Raphael Montes: “Muita gente não tem coragem de ler meus livros”
Autor brasileiro de suspense acaba de lançar seu primeiro livro com uma protagonista mulher e é um dos roteiristas do filme sobre Suzane von Richthofen
Histórias macabras, crimes violentos e cenas de revirar o estômago. Se você estiver lendo um livro com uma narrativa como essa, e ele fizer parte da literatura nacional, pode ser que você esteja lendo uma obra de Raphael Montes.
O escritor carioca, hoje com 28 anos, teve seu primeiro romance publicado, intitulado “Suicidas”, em 2012. Mas foi com “Dias Perfeitos” que o autor, aos 24 anos, alcançou seu grande público e teve os direitos de tradução vendidos para 22 países. Seu currículo já conta com cinco obras publicadas, entre elas “Jantar Secreto” (2016), também sucesso de vendas e crítica.
Em busca de novos desafios, Raphael lança agora “Uma Mulher no Escuro”’, trazendo pela primeira vez uma protagonista mulher. “Foi muito difícil no início, contei com um grupo de amigas e enviava questões femininas a elas, inclusive sobre sexo. Depois de um tempo a história engrenou e a personagem tomou as rédeas, ela passava a reagir sozinha”, explica.
A nova obra apresenta Victoria no papel central, uma personagem diferente de tudo o que já havia escrito. “É uma personagem de trajetória heroica, algo novo, já que meus outros títulos trazem anti-heróis, que cometem crimes para se dar bem”, explica o autor. “Não faz sentido para mim fazer livros parecidos entre si. Se alguém não gostar de um livro meu não quer dizer não irá gostar do próximo. ”
O enredo acompanha Victoria Bravo, que tinha quatro anos quando um homem invadiu sua casa e matou sua família a facadas, pichando seus rostos com tinta preta. Única sobrevivente, ela agora é uma jovem solitária e tímida, com pesadelos frequentes e sérias dificuldades para se relacionar. Seu refúgio é ficar em casa e observar a vida alheia pelas janelas do apartamento onde mora, na Lapa, Rio de Janeiro.
“É uma personagem complexa, interessante, tive que ter cuidado, pois não queria que ela fosse uma coitada. Ela é dona de si, carrega suas angústias, mas ela tem uma força”, narra o autor.
Violência gráfica
Suas obras têm a qualidade de deixar o leitor querendo mais, ávido para chegar nas últimas páginas e se deparar com um final daqueles surpreendentes. Entretanto, algumas descrições extremamente violentas e até sórdidas exigem estômago.
“Violência gráfica é uma marca minha. Muita gente não tem coragem de ler meus livros justamente por isso. Me propus o desafio de escrever um livro em que o suspense está muito mais na tensão do que vai acontecer, nas frases não ditas, do que numa violência física e descritiva. É um livro meu para quem tem curiosidade, mas tinha certo receio. É de algum modo mais popular e menos repulsivo”, detalha sobre “Uma Mulher no Escuro”.
O estilo pertence a Raphael desde seus primeiros textos. Quando adolescente, chegou a escrever na sala de aula o conto ‘A Professora’, disponível online. Se o resultado causou a admiração dos colegas, entre os docentes foi motivo de certa preocupação, mas o escritor sempre levou tudo numa boa. “Cá entre nós, a violência está em todos, cada um expõe de uma maneira. Tem gente que canta, que escreve, e outros não fazem nada disso e cometem atos de violência”, explica.
A fascinação pelo assunto, ele explica, está na parte que envolve a análise do comportamento humano. “Sempre foi muito claro como isso era mais um interesse meu de observação. Inclusive, minha figura decepciona”, diz em tom de brincadeira. “Eu detesto violência real. A parte vulgar não me interessa, o que me interessa é a psicologia”, esclarece.
No processo de criação de seus personagens, a observação é sua principal ferramenta. “Não acredito na ideia do escritor que se isola, vou às ruas conhecer gente nova, vou a festas sozinho. E, claro, tem uma pesquisa extensa sobre traumas infantis, embasados em casos reais, não em um especifico, mas um mosaico que eu costuro para criar um cenário de ficção”, explica.
“A menina que matou os pais”
Seu talento para roteiros mirabolantes se transformou em oportunidades também em vídeo. Colaborou e escreveu roteiros de novelas e séries da Rede Globo e também foi roteirista do longa “Praça Paris” (2018).
Seu mais recente trabalho é “A menina que matou os pais”, filme ainda sem data de estreia e que irá narrar a história do assassinato dos pais de Suzane von Richthofen, planejado por ela e seu então namorado Daniel Cravinhos, em 2002.
O anúncio feito este ano sobre a produção do filme – que vai trazer a atriz Carla Diaz no papel de Suzane – causou alvoroço na internet. Alguns internautas se questionaram sobre a necessidade de dar visibilidade a um crime que chocou o Brasil à época.
“As opiniões estão bem divididas, eu acho que é uma questão especificamente brasileira, porque nós mesmos consumimos séries e filmes policiais estrangeiros inspirados em casos reais. Sem dúvida é um caso que desperta certas emoções, porque é um crime gravíssimo e trágico, mas por causa da internet as pessoas criam fantasias”, defende o roteirista.
Raphael argumenta ainda que o caso é público e que não terá qualquer participação da Suzane: “ela não ganhará nada”. Segundo ele, o interesse da história não está nela, mas sim no crime e no que leva alguém a cometer o ato. O roteiro foi escrito ao lado de Ilana Casoy, criminologista especialista no caso e que acompanhou todos os detalhes. “Sem dúvida Suzane cometeu o crime, não é um filme para inocenta-la, mas para discutir a psicologia”, finaliza.
UMA MULHER NO ESCURO
Autor: Raphael Montes
Editora: Companhia das Letras
256 páginas
Preço médio: R$ 39,90
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