Antirracismo é para já!
Como cobrar de sua empresa atitudes que combatam o racismo e garantam mais pessoas negras em todos os níveis de cargos
Para você e a empresa onde trabalha, vidas negras importam? No código de conduta das companhias, a resposta parece óbvia. Mas, na prática e nos investimentos, a história muitas vezes é outra. Se você tem se sentido mais instigada a pensar no assunto, que tal transformar a curiosidade em ações?
No Brasil, a procura por “antirracismo” nos mecanismos de busca da internet cresceu mais de 2 000% e por “igualdade racial” mais de 300% na semana após o assassinato do americano George Floyd. Aqui, onde a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado, a taxa de homicídios de pessoas negras é quase 20 vezes maior do que nos Estados Unidos. Mesmo assim, geralmente, só lembramos dessa pauta quando está na mídia ou quando vem de fora do país. Uma coisa é certa: não precisamos de mais pessoas negras morrendo para ter um engajamento contínuo na questão racial. Já está mais do que provado que, para além de um princípio ético e da atitude correta a se tomar, a igualdade racial faz as empresas crescerem. Um time mais racialmente diverso aponta novas soluções e tende a se conectar com parcelas da população que muitos ainda não conseguem atingir.
Acredito que o primeiro passo para fazer parte da luta antirracista é não fugir da responsabilidade pela solução desse problema. Não comece uma discussão sobre racismo dizendo que você e sua empresa não são racistas. É o que nos ensina Djamila Ribeiro no seu livro Pequeno Manual Antirracista (Companhia das Letras). Estamos falando sobre o racismo estrutural e enraizado nas nossas ações diárias. Nós, como pessoas ou empresas, reproduzimos atitudes racistas. Nem precisa chamar o VAR (o árbitro de vídeo nos esportes) para tirar a dúvida. Devemos parar de colocar a culpa em nossos vieses inconscientes; já temos consciência do que é o racismo. Agora é partir para a ação e deixar de varrer um problema estrutural, histórico, grande e global para debaixo do tapete.
Evitar apontar o dedo para o outro é mais um ponto. Procure direcionar esse dedinho para dentro de si e de sua empresa. Cabe questionar: o que eu posso fazer para incluir mais pessoas negras como referência para meus filhos ou no meu espaço de trabalho? No ambiente profissional, vale pensar em como trazer mais estagiários, jovens aprendizes e trainees? Sim. Com certeza devemos expandir o acesso geral às oportunidades. Mas quantas chefes negras você já teve? A mudança também começa por cima. Há prazos e metas de recrutamento e aceleração de carreira dos profissionais negros que já estão na empresa? Esses números estão disponíveis a todos para que haja um compromisso público e engajamento geral no alcance do objetivo? Os treinamentos para lideranças e colaboradores aprenderem mais sobre a temática são constantes?
Nos Estados Unidos, foi notável o movimento de empresas investindo na pauta da igualdade racial. Nike, Amazon, Netflix, Johnson & Johnson, entre outras, se comprometeram a destinar milhões de dólares para organizações ligadas à luta antirracista, além de desenharem pilares, metas e prazos para mais ações. Esses investimentos, no entanto, ainda não estão previstos para se estenderem ao Brasil, mesmo entre as companhias que atuam aqui. Por que será? A cobrança para negócios de todos os portes irem além das hashtags e dos discursos bonitos um dia chega. Que tal se “antecipar” e tirar este atraso histórico com ações concretas?
O primeiro passo sempre parece muito difícil, mas a inércia é inadmissível. Para ajudar a colocar seu antirracismo em prática, existe o manifesto sejaantirracista.org. Deixe as desculpas, o receio e a culpa para trás e faça sua parte na transformação das hashtags de igualdade em realidade. Mas não é para amanhã e não é só lá fora. É dentro de você, da sua empresa e é para já.
* Luana Génot é fundadora e diretora executiva do Instituto Identidades do Brasil (@ID_BR), mestra em Relações Étnico-Raciais e autora de Sim à Igualdade Racial (Pallas)
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