Artesanato brasileiro: e-commerce ajuda a gerar renda e manter tradições
Transmitido por gerações, o ofício ganha força com parcerias e as lojas virtuais aumentam visibilidade
Entre tantas mudanças que a pandemia trouxe, uma delas é o modo como as comunidades tradicionais de artesanato brasileiro vendem suas peças. Antes, as vendas aconteciam somente pelo movimento dos turistas nos locais, mas com a baixa nas viagens por quase dois anos, os artesãos encontraram na internet uma alternativa para gerar renda. Além disso, parcerias com curadores e profissionais de e-commerce trouxeram novas possibilidades de mercado, além dos limites geográficos.
E as projeções são animadoras. Um dos setores que mais cresceu em e-commerce nos últimos dois anos foi o de Casa e Decoração que, segundo uma pesquisa da plataforma NuvemShop, teve alta de 300 % no número de pedidos entre 2020 e 2021.
É neste contexto que a empresária Mariana Oliveira, de 38 anos, fundadora e curadora do e-commerce de artesanato Etnias Mundi, atua. Com olhar atento para a produção artesanal e para o crescimento do setor no Brasil, ela ampliou suas parcerias com artesãos de 35 grupos em cerca de 11 países. “Em um período em que essas comunidades tiveram um forte impacto econômico, as vendas online passaram a ser a principal fonte de renda de artesãos, mas como boa parte deles não estava habituada com o uso de lojas virtuais, os parceiros têm cumprido esse papel”, revela.
Com crescimento da loja na casa dos 80% em 2021 e mais de 5 mil produtos vendidos, Mariana percebeu que a geração de renda incentiva os mais jovens a continuarem as tradições iniciadas pelos pais e avós. “Uma vez que eles veem os pais ganhando melhor, eles até saem para buscar por qualificação e cursos universitários, mas voltam e passam a usar esse conhecimento com o objetivo de gerenciar os negócios que normalmente são familiares”, afirma.
É o que acontece em Santarém, no Pará. Convivendo diariamente com o artesanato, Niete Rego, 29 anos, atual diretora da Associação Trançados do Arapiuns (AARTA), tomou gosto pelo ofício por influência da mãe, a artesã Neida Pereira, que foi uma das fundadoras da associação. “Hoje, eu faço a gestão de 120 artesãos de oito comunidades em torno do Rio Arapiuns e, quem sabe, em algum momento pode ser que minha filha, que hoje tem 10 anos, assuma esse papel de levar nossa cultura adiante ”, revela.
Para ela, a participação dos mais jovens é fundamental. “Acabamos tendo mais facilidade com a tecnologia e, com isso, conseguimos estar mais atentos às possibilidades de parceria. Além dos e-commerces ajudarem com o escoamento da nossa produção, eles acabam trazendo novas ideias e nos divulgam, levando o nosso trabalho a locais que muitas vezes nem conhecemos”, completa Niete.
Nascido e criado na Aldeia Kaüpana, no Alto Xingú, Mato Grosso, o artesão indígena Waxamani Mehinako, 27 anos, é filho e irmão de exímios artesãos. Trabalhando em parceria com a Etnias Mundi desde 2019, ele desenvolve telas e remos pintados à mão com grafismos que remetem às histórias das nove etnias que compõem o Parque Nacional do Xingu. Segundo ele, a parceria com a Mariana o ajuda a chegar a públicos que ele não consegue atingir. “É uma fonte importante de geração de renda para a nossa comunidade, o que nos permite ter mais recursos para investir no desenvolvimento da aldeia de acordo com as nossas tradições”, afirma.
Trabalhando com apenas três lojas, sendo duas físicas e uma virtual, o artesão ressalta que muitas outras o procuram para parcerias, mas que algumas propostas desvalorizam o seu trabalho. “O lojista precisa colocar o valor cultural acima do monetário e entender que este é um trabalho feito à mão, é um processo que leva dias para ficar pronto e, além disso, carrega a história do nosso povo, por isso eu recuso lojas que não entendem isso e que querem determinar os nossos preços”, completa.
De cestarias a objetos para o dia a dia, a Etnias Mundi trabalha com produtos de moda, casa e decoração de diversos grupos de artesãos e oferece a possibilidade de se ter decorações e looks com mais personalidade, além de incentivar o comércio regional.