‘Marmita de casal’: entenda a nova tendência entre não-monogâmicos
Se você já “matou a fome” de apaixonados não-monogâmicos, precisamos informar: a internet te considera uma marmita de casal
Nos últimos meses, as pessoas nas redes sociais só querem saber (e falar) sobre “marmita de casal”. Mas, afinal, o que é isso? As marmitinhas (sim, vamos deixar a coisa fofa) são pessoas que, de vez em quando, participam da vida sexual de um casal. Não há nenhum envolvimento sério e nem entra em uma categoria extra de poliamor — que já explicamos em CLAUDIA. A coisa é casual (e sexual).
Porém, não se engane, essa atmosfera descontraída não é sinônimo de bagunça! Pelo menos é o que garante Gustavo*, publicitário e marmita convicta: “Eu sempre estou ciente do meu papel na relação e sou muito respeitoso. É como se estivesse entrando na casa de duas pessoas, enquanto convidado. Fico lisonjeado de fazer parte dessa troca. Absorvo toda a experiência com leveza, porque sei que não estou vivendo um trisal”.
O rapaz de 27 anos já coleciona algumas experiências a três, mas possui um casal de marmiteiros no seu coração. O flerte começou despretensiosamente pelo Instagram, quando ambos começaram a segui-lo, e resultou em um encontro.
“Ficamos três horas conversando num barzinho no nosso primeiro date e, no final, nos beijamos. Só fomos transar no terceiro encontro, quando conheci a casa deles. Até dormimos juntos e saímos para trabalhar no dia seguinte. Gosto de ter esse contato esporádico, que serve tanto para tomar uma cervejinha quanto para um ménage”, conta ele, que reforça: “Antes de tudo, somos amigos. É sem neura e com leveza, algo que raramente encontramos em uma relação mais tradicional”.
“É como se estivesse entrando na casa de duas pessoas, enquanto convidado. Fico lisonjeado de fazer parte dessa troca.”
Enquanto Gustavo se tornou uma quentinha por simples e espontânea vontade do universo, Alice*, de 29 anos, adotou uma postura mais ativa e foi atrás de seu instinto. “Estar em um modelo [fechado de relacionamento] me causava certa angústia, e eu não sabia nomear o porquê. Quanto mais fui estudando e entrando em contato com outras formas de afeto, mais confiante me senti para comunicar esse desejo para a minha parceira”, reflete.
A arquiteta revela que, num primeiro instante, a namorada (com quem está há sete anos) sentiu dificuldades para digerir a ideia. Contudo, após muito diálogo, paciência e confiança mútua, ambas puderam se desapegar dos moldes tradicionais de se relacionar.
O test drive rolou com um casal de amigos que passavam por um processo semelhante. O sexo foi bom e, motivadas pela experiência animadora, decidiram embarcar de vez no marmita-verso com uma desconhecida. Deu bom? Não de cara. “A transa foi bacana, havia atração entre nós. O problema foi que ela precisou ficar em casa por três dias, pois estava apenas de passagem por São Paulo. Não sei se a convivência excessiva estragou, mas senti um incômodo no ar. A comunicação não fluiu e a marmita também não fez questão de ajudar”, desabafa.
“Estamos abertas a lidar com o ciúmes juntas, sem buscar no controle a saída para as nossas inseguranças.”
De qualquer forma, a vibe agridoce não as impediu de realizar outras tentativas. Tanto é que, há dois meses, Alice e a parceira deram match com uma jovem no Tinder que veio a ser a marmita oficial do casal. “Tivemos uma ótima conexão afetiva e sexual, e tem sido bem bacana conhecê-la. É uma novidade confortável, porque as coisas estão funcionando de maneira simples, com bastante conversa. Por meio dos nossos papos, percebi que compartilhamos hobbies e outros interesses. Temos até o mesmo senso de humor! É sempre divertido quando nos juntamos.”
E a clássica pergunta (e receio) sobre o ciúmes vem acompanhada do conselho: “Isso faz parte de qualquer vínculo amoroso. A questão é que estamos abertas à possibilidade de lidar com o ciúmes juntas, sem buscar no controle a saída para as nossas inseguranças”, compartilha Alice.
“Quando surge um desconforto, o acolhemos, nos abraçamos e reafirmamos tudo o que já construímos nesses sete anos de relacionamento. Tentamos ser o mais honestas possível, fazendo os acordos necessários.”
Nada de novo na terra do Sol
O termo-piada pode até ser novidade, mas a prática definitivamente não é. Luciane Cabral, sexóloga da Gleeden, principal plataforma de relacionamentos extraconjugais no Brasil, afirma que as pessoas tendem a achar que a juventude quer experimentar tudo e que as coisas eram diferentes antes. Mas não é bem assim…
“Somos extremamente diversos, mas acabamos sendo afetados por dogmas religiosos e culturais que são passados de geração em geração sem nem entendermos o porquê. Por isso, fico empolgada que as pessoas estejam se desconstruindo. Quem ainda não está nesse caminho [de autoconhecimento], precisa correr atrás para se habituar com as novas possibilidades de ser feliz”, diz Cabral.
Dá um medinho? Claro que sim, e não há nada de errado nisso. O ponto é como você vai lidar com esse cenário. Luciane nos lembra que só podemos saber se gostamos de algo ou não após experimentá-lo. “O mais importante é embarcar nas marmitas com a autoconfiança em dia, pois tendemos a acreditar que amor é sinônimo de possessividade. Só porque casei ou estou namorando, a pessoa é minha. E a verdade é que ninguém é de ninguém [no sentido de posse]. Não temos poder sobre o sentimento do outro”, afirma a especialista.
“O mais importante é embarcar nas marmitas com a autoconfiança em dia, pois tendemos a acreditar que amor é sinônimo de possessividade.”
Ela pontua que, sem que percebamos, o romantismo antigo ainda atrapalha as possibilidades de prazer disponíveis por aí. “Experiências sexuais e amor são coisas diferentes. É ótimo experienciar sensações novas juntos, isso traz mais proximidade. Não é legal ter aquela ideia de que a nossa melhor fase erótica foi antes do casamento. Em união, é possível viver uma relação que é prazerosa, gostosa e potente. Acredite: colhemos muitos frutos ao nos permitir abraçar a sexualidade em todas as suas facetas”, pondera.
Para entrar na brincadeira
Diquinhas para marmiters iniciantes e veteranos? Temos! A principal, segundo a psicóloga Nadia Cristina Ferreira, é tomar cuidado para não objetificar a terceira pessoa. “Tenha responsabilidade afetiva e saiba que a marmita não é apenas um brinquedo do casal. É necessário ser honesto sobre as expectativas e os sentimentos que podem vir à tona no decorrer da relação. Se alguém estiver desenvolvendo sinais de afeto, esteja aberto ao diálogo”, diz.
Isso está intimamente ligado ao segundo ponto: dê abertura para que as conversas aconteçam. Para Nadia, não adianta querer viver essa realidade sem estar disposta a lidar com as questões alheias. E, por fim, estabeleça um vínculo de horizontalidade na dinâmica.
“A marmita não deve ser tratada como alguém menos importante. Claro, isso não quer dizer que a terceira pessoa será tão prioridade quanto aquela com quem nos relacionamos há anos, até porque estamos falando de um casal com uma história construída. Porém, é necessário ter empatia: os sentimentos do outro não são menos válidos que os seus só porque ele recém chegou em sua vida”. E aí, bateu uma fominha?