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Black das Blacks: Claudia com preço absurdo

“Só a investida de um abusador, mesmo sem o ato consumado, é traumática”

A leitora Cilene* sofreu abuso psicológico e temeu ser estuprada pelo pai. Ela considera comportamentos dele inadequados

Por Da Redação
27 ago 2020, 09h00
 (Palmiro Domingues/Getty Images)
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“Meu relato é motivado por todos os outros depoimentos dolorosos que tenho lido aqui. Eu também nunca falei nem escrevi nada a respeito da minha experiência. Eu tinha 16 anos e estava na cozinha com o meu pai, contando sobre uma coisa engraçada que tinha acontecido na escola. Minha mãe tinha saído. Ele se aproximou de mim sem dizer nada e me abraçou. Achei estranho, meu pai não me abraçava, ele não era carinhoso. Cheguei a perguntar: “O que foi?”. Ele tinha uma expressão estranha, maliciosa. Senti que ele ia colocar a mão entre as minhas pernas, então me desvencilhei rápido e entrei no meu quarto. Eu estava perplexa, não tinha entendido o que estava acontecendo e não sabia se eu tinha motivos para achar tudo aquilo estranho. Me convenci de que era coisa da minha cabeça e tentei esquecer.

Nessa época, meu pai estava estranho. Ele ficava de cueca em casa, aquilo não era um costume nosso. Às vezes, eu estava deitada no sofá assistindo TV, ele sentava ao meu lado e pousava a mão entre as minhas coxas. Não acontecia mais nada, mas aquilo era tão invasivo. Eu oscilava entre me desvencilhar ou fazer de conta que não estava acontecendo nada. É incrível como ficamos impotentes e duvidamos de nós mesmas nessas situações.

Cerca de dois anos depois do primeiro ocorrido, eu estava feliz me preparando para ir viajar para a praia com as minhas amigas. Estava no quarto experimentando um biquíni. Meu pai abriu a porta de supetão e me perguntou algo. Eu fiquei constrangida, me cobri com uma peça de roupa e pedi pra ele sair. Ele me olhou com a mesma malícia daquela vez e pediu para me olhar. Eu disse que não e pedi novamente pra ele sair. Ele insistiu de um jeito nojento, parecia outra pessoa. Empurrei ele pra fora, lembro da força que eu fiz pra fechar a porta. Senti muito medo e novamente aquela confusão incrédula da primeira vez. Mas hoje eu sei o que me causou tanta repulsa nesse episódio: naquele momento, aquela pessoa diante de mim não era pai. E me tratava como uma mulher que pudesse ser seduzida. Sinto um nojo imenso disso e até hoje não me conformo como aquilo foi possível.

Diferentemente da primeira vez, contei pra minha mãe exatamente o que tinha acontecido. Não me lembro da reação dela, mas dias depois ela veio me dizer que tinha conversado com o meu pai e ele disse que eu tinha entendido errado. Ela quis me convencer de que eu tinha entendido errado. Esse foi outro golpe. Me senti extremamente sozinha. Sou filha única e naquele momento entendi que eu tinha que cuidar de mim mesma sozinha. Eu me senti traída pela minha mãe.

Nos dias seguintes fiquei imaginando o que eu faria se algo acontecesse novamente e prometi pra mim mesma que faria o escândalo que fosse necessário pra me defender. Graças a Deus, nunca mais aconteceu nada. Sinto que as minhas reações impediram que algo pior acontecesse. Mas sei que impedi apenas o abuso físico, sentido no corpo.

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A investida de um abusador é violenta e covarde por si só. O abuso emocional, a vergonha e o medo de ser culpada pelo que aconteceu me acompanharam por um bom tempo. Tive épocas de sentir medo de pensar nessas cenas. Hoje elas me afetam menos, mas já me peguei pensando se o meu pai fez algo comigo quando eu era menor ou se ele abusou de outras pessoas. Eventualmente, tenho sonhos em situação de abuso. Ficam marcas.

Hoje convivo normalmente com os meus pais, mas não somos próximos. Vivemos em cidades diferentes, o que pra mim é libertador. Sinto que eles nem me conhecem de verdade. Tento olhar em perspectiva e percebo que fui abusada psicologicamente de muitas formas pelos meus pais, esta foi apenas mais uma delas. Tenho tentado cultivar autocompaixão, pois construí muitas coisas belas na minha vida apesar de tudo. Eu me sinto vencedora. Agradeço imensamente o espaço de acolhimento.”

A partir de agora, CLAUDIA mantém esse canal aberto e oferece acolhimento para quem quiser libertar as palavras e as dores que elas carregam. Fale com CLAUDIA em falecomclaudia@abril.com.br.

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*Nome trocado a pedido da personagem

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