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A história da jovem que criou padrões matemáticos para combater o suicídio

Alessandra, de 18 anos, viu nos números uma oportunidade de entender uma das questões mais complexas da sociedade hipermoderna

Por Gabriela Maraccini (colaboradora)
Atualizado em 21 ago 2020, 10h16 - Publicado em 20 ago 2020, 13h00
Alessandra, quando tinha apenas 13 anos, começou a estudar os fatores que influenciavam a saúde mental dos jovens, usando modelos matemáticos (Arquivo Pessoal/Arte/CLAUDIA)
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Quando a jovem Alessandra Rister Portinari Maranca tinha apenas 10 anos e estava começando a sua vida na capital de São Paulo, ela viveu uma tentativa de estupro que afetou sua saúde mental. A garota desenvolveu bulimia durante grande parte da pré-adolescência e uma relação tóxica com o próprio corpo. O suicídio chegou a passar pela sua cabeça, mas logo foi descartado.

“Eu tinha amigos que pensavam em se suicidar, eu e as minhas amigas às vezes falávamos isso também e eu pensei: ‘nossa, mas nós temos 13 anos, porque estamos falando de suicídio? Há algo de doente nessa sociedade que nós não entendemos'”, revela Alessandra, hoje com 18 anos, durante uma videochamada com CLAUDIA.

Foi assim, aos 13 anos, enquanto cursava o 9º ano do Ensino Fundamental, que ela decidiu, junto com mais duas colegas, a desenvolver uma iniciação científica para entender as possíveis motivações para o suicídio. “Quando estudamos o que nos faz mal, quando estudamos o quanto consumimos o corpo ideal da mídia e o quanto isso é usado como uma estratégia de venda, percebemos que somos vulneráveis e que temos que lutar para sermos melhores”, afirma.

Entendendo a saúde mental e o suicídio entre jovens no Brasil

Além de um trabalho comportamental e de saúde mental, Alessandra, Catharina Faria de Morais e Maria Clara Batista Nascentes desenvolveram um padrão matemático para entender o suicídio e combatê-lo. “É um modelo que tenta entender, a partir de todas as causas sociológicas que podem prejudicar a saúde mental, quais delas de fato impactam o bem-estar. Fizemos, também, um comparativo entre escolar públicas e particulares”, conta.

O grupo estudou os fatores sociológicos que interferem no bem-estar psicológicos dos jovens. “Nós tínhamos hipóteses de como a sociedade hipermoderna estaria prejudicando a saúde mental dos indivíduos. Então pensamos em fatores, como a formação de identidade por meio do corpo, por meio da popularidade, por meio do consumo e por meio da competência escolar. Testamos essas hipóteses para cada critério da saúde mental da OMS [Organização Mundial da Saúde] e fizemos mais de mil questionários em escolas públicas e privadas para fazer a análise quantitativa e qualitativa”, explica.

Alessandra
Alessandra começou a estudar a questão da saúde mental em jovens quando tinha apenas 13 anos (Arquivo Pessoal/Divulgação)
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As descobertas são impressionantes e tristes. De acordo com o estudo, nas escolas públicas, existe uma correlação de 99,9% entre a formação de identidade e a imagem corporal, o que pode causar distúrbios como bulimia, anorexia e outros distúrbios corporais. Já nas escolas particulares, muitas vezes pelo fato de os alunos terem melhores condições financeiras e também pela maioria deles ser branca , eles conseguem mais facilmente se encaixar nos padrões de beleza impostos pela sociedade. “Eles têm mais acesso a dietas, cirurgias, procedimentos estéticos, que sanam essa vontade de se encaixar nos padrões”, explica Alessandra.

Além da pesquisa, o trio também participou do TED Talks e concedeu uma palestra para mais de 300 professores de rede pública e particular, na sede do Facebook, para debater como eles podem ajudar os alunos em sala de aula para auxiliar na saúde mental dos adolescentes.

Sonhos para o futuro

Depois de desenvolver essa longa pesquisa foram quatro anos se dedicando ao assunto Alessandra percebeu que tinha um sonho: cursar Matemática e trabalhar no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Mas foi por bem pouco que o futuro da jovem não tomou outro caminho.

“Eu só decidi que eu ia fazer um curso de exatas depois que eu já tinha passado em Direito, na Universidade de São Paulo”, revela. Por insistência dos pais, Alessandra prestou o vestibular para o curso, mas, de forma escondida, se inscreveu no Sisu (Sistema de Seleção Unificada)  e se matriculou no Instituto de Matemática e Estatística (IME), também da USP.

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Um pouco antes de começar o primeiro semestre do curso, ela sonhou mais alto: decidira tentar ingressar em alguma universidade internacional. A Universidade de Stanford, na Califórnia, abriu as portas para Alessandra. Foi, assim, que ela decidiu recorrer à Fundação Estudar e, após um longo e difícil processo seletivo, ela se tornou uma das bolsistas do Projeto Líderes Estudar, assim como a jovem Katarine, que sonha em entrar na Nasa, história contada anteriormente por CLAUDIA.

Jovem Alessandra lendo livro
Prestes a começar os estudos na Universidade de Stanford, na Califórnia, ela é uma das bolsistas do Projeto Líderes Estudar, da Fundação Estudar (Arquivo Pessoal/Divulgação)

“Eu nunca tinha pensado em estudar fora do Brasil porque eu sempre pensei em contribuir com o que existe aqui. Mas depois eu entendi que o meu objetivo é ajudar o Brasil. Estudar fora é uma missão de realização profissional e pessoal, mas para depois devolver para cá e trabalhar no IBGE”, conta Alessandra.

Essa percepção foi alcançada durante o processo seletivo do Projeto Líderes, que além de custear os estudos de Alessandra, também a auxilia com mentoria. “Quando vemos vários jovens no Brasil preocupados em seguir uma carreira com propósito, pensamos que é justamente porque eles querem deixar um legado e contribuir ativamente para o país”, pondera Anamaíra Spaggiari, diretora-executiva da Fundação Estudar. “Trabalhar com eles é algo muito gratificante e que dá muito orgulho e esperança de termos um Brasil melhor”, completa.

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Por mais mulheres na Matemática

Alessandra era uma das poucas garotas em sua turma no IME e, no começo, chegou a pensar que tinha cometido um erro ao desistir do Direito. “Quando eu entrei na sala pela primeira vez, eu me assustei, porque era eu e mais uma menina em uma sala cheia de homens e com um professor que também é homem.”, relembra. “E eu logo percebi que não adianta você ser tão boa quanto eles, você tem que ser melhor para eles entenderem que você é boa. Foi muito divertido, inclusive, quando eu tirei a nota mais alta de cálculo na minha turma. Pensei ‘nossa e eu estava assustada com os homens! Nada a ver!'”, brinca.

E prestes a iniciar as aulas, à distância devido à pandemia do coronavírus, em Stanford, a jovem está preparada para mergulhar de cabeça na Matemática. “Eu acho que cada vez mais teremos mulheres na Matemática, porque a área precisa de mulheres, não só as mulheres precisam dela”, pondera. E ela finaliza com uma mensagem importante: “Quanto mais mulheres estiverem nessa área, menos mulheres vão desistir.”

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