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Sofri bullying e hoje ajudo a resgatar a autoestima de mulheres

Fran Moreira conta a sua jornada de reconstrução de autoestima e empreendedorismo

Por Kizzy Bortolo
7 nov 2023, 05h58
A empresária Fran Moreira. (Divulgação/Divulgação)
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A empresária capixaba, Fran Moreira, de 38 anos, nasceu em Castelo, no interior do Espírito Santo onde, desde a infância, sofria bullying, passava por olhares tortos e preconceito devido ao seu tom de pele ser diferente dos seus pais e irmãos. Muitos a achavam com a pele ‘escura’ demais para pertencer a uma família de descendentes de italianos.

Com isso, durante toda a adolescência, sua autoestima foi ficando cada vez mais abalada e diminuída, fazendo com que não quisesse mais sair com as amigas, se arrumar, nem ter mais nenhuma vaidade. Fran cresceu, se fortaleceu, ressignificou tudo isso, passando a se olhar de forma diferente, com empatia, passou a se amar e, sobretudo, a se aceitar como é.

Foi quando começou a empreender, criando do zero uma marca de maquiagens e cosméticos femininos, a fim de realçar a beleza da mulher brasileira, tendo ela múltiplas cores, tons de pele e texturas de cabelo. Seu maior compromisso e lema de vida é poder acolher essas mulheres, lhes proporcionando, através das maquiagens, um resgateda autoestima, muitas vezes esquecida e abalada, tal como ela mesma vivenciou e, literalmente, sentiu na sua pele.  Abaixo, você conhece sua história, que foi compartilhada com Kizzy Bortolo

A história de Fran Moreira

“Nasci em 1985, em uma cidadezinha do interior do Espírito Santo chamada Castelo. Meu pai é descendente de italiano e minha mãe, a típica brasileira com mistura de raças. Sou a mais velha de três filhos. Tive uma vida bem simples na minha infância, onde minha mãe fazia biscoitos para vender e meu pai trabalhava de vendedor no balcão de uma loja de material de construção. Quando eu tinha sete anos, com aajuda da minha avó, que me colocava sob uma mesa na calçada em frente de casa, me lembro que eu pegava alguns brinquedos meus, colocava preço e brincava de vendinha.  Vendia para os que passavam na rua. E vendia tudo!

Já me sentia empreendedora desde menina, mesmo sem nem conhecer ainda o que significava essa palavra. Hoje, ela faz todo sentido para mim e entendo esse sentimento genuíno de querer empreender. Quando completei oito anos, meu pai começou a empreender e prosperar, montando seu próprio negócio. Sempre tive muito orgulho de como ele cresceu e empreendeu começando, assim, do zero. Eu sendo a filha mais velha, vi de perto e acompanhei toda essa mudança financeira em nossas vidas. 

Devido ao fato da mistura de raças entre meu pai e minha mãe, nasci com a pele mais escura e com o cabelo cacheado em comparação aos meus irmãos. E isso, durante anos, foi um dilema e um problema meio que ‘silencioso’ na minha vida. Me lembro que, na adolescência, quando eu tinha 16 anos, comecei a querer sair, me arrumar e passei a frequentar algumas lojas de roupas mais badaladas da minha cidade.

Essa lembrança, tenho marcada muito forte na minha cabeça. Eu entrava em algumas lojas de roupas e as pessoas simplesmente me olhavam torto, com um certo desprezo e sem muita simpatia devido a minha cor de pele. Aquilo me machucava demais. Ao entrar na loja, mal me perguntavam o que eu queria, como se eu não fosse tão bem-vinda ou não pertencesse àquele mundo.

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E logo vinha um sentimento horrível e, às vezes, rolava até um certo medo. Sempre cabisbaixa, tinha que dizer de quem eu era filha e aí percebia que o tratamento mudava e logo me chamavam para entrar na loja, me mostravam os lançamentos das roupas e tudo mais. Passei por essa situação inúmeras vezes.

