O riso solto de Lidi Lisboa: saiba as novidades da carreira da atriz
Estreando como Alice em A Sogra Que Te Pariu, atriz fala sobre comédia brasileira e o exercício da cidadania entre artistas
Cheiro de eucalipto. Pés de manga. Fruto de araticum. Pôr-do-sol. São esses os quatro elementos que constituem uma das lembranças mais amorosas de Lidi Lisboa. A atriz nasceu e viveu parte da infância em um vilarejo na Vila Guarani, no meio do caminho entre os municípios de Terra Roxa, no Paraná, e Guaíra, em São Paulo.
Hoje, ela mora na capital paulista e seu trabalho está ao alcance dos mais de 222 milhões de assinantes da Netflix pelo mundo: ela é a personagem Alice em A Sogra Que Te Pariu, a primeira sitcom multicâmera brasileira do streaming, que estreia neste mês de abril. A série, dividida em dez episódios, narra o dia a dia da família com a presença da sogra Dona Isadir, interpretada e idealizada pelo comediante Rodrigo Sant’Anna.
A Sogra Que Te Pariu é uma novidade. Não só na plataforma, mas na vida de Lidi, que diz que nunca se imaginou como atriz de comédia. Suas únicas atuações no gênero foram há anos, para o público infantil. Com a oportunidade de interpretar Alice, uma advogada de sucesso que é nora de Dona Isadir e casada com Carlos (Rafael Zulu), o novo momento chegou. A série também é uma forma de abordar temas complexos de forma descontraída.
Existe uma identificação com o contexto de muitas famílias brasileiras e, até mesmo, com nossas crises existenciais. Em Dona Isadir, por exemplo, a atriz enxerga uma grande privação. “É uma pessoa carente. E nós temos nossas carências, alguns escondem, outros descontam…Todos têm uma válvula de escape”, comenta, ao também pontuar sobre a representatividade da sitcom. “A gente tem uma família preta de classe média alta brilhando na trama. O negro também precisa se reconhecer nesse espaço, sabe? E é uma comédia repleta de diversidade, com diferentes sotaques e corpos, além da representatividade LGBTQIA.”
Nem sempre narrativas diversas foram incluídas em produções áudio visuais. Há poucas décadas, usar marcadores sociais de gênero, raça e classe eram motivos para piadas e sátiras desrespeitosas, mas Lidi acredita que isso está mudando porque existem certas coisas que não são engraçadas. “Não dá mais para ridicularizar ou diminuir o outro. Estamos falando de fazer o outro rir, sem ofendê-lo. Precisamos naturalizar a diversidade”, acredita
“O streaming tem possibilitado levar nosso trabalho para mais pessoas, o que para nós, artistas, significa reconhecimento e, para o público, amplia as possibilidades de se reconhecer na tela”, conta.
Nos assuntos da sitcom, estão saúde, internet, TikTok, instantaneidade do Tinder e até como é ser motorista de aplicativo. São pautas que têm profundidade, mas são apresentadas aos telespectadores de maneira sutil. Aí reside um dos potenciais da comédia: falar de temas complexos com leveza e fluidez. “A comédia de costumes tem a intenção de fazer uma crítica por meio do humor. Ao construir o enredo em torno dos códigos sociais existentes, há um poder de desmistificar as coisas, criando uma empatia, oferecendo e conduzindo essa possibilidade de beleza e intimidade, fazendo o público rir”, continua Lidi.
“Não dá mais para ridicularizar as pessoas. Estamos falando de fazer o outro rir, sem ofendê-lo. Precisamos naturalizar a diversidade”.
Lidi Lisboa
No Brasil de 2022, parece até uma missão impossível ter bons motivos para sorrir. A realidade é esmagadora, inclusive para o próprio setor cultural. Mesmo assim, Lidi defende que a busca por manter a arte viva seja uma constante na vida do artista. “A gente pode até passar por momentos mais obscuros no que diz respeito à cultura no nosso país, mas os artistas vão sempre buscar fazer as pessoas rirem, se divertirem e se emocionarem. Afinal, um país sem cultura é um país vazio.”
A dramaturgia começou cedo para Lidi. Na infância, saiu do vilarejo para morar no interior de São Paulo e depois na capital, onde ingressou em aulas de teatro na escola. Sua primeira novela foi na Rede Globo, em A Padroeira (2001). Ainda na mesma emissora, participou de Malhação, Paraíso Tropical, Cheias de Charme, Império e Segundo Sol. Seu último papel foi como protagonista na novela bíblica Jezabel, da Rede Record, em 2019. Um ano depois, em 2020, a atriz topou algo diferente de tudo que já viveu: participar de A Fazenda. “Eu era tão reservada que falei ‘ah,’ vou me jogar’. Foi do 8 ao 80. Você vai e não consegue montar um personagem, então fui muito eu.”
“A comédia de costumes tem a intenção de fazer uma crítica por meio do humor. Ao construir o enredo em torno dos códigos sociais, há um poder de desmistificar as coisas, criando empatia”
Lidi Lisboa
Para a atriz, foi a participação no programa que lhe abriu as portas de A Sogra Que Te Pariu. “Deu uma abertura para mais pessoas me conhecerem. Foi importante para a minha carreira, não me arrependo, só teria engolido menos sapo e entrado menos coração aberto”, diz.
Estar em um dos programas de maior audiência da emissora mudou sua relação com as mídias sociais. Atualmente, sua percepção é de que as plataformas consomem nosso tempo, energia e presença. “Tento separar o virtual do real. O desafio é entender que as mídias sociais não são o mundo real”, explica ela, que soma mais de 1,5 milhão de seguidores no Instagram e Twitter.
Manifestar posições políticas por ali é algo que Lidi diz evitar. “Não sou muito de levantar uma bandeira, porque as pessoas ficaram intolerantes e nem sempre somos interpretados da forma que queremos. As pessoas entendem o que querem entender. Claro, quando tem algo absurdo, você tem que se posicionar, mas evito certas coisas para ficar sã.”
É por isso, também, que Lidi procura sempre pelo significado daquilo que expressa, genuinamente, reconhecendo a importância das palavras e seu poder de criar, ou destruir, mundos inteiros. E aconselha: “Gostaria que todos refletissem sobre o que vão dizer”. Isso, segundo ela, é uma forma de não banalizar a luta contra o preconceito no país.
Em meio aos seus projetos futuros, que envolvem o trabalho como apresentadora, gravações de uma nova série, um longa e mais uma novela, a atriz quer serenidade. “Estou tentando ser mais racional, nessa busca do equilíbrio, grata pelas coisas boas e ruins”, conta.
Ao olhar para o passado, não tem muita nostalgia. Nem tudo foi “uau”, como ela mesma diz. O vilarejo no qual cresceu e está há 20 anos sem visitar não existe mais. O território virou uma fazenda. Mas nada disso anula o sentimento de gratidão pela sua jornada. “Cresci na roça. Nada me tira essa conexão que estabeleci na infância com a natureza. É um ponto especial na minha vida, importante na construção de quem sou hoje.” Lidi busca viver no agora e ver as coisas como descobertas, não sentenças. Afinal, quem veio da terra, como ela, se finca no presente.
*Make: Esthéfane Luz
Cabelo: Priscila Bispo
Styling: Zazá Pecego
Produção de moda: Luan Gabriel
Direção de arte: Kareen Sayuri