“A gente cria a realidade que deseja”
Ao longo de sua carreira, a diretora de recursos humanos Alessandra da Costa Morrison, 43 anos, desafiou o senso comum e sempre apostou em suas vontades, mesmo que elas contrariassem quem a estava contratando. Deu certo todas as vezes
Comecei a fazer terapia na adolescência, depois de, aos 12 anos, ter perdido um irmão (em um acidente de carro) e, aos 16, um amigo muito próximo. Viver isso logo cedo abalou a ideia de que tudo é eterno. Eu me dei conta de que a vida é efêmera e de que é preciso dar valor ao meu tempo e às coisas que quero. Para mim, tudo deve fazer muito sentido, ter um porquê e um para quê. Nasci em Sacramento, no interior de Minas Gerais. Sou a mais velha de seis irmãos: duas mulheres e quatro homens. A infância foi um período difícil, tinha que disputar a atenção dos meus pais. Mas aprendi a me virar, ir em busca do meu caminho. Aos 18, entrei no curso de administração de empresas da Universidade de São Paulo e já engatei em um estágio. Queria trabalhar, ter meu dinheiro, ser independente. Sonhava em fazer um MBA fora do país. Por isso, quando participei de um processo seletivo de uma grande empresa, logo avisei: ‘Eu venho, mas não vou ficar por muito tempo porque quero estudar fora’. Estranharam: ‘Como alguém entra em um processo já falando que vai sair?’ Mas sempre dei valor à transparência nas relações, tanto pessoais quanto profissionais.
Fui contratada e permaneci no cargo por pouco mais de um ano. Acabei saindo porque recebi uma proposta de uma startup de um grande banco europeu, vaga que me deixava mais perto do sonho do MBA. Algum tempo depois, pedi as contas novamente e me matriculei em uma tradicional escola de negócios na França. Para pagar o curso, havia juntado dinheiro e ainda pegara um empréstimo. Sabia que daria tudo certo e que conseguiria quitar essa dívida. Acredito que a gente cria a realidade que deseja. Sempre investi bastante no meu processo de autoconhecimento com a crença de que a vida é de minha responsabilidade. Não se deve esperar que a empresa faça uma proposta ou ofereça um curso. É preciso se colocar no lugar de protagonista da própria história e se perguntar: ‘O que eu quero?’ Até para dar a energia necessária para que as coisas aconteçam. Sei que, se me perder em desculpas, jamais chegarei lá.
Aos 36, trabalhando em outro lugar, meu desejo era ter um bebê. Já tinha engravidado e perdido duas vezes, mas continuava tentando. Até que me ligaram de uma consultoria para participar de uma seleção para a vaga que ocupo hoje. Eu respondi: ‘Participo do processo desde que não haja problema em estar grávida’. Aí perguntaram: ‘Mas você está grávida?’ Respondi que não, mas que ficaria – tinha certeza de que isso iria acontecer. Ao mesmo tempo, sabia que, se houvesse um candidato sem essa restrição, ele teria mais chance que eu. Mas engravidar era muito importante para mim. Eu já estava com 38 anos, não podia postergar mais. O processo de seleção foi avançando, o que significava que a gravidez não era um impedimento. Em novembro de 2011, meu chefe me entregou a carta de contratação. O único receio dele era de que eu não voltasse depois da maternidade, já que a empresa queria alguém para longo prazo. No Natal, quando ainda nem havia começado a trabalhar, descobri que estava grávida! Esperei completar três meses para comunicar. Trabalhei superbem até o último dia antes da licença.
Ao longo da minha jornada, tenho focado no autoconhecimento e em me cuidar para estar bem. Estou em uma posição profissional em que só posso atuar se estiver muito atenta ao que vem acontecendo. Se me distrair com devaneios, não consigo exercer esse papel. Como mãe de um casal de gêmeos – olha que sorte! – de 3 anos, dou ainda mais valor ao uso inteligente do meu tempo. Ontem fui para casa na hora do almoço para levar meus filhos à escola. Trabalhar em um lugar cuja distância me propicia isso de vez em quando é um critério importante para mim.
À medida que você escolhe focar nas suas questões, vai ficando mais preparada para tomar conta da própria vida. Nunca fui alguém que lamentasse: ‘Não estudei porque o caderno rasgou’. Se não estudei, a culpa é minha. Se tal coisa não aconteceu, é porque eu não fiz. Sempre fui agente, não só na minha vida, mas na empresa em que trabalho e na sociedade. Quero ter o impacto de ajudar as coisas a serem melhores – também para mim.”