Nossa cidade, Castelo, é de colonização italiana, portanto, rolava essa distinção de raças, o que é lamentável. Claro que toda essa indiferença fazia com que me sentisse inferior e fragilizada. Me via como uma menina feia, me sentia pequena, diminuída, menor que os outros. Não gostava do meu cabelo cacheado, nem da minha cor de pele, porque já percebia que, por causa disso, eu era tratada com diferença em relação as outras pessoas. 

Nessa mesma idade, aos 16 anos, saí da escola pública, onde estudei a minha infância inteira, e fui estudar em uma escola particular para me preparar para o vestibular. Lá percebei ainda mais diferença, que passou a ser gritante. Como já passava por isso desde muito menina, achava que era normal me sentir ‘inferior’ aos outros e, de fato, naquela época, não entendia ainda que eu estava sendo vítima de preconceito.

Acreditava que preconceito acontecia apenas proferindo palavras racistas. Mas, desde muito criança, percebi que o racismo também nos atinge através de um olhar de desdém ou de desprezo. Nessa idade, a maioria das meninas querem sair, se arrumar, se maquiar, se enfeitar, quando eu só queria, cada vez mais, me esconder do mundo e ficar em casa, por me sentir feia e inadequada para aquele lugar onde vivia.

Meus pais nunca souberam de nada, guardava tudo aquilo que ouvia só para mim. Nunca falei nada disso com eles, pois não queria que eles também se sentissem tristes ou inferiores por eu ter passado por aquilo e, conhecendo bem a minha mãe, sabia que ela iria até a escola tirar satisfação para me defender. E aí, sim, minha vergonha seria maior. 

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Carreguei (e ainda carrego!) essa ferida por muitos anos. A falta de autoestima pode detonar a vida de uma pessoa. Estava tão acostumada a receber só o pouco que as pessoas me ofereciam, que ainda achava que era o suficiente para mim. Como consequência, passei por um relacionamento abusivo, onde fui totalmente dependente emocionalmente da pessoa que só me manipulava e ainda me agredia. Mas consegui, com custo, deixar tudo isso para trás. 

Em 2009, quando já estava no quarto período da faculdade de administração de empresas, engravidei do meu namorado, Rubens, que veio a se tornar meu marido e é, sem dúvidas, o grande amor da minha vida! Nessa época, tive que parar a faculdade, pois com a gravidez ficou bem difícil continuar. Tive meu filho, Nicollas, e o dia do seu nascimento foi a maior felicidade da minha vida!

Foi exatamente nessa época que começaram os problemas na minha pele, como acne, manchas e melasma. Nunca fui muito de me cuidar, lá em casa minha mãe que sempre foi muito vaidosa e tentava me ensinar como cuidar da pele. Ainda com resquícios de uma baixa autoestima, não usava nada e parecia não acreditar nos cosméticos de tratamento que ela me apresentava. Maquiagem, então, usava pouquíssimo.

Passei, então, a assistir muitas dicas da blogueira Camila Coelho, lá nos primórdios, quando ela começou no Youtube, e aprendi muito com ela. Ali, passei a me interessar mais pelo universo dos cosméticos e das maquiagens e a maquiar as pessoas para testar tudo que aprendia na internet. Adorava maquiar minha mãe, minha irmã, minhas primas e amigas. Passei a ter mais vaidade e passei a cuidar mais de mim!

Com a autoestima já quase recuperada, em fevereiro de 2011, engravidei novamente de minha caçula, Isadora, que preencheu ainda mais a minha vida de alegria! Minha pele piorou ainda mais e voltei à estaca zero por me sentir feia. Quando saía para algum evento ou festa, logo ia pra casa, principalmente quando a minha maquiagem saía da pele.

