Médico Renato Kalil é investigado após denúncias de violência obstétrica
"Ele falava da minha vagina como se eu não estivesse ali", diz jornalista do The Wall Street Journal sobre o assédio que sofreu do médico
Nesta segunda (13), o ginecologista e obstetra Renato Kalil, conhecido nas redes sociais como Dr. Kalil, foi denunciado no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) por violência obstétrica, após o relato da influenciadora digital Shantal Verdelho.
Em suas redes sociais, a influencer disse ter sido vítima de violência durante o parto de sua filha mais nova, Domênica, que nasceu em setembro, em São Paulo. Segundo ela, o médico usou palavrões contra ela e expôs suas partes íntimas para o pai da criança e para terceiros.
O obstetra nega as acusações e em um comunicado oficial ele afirma que “o parto da Sra. Shantal aconteceu sem qualquer intercorrência e foi elogiado por ela em suas redes sociais durante trinta dias após o parto”.
“Demorei para perceber o que tinha acontecido porque na hora do parto eu tava em uma outra dimensão. (…) Foram várias posturas dele muito ruins e acabou sendo horrível meu parto. Se eu mostrar [o vídeo], vocês vão sentar e chorar”, contou Shantal em áudios vazados nas redes sociais.
Após a repercussão do relato, a jornalista britânica Samantha Pearson, correspondente no Brasil do jornal norte americano The Wall Street Journal, decidiu contar sua história. Em entrevista ao jornal O GLOBO, a também paciente de Kalil relatou ter passado por assédio moral na gravidez de sua segunda filha, nascida no último ano.
Em 2015, na gravidez de seu primeiro filho, a repórter procurou o médico, que tinha boas indicações e era considerado referência na obstetrícia na época. Mas, no parto natural e sem anestesia, Samantha se deparou com assédios de Kalil. Ela ouviu o ginecologista dizer a seu marido que tinha “feito um ponto ali, que ele não ficasse preocupado, porque tava tudo bem”.
“Ele falava da minha vagina como se eu não estivesse ali. Passei semanas chorando sozinha em casa, sem saber se ele tinha dado mais pontos do que o necessário, com medo de transar, de sentir dor. Fui a outros médicos para saber se isso podia ser checado, mas não podia. Foi horrível”, contou.
As coisas começaram a desandar nessa ocasião, mas a ficha só terminou de cair em 2019, na segunda gravidez da jornalista. No oitavo mês da gestação, ela passou em uma consulta com Kalil, que, na frente de sua equipe, comentou: “Samantha, você vai ter de emagrecer porque senão seu marido vai trair você”.
A fala do médico a afetou e logo em seguida, ela desabou a chorar e decidiu que o parto não seria com Kalil. Samantha teve anorexia na adolescência e hoje consegue identificar claramente o assédio moral que sofreu.
“Hoje percebo que eu não era a gringa maluca, eu estava certa, nada daquilo era normal. Ele disse aquilo na frente de sua equipe, eu estava quase nua, totalmente exposta. Meu marido estava lá e sempre percebi que o que ele queria o tempo todo era agradar meu marido, como se eu, a paciente, não estivesse lá”, lembra. O vídeo de Shantal a inspirou a falar sobre o que aconteceu com ela.
Denúncia de Shantal
O parto da influenciadora digital durou cerca de 48h e durante todo período, ela relata xingamentos e violência pela parte do médico. Vídeos do ocorrido vieram à tona e houve grande repercussão do público nas redes sociais.
Renato Kalil, que aparece falando: “Faz força, por**”, nega ter tido conduta inadequada e afirma ainda que os vídeos foram editados. O sonho de ter um parto humanizado passou longe da realidade.
“Quando a gente assistia ao vídeo do parto, ele me xinga o trabalho de parto inteiro. Ele fala ‘Por**, faz força. Filha da mãe, ela não faz força direito. Viadinha. Que ódio. Não se mexe, porra’… depois que revi tudo, foi horrível”, relata a influencer nos áudios vazados.
De acordo com ela, Kalil não gostou de sua escolha pessoal por não fazer a episiotomia, procedimento cirúrgico no períneo para facilitar a saída do bebê, e “rasgou com a mão”.
“Ele não espera ver se vai precisar ou não vai (da episiotomia). Tem o vídeo dele rasgando com a mão, a bebê não estava nem com a cabeça lá, não tinha a menor necessidade, era só para eu ficar toda arrebentada e ele falar ‘viu como precisava'”, contou Shantal.
E continua: “Ele chamou meu marido e falou: ‘Olha aqui, toda arrebentada. Vou ter que dar um monte de pontos na perereca dela’. Ele falava de um jeito como ‘olha aí, onde você faz sexo, tá tudo fodido’. Ele não tinha que fazer isso. Ele nem sabe se eu tenho tamanha intimidade com meu marido”.
Ao G1, a assessoria de imprensa de Shantal informou em nota que “os vídeos e o áudio foram enviados em um momento de troca, desabafo e compartilhamento com suas amigas, a respeito de maternidade e sobre os suas escolhas de obstetras. A intenção era unicamente dividir sua experiência de forma privada e com pessoas mais próximas”.