A corrida contra a depressão
Conheça a corretora de imóveis Maria Rita, que transformou a sua tristeza em quilômetros de conquistas
A depressão é uma doença que atinge uma em cada cinco pessoas no mundo; 11,5 milhões de brasileiros, duas vezes mais mulheres do que homens.
A Organização Mundial da Saúde havia anunciado que em 2020 a depressão seria a primeira causa de adoecimento e de afastamento do trabalho, superando as complicações cardiovasculares.
O prognóstico foi antecipado; isso vai acontecer em 2018. A razão é simples. “Muitos permanecem sem diagnóstico, com culpa ou medo do estigma e, pior, sob risco de suicídio”, afirma a psiquiatra Giuliana Cividanes, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
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Ela aponta a conturbada rotina e os hábitos contemporâneos como responsáveis pelo crescimento do número de casos. “As pessoas estão adoecendo menos pelos fatores genéticos e mais pelo jeito de viver”, explica a psiquiatra. Alimentação rica em produtos industrializados, sedentarismo, obesidade e stress desgastam as células, que liberam toxinas inflamatórias capazes de prejudicar várias partes do corpo, inclusive o cérebro.
A RECUPERAÇÃO DA DEPRESSÃO
Quanto mais cedo a depressão for detectada, mais rápida é a recuperação. Giuliana ressalta que nem sempre o deprimido consegue dar um passo sozinho para buscar tratamento. “Não adianta dizer a ele para ir ao médico. Um amigo ou familiar precisa marcar a consulta e levá-lo quando ele não tem forças para fazer isso.” A mesma recomendação se estende às outras estratégias não convencionais.
“Vá junto a uma aula de ginástica, por exemplo. Não espere a pessoa ter vontade”, sugere. A psiquiatra acredita que, se ela for levada a romper a dificuldade, a vontade aparece depois. “A repetição e o condicionamento ativam o cérebro, criando novas vias de comunicação entre os neurônios, o que pode ser transformador para quem se vê no fundo do poço.”
A ciência tem demonstrado que as atividades que põem o corpo em movimento e colocam a alma em conexão com o bem-estar, aberta para ajudar o outro, podem funcionar como remédio auxiliar. Evidentemente, só podem ser obtidos bons resultados quando esse tipo de ação está associado à prescrição correta de medicamentos, que corrigem a química cerebral, e à psicoterapia, que atua no sentido de modificar a forma de agir. É preciso recorrer a todos esses recursos para combater a doença.
Em Manaus, vive a corretora de imóveis Maria Rita de Cássia Ferreira Fernandes, 50 anos. Ela perdeu o marido em um acidente de trânsito, aos 36 anos, quando seus dois filhos, gêmeos, tinham 10 anos. Sem formação profissional, desempregada (às vezes ajudava o marido, que era autônomo), morava de aluguel.
“Minha sensação era de ter sido abandonada por todos. Eu me trancava no quarto e ficava mergulhada em tristeza, dor e angústia”, recorda Rita, que passou um mês sem dormir. “Pensei em me matar, mas não tinha coragem de dar um tiro.”
Ela estava fora de forma, sedentária e, então, teve a ideia de sair correndo na expectativa de que acabasse sofrendo um ataque cardíaco. “Naquela insanidade, querendo morrer, corri fazendo ziguezague no meio dos carros, que desviavam. Não morri, mas ao voltar para casa finalmente consegui dormir”, relata.
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Enquanto fazia, desesperada, aquela corrida, encontrou um amigo que falou sobre uma maratona. Ela se inscreveu para um percurso de 65 quilômetros sem ter treino algum para isso. “Queria me destruir. Completei a prova em 11 horas. Corri, caminhei e me arrastei. Cheguei arrebentada”, diz. A corretora de imóveis andou torta por uma semana, com todos os músculos doendo muito. Mas, ela crê, foi a sua salvação.
“Correr me fez respirar, sentir o corpo, oxigenar o cérebro – o que libertou meus pensamentos mórbidos e me colocou no momento presente”, afirma. Ela passou a olhar a vida de outro modo, conheceu pessoas que lhe deram novas aspirações. “O mundo se abriu. Já corri na África, na Índia, nos Estados Unidos… Hoje me sinto mais completa e acabei de entrar na faculdade de jornalismo.”
Exercícios, especialmente os aeróbicos, como a corrida, melhoram a depressão, atesta a psiquiatra Giuliana. O efeito foi comprovado em revisões publicadas em 2016 no Journal of Psychiatry Research, listando 29 estudos com 1 057 participantes, e no Journal of Affective Disorders, com 23 pesquisas, totalizando 977 pessoas analisadas. A atividade física até previne a doença, segundo um trabalho norueguês veiculado em outubro, que acompanhou 33 mil adultos por 11 anos. “Ela reduz o stress e estimula a produção de novas células nervosas”, acrescenta a médica.
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