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Por ter muita acne e manchas na pele, passei a ir a todos os lugares somente maquiada. Eu não conseguia conversar com as pessoas olhando no rosto delas, com medo de repararem nas manchas escuras na minha face. Minha vida e minhas escolhas giravam em torno desse meu problema de pele. 

Na época, eu não tinha grana para investir em maquiagens caras e mais resistentes. Achava que nunca teria como reverter aquilo, que estaria fadada a viver para sempre dessa forma. Minha mãe me presenteou com alguns cremes bons e, com o tempo, percebi que estava melhorando e minhas manchas. As espinhas também foram secando. Ufa! Que alívio! A mulher que passa por gestações tão próximas, como passei, tem em seu corpo uma explosão de hormônios. E comigo não foi diferente. 

Comecei a melhorar a minha alimentação. Fui vendo muita melhora e, consequentemente, me sentindo mais confiante, mais sociável. Passei a atender os clientes com mais segurança e com sorriso no rosto. Nem sei explicar como eu estava me sentindo, tão pronta para viver o que eu tinha me privado até então, estava tão leve, aliviada e feliz. 

Em 2018, ainda trabalhava com meu pai e sentia uma enorme vontade de construir meu próprio negócio, de empreender, de não me limitar apenas ali na minha cidade. Queria algo em que eu pudesse, realmente, fazer a diferença. Já vendi sapatilhas, cosméticos e estava a todo momento pesquisando e pensando no que eu poderia fazer.

Nesse mesmo ano, meu pai contratou um consultor para sua loja e eu conversava muito com ele sobre essa minha vontade de ter meu negócio. Tenho muito orgulho do meu pai, por esse lado empreendedor dele. Minha mãe também já teve os negócios dela e sempre me aconselhava: ‘seja independente, não dependa dos outros, tenha seu próprio dinheiro’. Mamãe tem uma força que me motiva até hoje.

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Depois de tanto falar com o consultor sobre a minha grande vontade de construir meu próprio negócio, me lembro que ele me perguntou: ‘mas o que você gosta de fazer que possa ajudar outras pessoas?’

Na mesma hora me lembrei do que eu passei, da baixa autoestima, de como eu me sentia e vivia antes e como começar a me cuidar foi significante. Pensei em quantas outras mulheres ainda não sabem da sua força e não tem uma autoestima elevada.

Queria mostrar que a autoestima é muito mais do que só a aparência física, é sobre entender a si mesmo, seus pontos fortes, ter autoconfiança, e como isso afeta diretamente a vida pessoal e profissional. Mas, como conseguiria ter uma marca de cosméticos diante de marcas tão grandes e já consolidadas há tanto tempo no mercado?

Eu ainda era tão pequena, não tinha dinheiro nem para começar a investir. Parecia algo tão distante e tão impossível. Nunca vou me esquecer do que o consultor me disse: ‘As grandes marcas não começaram grandes, elas também começaram pequenas. Só vai e começa. Dê o primeiro passo!’ 

Comecei pesquisando tudo sobre como fazer as maquiagens e não conseguia muitas informações. Como eu não tinha dinheiro o suficiente para investir e não tinha nenhuma informação, ouvi muito ‘não’. Mas não desisti! Até que encontrei uma pessoa maravilhosa que me ajudou muito! Ela, literalmente, pegou na minha mão e me ajudou em absolutamente tudo por dois anos, até lançar meu primeiro produto.

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Essa pessoa me ensinou, me treinou, me direcionou. Quando temos atitude e confiança para dar os primeiros passos em direção ao que queremos, as oportunidades e as pessoas certas vão surgindo no nosso caminho. Comigo aconteceu exatamente assim.  

Sempre tive fama de sonhadora, desde pequena, pois só queria fazer coisas que pareciam impossíveis. Meu pai já tinha me ajudado em algumas dessas ideias que não deram certo. Decidi resolver tudo por mim mesma e contar só quando eu conseguisse de fato. Com o apoio do meu marido, com o salário que juntei por meses e meses, mais o valor do meu seguro desemprego, fui resolvendo as burocracias e o que mais precisava para seguir adiante. E fui indo…

Quando chegou o primeiro teste de cores dos batons da minha coleção, pulei de alegria e até chorei. Foi um momento mágico para mim!

