Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Black das Blacks: Claudia com preço absurdo

Coluna da Liliane Prata: Dorina Nowill e o brilho nos olhos

Nossa editora e colunista escreve sobre a alegre luta da professora e ativista, tema do primeiro documentário brasileiro produzido pela HBO

Por Liliane Prata
Atualizado em 28 out 2016, 09h01 - Publicado em 23 jun 2016, 17h50
Divulgação/Fundação Dorina Nowill para Cegos
Divulgação/Fundação Dorina Nowill para Cegos (/)
Continua após publicidade

Esta semana, vi o documentário Dorina Nowill – Olhar Para o Mundo, sobre a professora e ativista que criou a fundação que leva seu nome.

Nascida em São Paulo, em 1919, Dorina ficou cega aos 17 anos, quando estava na casa de uma amiga vendo suas fotos de viagem. A hemorragia de causa desconhecida ocorreu de uma hora para outra: como ela descreve no filme, foi como se a sua visão tivesse sido bloqueada subitamente por uma cortina de sangue. Mas não é a descrição do momento trágico o que mais chama a atenção na produção de Martha Nowill, neta de Dorina (aliás, em cena do documentário, Dorina diz não pensar naquele dia como trágico. O “trágico” aqui não é dela, mas meu, que enxergo e não convivo com ninguém que tenha deficiência visual, vejam só). Para mim, o mais marcante foi seu pragmatismo risonho. “Viver sem enxergar é mais difícil, mas é possível seguir feliz apesar disso”, ela conta em certo momento no documentário. De fato, para ela, foi possível trabalhar, se realizar, viajar pelo mundo, ter filhos e se dedicar com entusiasmo à inclusão dos cegos na sociedade. Me impressionou também seu tom nas entrevistas – leve e espirituoso.

É, de fato, “trágico” não é uma palavra que cabe bem aqui. Funciona melhor aquela expressão “brilho nos olhos”. Dorina perdeu a visão, mas conservou seu brilho nos olhos até o fim da sua vida, aos 91 anos.

Foi preciso muito brilho nos olhos para levantar doações, estudar por mais de um ano nos Estados Unidos, trazer para o Brasil novas tecnologias de acessibilidade para cegos, lutar por leis como a que obriga as escolas regulares a aceitar alunos cegos, ser presidente do Conselho Mundial dos Cegos, discursar na Assembleia Geral da ONU em 1981. Dorina me inspirou porque foi bem-sucedida em algo que valorizo muito – lidar bem com a frustração. Particularmente, acho que esse é um dos maiores desafios e também um dos maiores sinais de maturidade emocional que alguém pode ter: manter o brilho nos olhos para tocar bem a vida com a vida que se tem.

Sua visão pode ser perfeita. Mas, com certeza, um dia, você quis um emprego e não conseguiu. Ou prestou um concurso e não passou. O namorado com quem você queria casar terminou tudo, ou o proprietário pediu de volta o apartamento que você adorava, ou então, simplesmente, você acordou bem, mas aí leu o jornal e se frustrou com o fato de que o mundo, bem, o mundo é um lugar bem diferente do que a gente gostaria que fosse (essa, a mãe de todas as frustrações? O pano de fundo angustiante e permanente, pelo menos para os mais melancólicos?). Enfim, não importa de que forma, a frustração vem: você pediu um hambúrguer e veio salada, choveu no dia da praia, choveu na semana, no ano – outro dia, aliás, li no meu feed alguém dizendo que viver era aproveitar um ou outro instante de sol em meio a uma temporada de chuvas (achei deprê, mas criativo).

Continua após a publicidade

Abraçar a vida que a gente tem, conciliando nossas expectativas com o que as circunstâncias acabaram virando, e seguir razoavelmente bem (no caso de Dorina, excepcionalmente bem, admiravelmente produtiva): eis uma bela meta, ao menos para os que querem manter a sanidade mental em meio ao caos. Me incluo nesse grupo.

Quando eu era mais jovem, tinha dificuldade em aceitar as coisas do jeito que as coisas eram. As minhas coisas e as coisas do mundo. Com o passar do tempo, fui aprendendo quando aceitar não era um ato de resignação, mas de coragem: coragem para seguir firme pelo oceano adentro, apesar do tempo ruim. Abreviar a birra existencial não nos impede de lutar por algo quando nos sentimos injustiçados ou consideramos o motivo importante: só não nos tira a alegria da luta. Obrigada, Dorina, por ter me lembrado disso. Obrigada, Martha, pela linda iniciativa de produzir o documentário sobre sua avó.

Uma luta alegre: assim foi a luta de Dorina, assim pode ser a nossa.

Continua após a publicidade

Liliane Prata é editora de CLAUDIA e escreve semanalmente aqui no site. Para falar com ela, clique aqui.

 

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

SUPER BLACK FRIDAY

Digital Completo

Moda, beleza, autoconhecimento, mais de 11 mil receitas testadas e aprovadas, previsões diárias, semanais e mensais de astrologia!
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 1,99/mês
SUPER BLACK FRIDAY

Revista em Casa + Digital Completo

Receba Claudia impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
De: R$ 26,90/mês
A partir de R$ 9,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$23,88, equivalente a R$1,99/mês.