, talvez o mais interessante foi entender que eram realmente diálogos: a minha flor encantada do Cerrado tinha e continua tendo, opinião própria para todos esses temas!!! 

A maternidade é algo confuso, cansativo e árduo.  Nenhuma lista consegue dar conta do recado e eu, na maior parte das vezes, termino os dias exausta. É um cansaço divertido e amoroso da qual eu me canso e me renovo todos os dias. E cada vez mais, vou sendo apenas eu mesma – cheia de defeitos, imperfeições e humanidade – aproveitando a bagunça que é o convívio com essas pequenas humanas maravilhosas cheias de vontades e com corações do tamanho do Universo. 

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