A importância da representatividade na luta contra o racismo
A forma como as pessoas são retratadas na cultura influencia enormemente como vemos o mundo e tem um grande potencial de promover mudanças na sociedade
Em agosto de 2016, fiz uma provocação em forma de editorial de moda feminina com imagens retratando um ambiente aristocrático, com negras representando pessoas da elite e brancas uniformizadas como empregadas – uma delas, a princesa Paola de Orleans e Bragança, descendente da família real brasileira. Essas imagens receberam milhares de comentários racistas de brancos e de negros. Uma característica da cultura brasileira: enquanto os brasileiros acreditam na igualdade da democracia racial, no dia a dia essa crença é desmontada com facilidade.
Por isso, é importante elevar a consciência humana sobre a importância da representatividade. Não se trata de apontar o dedo ou praticar revanchismo, mas de promover a empatia e a compaixão para tentar entender o desafio de crescer numa narrativa eurocêntrica não sendo branco.
Por isso, proponho olhar de um ângulo diferente o absurdo da propaganda ocidental, que coloca o ariano num grau superior sabendo que existem apenas 3% de loiros adultos no mundo. É chegada a hora de rever nosso erro de promover a eugenia usada no regime nazista há 70 anos.
Para um artigo intitulado “Vamos Falar sobre Raça”, o fotógrafo e roteirista americano Chris Buck tirou três fotos invertendo os papéis de mulheres de diferentes etnias. As imagens foram utilizadas para ilustrar a edição de maio da revista The Oprah Magazine. Em uma delas, em um salão de beleza, mulheres brancas fazem as unhas dos pés de um grupo de asiáticas.
Em outra, uma menina loira parece indecisa e sem opção na hora de comprar uma boneca, pois todas nas prateleiras da loja representam meninas negras. Na terceira, uma mulher branca de uniforme serve chá para sua patroa latina, que não parece sequer notar sua presença. Esse trabalho de Buck foi essencial para estimular um diálogo sobre raça, justiça social e poder entre as mulheres.
Há uma série de interpretações nesses cliques que mostram como pessoas de diferentes raças percebem o mundo de forma variada. É importante observar que a melhor maneira de manter privilégios e, consequentemente, desigualdades – e a violência que delas decorre –, é negar que eles existem. A pessoa branca é criada para entender sua cor de pele como padrão e a de outras etnias como diferente, o que só incentiva a formação de um sistema racista e opressor.
A iniciativa de Buck e da revista tem um valor particular: embora seja um homem branco, ele parece sensibilizado com a falta de representatividade que deixa muitas mulheres de outras etnias desconfortáveis ao assumir papéis de poder, como se não merecessem de fato ocupar essas posições. Segundo o fotógrafo, falar com os amigos negros, ouvi-los contar suas histórias e experiências fez parte do trabalho. “Mesmo que as imagens sejam sobre um diálogo, sei que, como uma pessoa branca, eu deveria ouvir mais do que falar”, afirma ele.
“A revista procura, assim, aprofundar a conversa sobre o papel que cada um de nós desempenha na narrativa racial dos Estados Unidos”, comentou ele. E o que se viu foi um debate acalorado nas redes sociais. A forma como as pessoas são retratadas na arte e no entretenimento influencia enormemente como vemos o mundo e tem um grande potencial de promover mudanças significativas na sociedade.
Como mulher negra, sou diretamente afetada pela falta de representatividade na mídia e sinto os efeitos que isso tem na formação da identidade e autoestima de afrodescendentes. Essas imagens impactantes trazem à tona várias questões que merecem ser discutidas, encorajando um diálogo honesto sobre raça e gênero. Precisamos incentivar as pessoas a desafiar os pressupostos de raça e considerar o subtexto repleto de situações cotidianas.