Tentei ressignificar tudo o que vivi, passando a me olhar de forma diferente, com mais empatia. Passei a me amar mais, a acreditar mais em mim e, sobretudo, a me aceitar como sou. Sabemos que as mulheres do nossos país têm múltiplas cores, tons de pele e texturas de cabelo. Meu maior compromisso e meu lema de vida é acolher todas as mulheres, lhes proporcionando, através da minha linha de maquiagem, um resgate da autoestima, muitas vezes esquecida e abalada, tal como eu mesma, literalmente, senti na pele.    

Em 2019, em uma manhã, acordei e falei para o meu marido: ‘essa noite sonhei com o nome da marca, um nome cheio de significados e sentido.’ E assim nasceu minha linha de cosméticos. Um ano depois, em 2020, já estava tudo programado para o lançamento. Fiquei muito assustada com a pandemia de Covid-19, mas decidi não me paralisar mais uma vez.

No dia 27 de outubro de 2020, lancei o primeiro produto da minha linha. Fiz tudo com ajuda do celular de uma amiga e a disposição e boa vontade de duas outras que foram as modelos das fotos. Fizemos todos os vídeos e a divulgação. Consegui uma pessoa para editar e, assim, fiz o lançamento. Incrivelmente, o lançamento foi um sucesso, foi tudo muito lindo e especial. Meus produtos foram tão bem aceitos, que não demorou muito para esgotar o nosso primeiro estoque.

Aos poucos, fui lançando outros produtos, como sombras, iluminadores, sérum para hidratar o rosto, outras cores de batons. Expandi a minha linha de cosméticos. Tive muitos feedbacks maravilhosos de mulheres que estão descobrindo o autocuidado e a autoestima, tal como aconteceu comigo. Como é gratificante ouvir essas histórias!

Sinto como se fosse eu, novamente, renascendo ali a cada produto lançado! Por causa deste meu sonho, ganhei tantas amigas especiais que me ajudam muito. 

Hoje, estou caminhando e vendo meu projeto crescendo, chegando até a locais como Panamá, Uruguai, Orlando, Miami, Flórida, Nova York, França e já com algumas propostas para fixar a marca no exterior.

Participamos, recentemente, do ‘Bazar da Preta Gil’ para apoiar o projeto social incrível que ela ajuda. Conheci pessoalmente a empresária Bruna Tavares, uma empreendedora incrível do ramo dos cosméticos e maquiagens. Ela foi uma das minhas maiores inspirações desde o começo. Sou muito grata por essas mulheres incríveis e fortes que usam meus produtos e que tanto admiro!

Este ano, participei da São Paulo Fashion Week, do desfile da grife Santa Resistência. Chorei sozinha no cantinho do desfile, lá no backstage, ao ver onde os meus produtos estavam chegando. Foi mais uma grande realização para mim! Nem sei descrever o que senti! Realizada! 

Desde o início até aqui, minha caminhada foi longa e, claro, já pensei muitas vezes em desistir. Já chorei, já me frustrei, já me desesperei, já fiquei totalmente sem grana para prosseguir e investir, mas a minha motivação é o meu propósito.

Tenho um caderno, que uso desde o início da minha empresa, onde escrevi no cabeçalho e em todas as folhas frente e verso de caneta vermelha e em letras garrafais: ‘NÃO DESISTA!’

Leio todos os dias e me lembro sempre do meu maior objetivo!

Sei que ainda tem muita coisa para acontecer, novos projetos virão aí. Quando olho para trás e vejo a minha trajetória até aqui, me emociono e me orgulho demais. Sei que tenho ainda muito mais a conquistar. O importante mesmo é nunca desistir dos nossos sonhos!”

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